sábado, 26 de março de 2016

O maior desafio climático é deixar o carbono no solo

A ciência mostra que para garantir um clima sustentável teremos de manter combustíveis fósseis enterrados


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Bill McKibben

Temos algumas vantagens quando se trata de lidar com mudanças climáticas. A primeira é que os parâmetros do problema são notavelmente claros: podemos literalmente ver o derretimento do Ártico, a acidificação oceânica e o mercúrio dos termômetros em constante ascensão. Além disso, secas e inundações reforçam diariamente nossa compreensão da difícil situação em que nos encontramos.

E mais: pesquisadores tornaram relativamente simples entender o que podemos e não podemos fazer daqui para frente. Se realmente quisermos limitar o aumento da temperatura do planeta a 2ºC — e quase todas as nações do mundo concordaram com essa meta em 2009, nas negociações internacionais em Copenhague, na Dinamarca —, então simplesmente temos que deixar a maior parte do carbono de jazidas conhecidas enterrada no subsolo ou no fundo do mar: ele não pode ser queimado.

De fato, um contundente artigo publicado em Nature em janeiro passado listou todos os depósitos de carbono que teriam de permanecer intocados: lugares como as areias betuminosas do Canadá ou os reservatórios de petróleo e gás sob o Ártico. (A Scientific American integra o Nature Publishing Group).

Então: pode ser fácil, ou não. O presidente Barack Obama, por exemplo, viajou ao Alasca no início de setembro para chamar atenção para as mudanças climáticas. Ele visitou aldeias nativas, deu uma olhada em geleiras que estão derretendo, e fez todos os comentários politicamente corretos. Mas na semana anterior ele havia dado a permissão final para a Shell Oil perfurar e prospectar no Ártico — exatamente o tipo da coisa que, de acordo com cientistas, agravará o aquecimento global.

Ao fazer isso, Obama exemplificou nosso dilema. Ele simplesmente não conseguiu fazer frente às forças que querem desenterrar até o último naco de carvão, extrair até a última gota de petróleo.

Para políticos, essa falta de controle tem uma origem bem simples: o poder da indústria de combustíveis fósseis. Ela é o setor mais rico do planeta, e historicamente acabou ganhando absolutamente tudo o que queria. O fato de Obama ter rejeitado o controverso oleoduto Keystone XL é uma mostra singular de coragem; e foi literalmente a primeira vez que um líder mundial disse: “Este é um projeto que não podemos construir devido aos seus efeitos sobre o clima”. Mas normalmente o chamado “Big Oil” (os megaprojetos petrolíferos) é simplesmente grande e poderoso demais.

Duas coisas, porém, talvez mudem essa equação.

Uma delas é o surgimento de um movimento climático real. Ele também está ficando grande e poderoso: no outono boreal passado 400 mil manifestantes marcharam pelas ruas de Nova York, no que foi a maior manifestação sobre qualquer coisa nos EUA há muito, muito tempo. Cada vez mais esse esforço globalestá persuadindo bancos a parar de financiar a próxima rodada de extração. No meio do verão passado, por exemplo, a empresa que planejava construir a maior mina de carvão do mundo no deserto australiano cancelou tudo porque suas linhas de crédito haviam sido cortadas graças a um persistente ativismo.

Mas há ainda um outro fator. Nos últimos seis anos, o preço de painéis solares despencou 75%. Isso torna a energia renovável a alternativa mais barata em grande parte do mundo. Se nos comprometêssemos com essa opção, como demonstrou o professor de engenharia ambiental Mark Jacobson, da Universidade Stanford, e sua equipe, todos os estados da União (e todos os países do planeta) poderiam suprir suas necessidades com eletricidade limpa e confiável a um preço acessível até 2030.

Pesquisas mostram que a maioria das pessoas gostaria dessa mudança. Os que se opõem a ela são as pessoas que são proprietárias de minas de carvão e poços de petróleo — gente que exerce uma boa dose de influência política. Os dois irmãos Koch [Charles e David] juntos, por exemplo, formam o “homem mais rico da Terra”. Eles são barões de petróleo e gás; de fato, eles são os maiores arrendatários daquelas areias betuminosas canadenses que, de acordo com cientistas, compõem uma das jazidas que precisamos deixar em grande parte intocadas, inexploradas. E eles anunciaram que gastarão US$ 900 milhões nas eleições presidenciais americanas no outono de 2016 — isso é mais dinheiro do que os partidos Democrata e Republicano gastaram da última vez.

Essa batalha épica está se desenrolando em tempo real. Podemos facilmente medir a quantidade de dióxido de carbono (CO2) que está sendo lançada na atmosfera. Nesta primavera boreal, pela primeira vez na história da humanidade, os níveis de CO2 passaram de 400 partes por milhão (ppm). O tempo é curto: se não começarmos a exercer contenção muito em breve, então as negociações climáticas em Paris, agora, neste mês, não terão grande importância, porque as mudanças que desencadeamos se autoalimentarão, ou se fortalecerão por si mesmas.

Há dias em que, ao ler o que há de mais novo na ciência, é difícil não ser pessimista. Mas então também há dias, como aquele, neste outono boreal, em que a Shell cancelou seus planos para continuar perfurando o Ártico e, logo em seguida, o governo Obama tomou uma série de decisões dificultando que outros fizessem o mesmo. Talvez isso seja um prenúncio. Humanos são muito espertos para fazer coisas. A pergunta é: eles conseguem não fazer coisas?

Bill McKibben é fundador da campanha climática global 350.org e autor do livro original dirigido ao público em geral (leigo) sobre mudança climática “O fim da Natureza” (Editora Nova Fronteira), que foi publicado originalmente nos Estados Unidos em 1989.
Revista Scientific American Brasil

Dois graus Celsius de liberdade

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Ilustração de Andrew J. Nilsen


O mundo ainda pode evitar o perigoso aquecimento global se agir rapidamente


Michael Mann

O mundo tem um árduo caminho pela frente se quiser evitar que o aquecimento da superfície da Terra supere 2 graus Celsius, o limite a partir do qual causaremos graves danos ao planeta. Esse número serve de guia para os compromissos que muitos países vão assumir em Paris, na 21ª Conferência das Partes (COP-21) da Convenção-Quadro das Nações Unidas dobre Mudança do Clima, a fim de reduzir suas emissões de gases causadores do efeito estufa.



Mas alguns críticos declararam que a meta de não ultrapassar o aumento médio de 2oC é impossível de ser alcançada, alegando que não poderíamos empregar em tempo as tecnologias necessárias para descarbonizar a economia. Sim, nós podemos. O obstáculo não é físico. Ele depende de vontade política e social.

Ninguém disse que será fácil. Mais de 70 especialistas em clima que atuaram como conselheiros para a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima ressaltaram que limitar o aquecimento global a 2oC “exigirá uma transição radical... não um mero ajuste fino das tendências atuais”.

Nós podemos emitir apenas 300 bilhões de toneladas a mais (270 bilhões de toneladas métricas) de carbono na atmosfera e manter o aquecimento abaixo de 2oC. Com a atual taxa de emissões de mais de 10 bilhões de toneladas por ano, esgotaremos esse “orçamento de carbono” em apenas três décadas. De acordo com uma análise recente, ficar abaixo dos 2oC exigirá que um terço de todas as reservas comprovadas de petróleo, metade de todo o gás natural e 80% do carvão continuem sob a terra.

Isso é pedir bastante. Significa que teremos de começar a suprimir progressivamente o carvão agora e abandonar a maior parte ou toda a areia asfáltica canadense (adeus oleoduto Keystone XL). Também significa que não poderemos queimar cada vez mais gás natural como uma “ponte” para um futuro clima mais limpo dominado por fontes de energia renovável.

A marca de 2oC é com frequência equiparada com manter a concentração atmosférica de dióxido de carbono abaixo de 450 partes por milhão (ppm). O desafio se torna mais difícil à medida que usamos menos carvão. Quando queima, o carvão libera partículas de aerossóis de sulfato na atmosfera que refletem de volta para o espaço parte da energia recebida do Sol. Para o artigo “Uma Falsa Esperança”, publicado em 2014 pela Scientific American, eu calculei que, para compensar a redução a zero das emissões de enxofre até o fim do século, precisamos cumprir a meta de CO2 de cerca de 405 ppm – apenas levemente acima do nível atual.

Podemos fazer isso? O cientista do clima James E. Hansen fez uma convincente defesa de que podemos tirar 100 bilhões de toneladas de carbono do ar com um reflorestamento em massa – limitando o uso da terra o suficiente para permitir que as florestas recuperem a extensão que tinham antes do desmatamento humano. Isso, juntamente com a redução das emissões de carbono em vários pontos porcentuais por ano, o que é difícil, mas exequível, pode levar à meta de estabilização de 2oC.

A história está repleta de declarações precipitadas de inviabilidade que se provaram equivocadas. Como Joe Romm, do Centro para o Progresso Americano, respondeu a críticos de questões climáticas: “Felizmente esses especialistas não estavam por perto quando tivemos de fazer algo realmente difícil, como sofrer milhões de baixas e refazer toda nossa economia quase da noite para o dia para vencer a Segunda Guerra Mundial.” Um acordo inspirado na conferência climática COP-21, que acontece agora em Paris, pode dar início a um ambicioso, mas totalmente viável esforço.

O fator-chave é que há inovações tecnológicas e economias de escala que surgem apenas quando de fato se faz algo. O preço dos painéis solares, por exemplo, caiu mais de 50% no mundo nos últimos anos enquanto a China acelerava sua produção. Os que dizem “não, não podemos” se dedicam a profecias autorrealizáveis. Os EUA nunca foram um país de pessoas que se acham incapazes.

Mesmo com inovação e aprimoramentos, podemos em algum momento ter de empregar tecnologia de “captura direta do ar”, que retira o dióxido de carbono da atmosfera. Isso seria dispendioso, mas Klaus Lackner, professor de engenharia da Universidade do Estado do Arizona, acredita que o custo pode ser reduzido a US$ 30 por tonelada com o volume de produção.

O custo da ação é apenas metade do da inação. Essa conclusão não vem do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC). Vem da ExxonMobil, que estimou o verdadeiro preço do carbono para a sociedade em US$ 60 por tonelada. Outros projetam um valor ainda mais alto. Temos condições de estabilizar o aquecimento planetário abaixo de dois graus Celsius? Não temos condições de não fazê-lo.

Michael E. Mann é professor emérito de Meteorologia da Universidade do Estado da Pensilvânia. Seu mais recente livro, com Lee R. Kump, é Dire Predictions: Understanding Climate Change (2ª edição, Pearson/DK Publishing, 2015).

Revista Scientific American Brasil

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Newton P. U. Barbosa/CBEI

O invasor dourado
Após infestar rios do Sul e Sudeste, chega ao Rio São Francisco molusco asiático que prejudica flora, fauna e tubulações 

Originário da Ásia, o mexilhão-dourado (Limnoperna fortunei) foi detectado na América do Sul em 1991 na foz do Rio da Prata, na Argentina. Nas décadas seguintes ele se dispersou pelas bacias do Sul e Sudeste do Brasil, prejudicando a fauna e flora aquáticas e instalações de captação de água e geração de energia.

Em 2015 foi confirmada sua presença no reservatório de Sobradinho, na Bahia, no Rio SãoFrancisco, bem próximo de um dos canais da obra de transposição, trazendo o risco de a invasão se alastrar para a Amazônia.

Pesquisadores do Centro de Bioengenharia de Espécies Invasoras, de Belo Horizonte (MG), que identificaram a presença desse molusco asiático em Sobradinho, escreveram um artigo especialmente para a Scientific American Brasil sobre essa história.

Leia o artigo completo na edição de janeiro da Scientific American Brasil.

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