sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Notícias Geografia Hoje


Relatório da ONU destaca valorização do salário mínimo como principal fator de redução de desigualdades no Brasil

Roldão Arruda

O relatório lançado na quarta-feira, 29, pelo Programa das Nações Unidades para o Desenvolvimento (Pnud) traça um quadro sombrio sobre a questão da distribuição de renda no mundo. Aponta que a produção de riquezas nas duas últimas décadas registrou aumentos notáveis e que o mundo está globalmente mais rico do que nunca. A apropriação dessas riquezas, porém, ocorre de forma cada vez mais desigual.

Segundo o relatório, intitulado Humanidade Dividida: Confrontando a Desigualdade nos Países em Desenvolvimento, o mundo hoje está mais desigual do que em qualquer outro período desde a 2.ª Guerra Mundial. Entre 1990 e 2010, a desigualdade de renda aumentou em 11% nos países em desenvolvimento.

No planeta, o 1% da população mais rica detém cerca de 40% dos bens globais. Do outro lado, a metade mais pobre da população não é dona nem de 1%.

Entre os países que conseguiram reverter a tendência global e reduzir as desigualdades, aparece o Brasil. Em uma década, o índice de Gini, que mede a concentração de renda, caiu substancialmente no País. Passou de 54,2 para 45,9 (por esse índice, quanto mais o valor se aproxima de zero, menor a diferença entre a renda dos mais ricos e a dos mais pobres).

Ao analisarem as causas dessa melhoria, os especialistas da ONU, a exemplo do que já fizeram vários estudiosos no Brasil, destacaram o efeito do salário. Entre 2003 e 2010, o salário mínimo real aumentou 80% no Brasil. O peso disso na redução da desigualdade de renda foi o dobro do verificado com os programas de transferência de renda, como o Bolsa Família.



O documento ainda destaca como fator positivo a questão política, com a criação de espaços políticos que permitem maior participação da sociedade civil nos debates sobre os planos de desenvolvimento e definição de prioridades. Segundo o estudo, as pessoas em todo o mundo estão exigindo voz nas decisões que afetam suas vidas.

Globalização favoreceu desigualdade

Em termos gerais, o relatório diz que a globalização financeira e comercial verificada nas últimas décadas favoreceu o aumento do fosso entre os mais ricos e os mais pobres. “O poder de negociação salarial dos trabalhadores, relativamente imóveis, diante do capital completamente móvel, foi debilitado”, diz o texto.

Políticas internas dos países também favoreceram a concentração de renda. “As políticas monetárias que fincam o pé na estabilidade de preços frente ao crescimento, as políticas de relativização do mercado de trabalho, que debilitam a força de negociação dos trabalhadores diante dos empregados, e as políticas fiscais que priorizam a consolidação fiscal às expensas dos gastos sociais e à tributação progressiva provocaram um aumento na desigualdade de renda.”

Política macroeconômicas centradas na estabilidade de preços, em vez de puxar para o primeiro plano o crescimento e a criação de empregos, seriam piores, do ponto de vista da redução das desigualdades, segundo os analistas da ONU.
Jornal O Estadão

Indústria farmacêutica, mentiras e (muito) dinheiro

Seis casos revelam: efeitos graves de medicamentos são omitidos, para sustentar consumo e lucros. Confira lista de remédios cujos riscos não impediram que seus fabricantes fossem autorizados a colocá-las a venda

Por Martha Rosenberg, no Outras Palavras


(Imagem: Outras Palavras)

Quando um medicamento causa efeitos colaterais, esta informação muitas vezes não é exposta durante anos, o que permite à indústria farmacêutica continuar ganhando muito dinheiro.

O Food and Drug Administration (FDA) [órgão governamental dos EUA para alimentos e medicamentos] e a indústria farmacêutica argumentam que os efeitos colaterais perigosos em uma droga só aparecem quando é usada por milhões de pessoas – e não no grupo relativamente pequeno de pessoas que fazem testes clínicos. Mas existe outra razão pela qual os consumidores acabam sendo cobaias. Os remédios são levados apressadamente ao mercado, após um período muito curto (de apenas seis meses) para que a indústria possa começar a ganhar dinheiro, enquanto a segurança ainda está sendo determinada.

Tanto a droga para os ossos Fosamax, repleta de riscos, quanto a analgésica Vioxx, ambas da indústria Merck, foram ao mercado após seis meses de revisão. No caso da Vioxx, isso ocorreu porque “o medicamento potencialmente provia uma vantagem terapêutica sinificativa sobre outras drogas já aprovadas”, disse a FDA.

Obrigado por isto. E cinco drogas (Trovan, Rezulin, Posicor, Duract e Meridia), que entraram no mercado em 1997 por pressões da indústria e do Congresso sobre a FDA, diz a PublicCitizen, foram em seguida retirados.

Abaixo, algumas drogas cujos riscos não impediram que seus fabricantes fossem autorizados a colocá-las a venda e exercer seu “valor de patente”.

1. Singulair

Você imaginaria que a Merck aprendesse, após os problemas com Vioxx e a Fosamax, que marketing agressivo pode esconder apenas por algum tempo os riscos emergentes das drogas. Mas não. Para vender o Singulair, sua droga contra asma e alergias para crianças, a indústria fez uma parceria com Peter Vanderkaay, o nadador medalha de ouro nas Olimpíadas, com acadêmicos e com a Academia Norte-americana de Pediatras – mesmo após a FDA advetir sobre os “eventos neuropsiquiátricos” do medicamento, incluindo agitação, agressão, pesadelos, depressão, insônia e pensamentos suicidas.

Enquanto a Merck fazia a propaganda do Singulair (que vem em fórmula mastigável e com gosto de cereja), com slogans como “Singulair é feito pensando nas crianças”, a Fox TV e mais de 200 pais relataram, no site askapatient [“pergunte a um paciente”] que suas crianças, ao tomar o remédio, exibiam humor alterado, depressão e déficit de atenção (ADHD), hiperquinesia e sintomas suicidas. Cody Miller, um garoto de 15 anos de Queensbury, Nova York, tirou sua própria vida dias após tomar o medicamento, em 2008. Ainda assim, o Singulair arrecadou 5 bilhões de dólares para a empresa, em 2010. Após sua patente expirar, em 2012, a Administração de Bens Terapêuticos da Austrália (equivalente à FDA ou à Anvisa) reportou 58 casos de eventos psiquiátricos adversos em crianças e adolescentes, primariamente pensamentos suicidas. Quem sabia?

2. Zyprexa

Como vender uma droga que provoca ganho de peso de cerca de 10kg, em 30% dos pacientes, chegando até 45kg, em alguns? Enterrando seus riscos. O antipsicótico Zyprexa era a nova aposta da Eli Lilly, depois de seu antidepressivo campeão de vendas Prozac – mesmo que o laboratório soubesse, já em 1995, de acordo com o New York Times, que a droga está ligada a um ganho de peso incontrolável e até diabetes. Os efeitos colaterais do Zyprexa de “ganho de peso e possível hiperglicemia fazem um grande mal ao sucesso de longo prazo desta molécula criticamente importante”, havia escrito Alan Breier, da Lilly, segundo documentos obetidos pelo jornal. Mais tarde Alan tornou-se médico-chefe da empresa.

Mesmo após a Lilly ter pagado multas, após acusada de ocultar informações sobre a relação entre a droga e altos níveis de açúcar no sangue ou diabetes (e de ter comercializado ilegalmente a droga para pacientes com demência), o Zyprexa rendeu 5 bilhões de dólares em 2010, acima até do Prozac. Quem disse que crime não compensa? O Zyprexa foi especialmente comercializado para os pobres e virou um dos medicamentos principais do Medicaid, o programa público de saúde norte-americano, extraindo pelo menos 1,3 bilhões de dólares do orçamento do país, só em 2005. Em 2008, a empresa estabeleceu um acordo para cobrir o custo dos pacientes do Medicaid que desenvolveram diabetes após usar a Zyprexa. Como raposa vigiando galinheiro, a Lilly ofereceu um “serviço gratuito” para “ajudar” os estados a comprar drogas como a Zyprexa para doenças mentais — e vinte deles aceitaram a oferta. A patente do remédio acabou em 2012.

3. Seroquel

O antipsicótico Seroquel, produzido pelo laboratório AstraZeneca, do Reino Unido, tornou-se um dos medicamentos mais vendidos nos EUA, arrecadando mais de 5 bilhões de dólares em 2010, apesar de seus riscos, frequentemente relatados. O remédio foi comercializado tão vastamente para crianças pobres que, em 2007, o Departamento de Justiça para a Juventude da Florida comprou duas vezes mais Seroquel que Advil. Sua elevada aquisição no serviço militar, para usos não aprovados — como para estumular o sono e para distúrbio de estresse pós-traumático (PTSD) — também foi espantosa. Relatos de mortes repentinas de veteranos que utilizavam a droga emergiram quando as compras do Seroquel pelo Departamento de Defesa dos EUA cresceram 700%.

Poucos meses após a aprovação da Seroquel, em 1997, um artigo no Jornal de Medicina de Dakota do Sul já levantava questões sobre a interação perigosa da droga com outros onze medicamentos. Passados três anos, pesquisadores da Cleveland Clinic questionavam o efeito da Seroquel na atividade elétrica do coração. Mas mesmo quando as famílias de veteranos falecidos prestaram testemunhos em audiências no FDA, em 2009, e exigiram respostas de dirigentes e legisladores, o órgão protegeu a empresa. Depois, em 2011, com pouco alarde, o FDA emitiu novos avisos que confirmavam as notícias devastadoras: tanto o Seroquel quanto sua versão estendida, que fora lançada, “deveriam ser evitados” na combinação com pelo menos outros 12 remédios. A droga também deveria ser evitada pelos idosos e pessoas com doenças cardíacas, por causa de seus claros riscos ao coração. Ops… A patente expirou no ano seguinte.

4. Levaquin

Os antibióticos à base de fluoroquinolona estão entre os mais vendidos. Muitas pessoas lembram-se do Trovan (na época dos ataques com antrax, logo após o 11 de setembro), mas a indústria farmacêutica espera que não nos lembremos de que foi retirado de circulação por causa de danos ao fígado, e do Raxar, removido por causar eventos cardíacos e morte súbita. O Levaquin, da Johnson & Johnson, igualmente baseado em fluoroquinolona, foi o antibiótico mais ventido nos EUA em 2010, com receitas acima de US$1 bilhão por ano — mas agora é tema de milhares de processos.

Em 2012, um ano após a patente do Levaquin expirar, uma enxurrada de efeitos colaterais começou a emergir, sobre este medicamento e toda a classe de fluoroquinolonas, lançando dúvidas sobre sua segurança. A revista da Associação Médica Norte-Americana relatou que, de 4.384 pacientes diagnosticados com descolamento de rotina, 445 (10%) foram expostos a fluoroquinolone no ano anterior ao diagnóstico. A Revista de Medicina da Nova Inglaterra relatou no mesmo ano que o Levaquin estava ligado a um risco crescente de morte cardiovascular, especialmente morte súbita por distúrbios no ritmo cardíaco.

Embora a FDA tenha alertado sobre as rupturas de tendão — especialmente os tendões de Aquiles — provocadas por fluoroquinolonas em 2008, e adicionado uma tarja preta de advertência na embalagem, novos avisos graves foram feitos dois anos após o fim da patente do Levaquin. Em 2013, a FDA advertiu sobre o “efeito colateral sério de neuropatia periférica” — um tipo de dano nos nervos no qual as vias sensoriais são prejudicadas — nas fluoroquinolonas. Neuropatias periféricas causadas por esta classe de antibióticos podem “ocorrer logo após a administração destas drogas, e podem ser permanentes”, alertou a ageência. Fluoroquinolonas também estão ligadas aoClostridiumdifficile, também chamado de C. Diff, um micróbio intestinal sério e potencialmente mortífero.

5. Topamax

Antes de sua patente expirar, em 2009, a droga Topamax deu à Johnson & Johnson um bilhão de dólares por ano, e foram mais US$ 538 milhões depois disso. O remédio foi tão preferido, para condições de dor no serviço militar, que recebeu o apelido de “Stupamax” – uma referência à maneira com que diminuia os tempos de reação e prejudicava a coordenação motora, a atenção e a memória, de acordo com o ArmyTimes. Não era muito bom para o combate…

Um ano antes de cair a patente do Topamax, a FDA alertou que ela e outras drogas estão correlacionadas com suicídios, e pediu a seus fabricantes para adicionar avisos na caixa. Quatro pacientes usuários da droga mataram-se, contra nenhum sob placebo, declarou a FDA após rever os testes clínicos. Já em 2011, o órgão anunciou que o Topamax pode causar defeitos de nascimento nos lábios, nos bebês de mães que ingerem a droga. “Antes de começar com o topiramato, grávidas e mulheres em idade fértil devem discutir outras opções de tratamento com seu profissional de saúde”, alertou o FDA, mas isso não impediu o órgão de aprovar uma nova dieta de medicamentos contendo o genérico do Topamax, em 2012.

6. Oxycontin

O Oxycontin, do laboratório Purdue Pharma, é a avó de drogas que geram muito dinheiro, apesar de seus efeitos colaterais letais. Junto de outros opióides, ele causou o número assutador de 17 mil mortes no ano passado — quatro vezes mais que em 2003. “O aumento [no uso] foi alimentado em parte por médicos e organizações de defesa de analgésicos, que recebiam dinheiro de empresas e faziam alegações enganosas sobre a segurança e a efetividade de opióides — inclusive afirmando que o vício é raro”, relatou o Journal Sentinel. A Sociedade de Geriatras Norte-Americanos usou pesquisadores ligados à indústria farmacêutica para reescrever guias clínicos em 2009, diz a publicação. Após reescritos, eles especificavam opióides para todos os pacientes com dor moderada a severa

Devido a sua fórmula, que lhe permite agir por um longo período, pensou-se que o Oxycontin teria toxidade e potencial de provocar dependência reduzidos – ao menos até seus efeitos tornarem-no mais popular que a cocaína nas ruas (todos os 80mg de pílulas podíam ser tomados de uma vez). Em 2010, respondendo aos vícios, overdoses e mortes associadas à droga, a Purdue Pharma desenvolvou um Oxycontin inviolável, e, dois anos depois, passou a pressionar por leis que exigissem inviolabilidade de todos os opiácios. A empresa garantiu que sua maior preocupação era a saúde pública, mas muitos se perguntaram sobre o porquê desta preocupação só se revelar às vésperas do fim da patente da droga, em 2013…

Tradução: Gabriela Leite

 Revista Fórum

Notícias Geografia Hoje

Aumento do nível do mar pode ameaçar futuro do sul da Flórida


Cientistas temem que conjunto de ilhas fique submerso e reservas de água potáveis sejam invadidas por oceanos



Mais para o interior da Flórida, o Everglades, região pantanosa cuja água abastece grande parte de Miami, pode um dia ficar inutilizado, devido ao avanço inexorável do oceano, temem alguns cientistas. As Flórida Keys, ilhas que adentram o Golfo do México, ficariam submersas, assim como o condado de Key West. NYT
Pedestre faz exercícios na Venetian Causeway, que liga Miami e Miami Beach, em Miami

"Eu não acho que as pessoas tenham noção do quão vulnerável é a Flórida", disse Harold Wanless, presidente do departamento de ciência geológica da Universidade de Miami em uma entrevista na semana passada. "Vamos ganhar 1,2 ou 1,5 ou 1,8 metro de água, ou mais, até o fim do século. É necessário que se acorde para a realidade que está por vir."

O temor sobre o aumento do nível do mar não está restrito apenas aos muros das universidades, mas também dos governos locais ao longo da costa sul do Estado.

Os quatro condados da região - Broward, Miami-Dade, Monroe e Palm Beach, com uma população total de 5,6 milhões - formaram uma aliança para pensar em soluções.

Atingida há muito tempo por furacões, e propensa a ter inundações e intensas tempestades, a Flórida é o Estado mais vulnerável no país em relação ao aumento do nível dos oceanos.

Até mesmo previsões mais modestas do que as feitas por Wanless veem as partes mais baixas do litoral da Flórida com inundações mais frequentes por causa do derretimento das calotas polares e com o aumento do nível dos oceanos.

Grande parte dos 1,9 mil quilômetros da costa da Flórida está apenas a poucos metros acima do atual nível do mar, e prédios, estradas e outras estruturas de
bilhões de dólares ficam sobre estruturas altamente porosas de calcário, que sugam a água como esponjas.

Mas embora autoridades de Everglades e de outras cidades do litoral, muitas das quais participaram de uma conferência sobre mudanças climáticas na semana passada em Fort Lauderdale, tenham começado a falar do problema, a questão atraiu pouca atenção entre os legisladores de Tallahassee.

A questão parece ser igualmente confusa para outros segmentos da sociedade, como empresas, imobiliárias e turismo, que têm interesse em proteger a
movimentada economia do sul da Flórida.

"A comunidade empresarial em sua maior parte não é engajada", disse Wayne Pathman, um advogado de Miami e membro da Câmera do Comércio que participou da conferência de Fort Lauderdale. "Eles ainda não foram afetados. Ainda não entenderam as possibilidades."

Pathman disse que demandará um enorme esforço para encontrar respostas para as importantes questões. Em última análise, segundo ele, o indicador mais saliente da crise será a recusa da indústria de seguros de lidar com o risco nas áreas litorâneas de todo o país que estão expostas ao nível dos mares.

"As pessoas tendem a subestimar a gravidade, eu acho, porque soa distante", disse Ben Strauss, diretor do Programa da Elevação do Nível do Mar na Central do Clima, uma organização independente de cientistas. "As pessoas estão começando a se conscientizar, mas ainda não é uma prioridade. Miami é uma cidade em crescimento econômico agora, mas no futuro, que acredito que virá, será óbvio para todo mundo que o mar está avançando sobre o continente e não vai parar."

Os efeitos nos imóveis seriam devastadores, segundo Strauss. Sua pesquisa mostra que cerca de US$ 156 bilhões em propriedade, 300 mil casas, em 2.120 m² de terra estão a menos de 0,9 metros acima do nível da maré alta da Flórida.

No mesmo nível, segundo Strauss, a Flórida possui 4 mil quilômetros de estradas, 35 escolas públicas, uma hidrelétrica e 966 locais listados na Agência de Proteção Ambiental, como depósitos de resíduos e centros de tratamentos de esgoto.

O montante de imóveis, e o número certo de propriedades potencialmente afetadas, crescem a cada centímetro de elevação do nível dos oceanos.

Wanless insiste que nenhuma ideia da engenharia pode conter o avanço dos mares. "Em 60 centímetros a 90 centímetros começamos a perder tudo", disse.

A única solução, segundo ele, é considerar medidas drásticas como estabelecer um impedimento de construções ao longo da costa e obrigar residentes dessas
áreas de risco a se mudarem mais para o interior."

Autoridades locais dizem que estão fazendo o que podem.

"O céu não está caindo, mas o nível da água esta aumentando", disse Charles Tear, o coordenador do centro de emergências de Miami Beach, que estava perto do Maurice Gibb Park, que está a 60 centímetros acima do nível do mar, e que alaga regularmente.

Tear disse que ele e outras autoridades municipais voltaram suas atenções a previsões mais conservadoras, segundo as quais os mares vão ter aumento de 12,7 centímetros a 38 centímetros nos próximos 50 anos. "Não podemos olhar em 100 anos", disse. "Temos que olhar o lado realista."

Quaisquer que sejam as especificidades das previsões, Jimmy Morales, gestor municipal de Miami Beach, disse que ele e sua equipe tinham que considerar se "deveriam adotar premissas mais agressivas" sobre os efeitos das mudanças climáticas.

Autoridades locais estão ouvindo conselhos da Holanda, famosa por seus eficientes diques, mas a topografia muito diferente de Miami Beach e das cidades vizinhas não serve para os projetos de engenharia dos holandeses.

"Em último caso, você não pode derrotar a natureza, mas você pode aprender a viver com ela", disse Morales. "A capacidade humana é incrível, mas será que temos vontade política? A Holanda reserva US$ 1 bilhão por ano para conter inundações, e temos uma costa muito maior do que a deles." 
 Nick Madigan
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quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Notícias Geografia Hoje




Mudanças climáticas ameaçam aposentadorias
Fundos de investimento expõem clientes a perdas futuras com má administração do risco climático
AshDesign/shutterstock


Alex Kirby e The Daily Climate

LONDRES – O Projeto de Divulgação de Detentores de Ativos (AODP) perguntou a mil dos maiores donos de ativos do mundo o que eles estavam fazendo para se proteger contra a possibilidade de seus investimentos em combustíveis fósseisse tornarem inúteis no futuro.

Juntos, esses detentores administram mais de US$70 trilhões. O Projeto descobriu que apenas 27 dos 458 fundos de investimento que responderam a essa pergunta estão abordando o risco climático no que se considera um nível responsável.

Apenas cinco dos 458 alcançaram a pontuação máxima do AODP, AAA. Outros 22 obtiveram nota A ou maior. Apenas esses grupos, de acordo com o Projeto, “terão alguma chance de sobreviver à crise do carbono”.

De todos os participantes, 80% receberam nota D (abismal) ou X (não estão fazendo nada). Fundos que não responderam, não receberam notas.

“A maior parte da indústria de investimentos do mundo está agindo claramente contra os interesses das pessoas que representam – essa é uma situação ultrajante”, declara Sharan Burrow, membro da diretoria do AODP e secretária geral da Confederação Internacional de Sindicatos do Comércio.

“Devemos lembrar que grande parte do capital que essas organizações detêm é produto das economias da vida inteira de trabalhadores”.

A pesquisa observou várias categorias de comportamento dos investidores, incluindo transparência, administração de riscos, e investimento em baixo carbono. Os detentores de ativos avaliados são de 63 países, de todas as regiões do mundo.

As empresas procuradas pelo AODP incluíram mais de 800 fundos de pensão, 80 companhias de seguro, 50 fundos soberanos e 30 fundações ou beneficiárias. As descobertas da pesquisa estão publicadas no segundo Índice de Investimento do Clima Global.

O risco que investidores sofrem com a mudança climática é que um acordo global eficaz e rigoroso para reduzir as emissões de gases estufa – que ainda não existe – significaria que quantidades massivas de carvão, óleo e reservas de gás, listados como ativos por empresas de energia e mineração, permaneceriam no solo.

Como consequência, o valor dos investimentos nessas empresas cairia muito e isso, entre outras coisas, levaria a números consideravelmente menores nas economias de acionistas individuais.

Enquanto o AODP declara que muitos fundos de investimento estão ameaçando investidores com perdas potencialmente massivas por meio da exposição a riscos climáticos, o Projeto acredita que o Índice mostra que o sistema de investimento do mundo pode conduzir a transição para uma economia de baixo carbono.

De acordo com Julian Poulter, diretor executivo do AODP: “Ainda que possamos ver vários líderes emergindo, muitos deles não admitem seu perigoso e estúpido vício em investimentos cheios de riscos climáticos, e também não querem entrar na reabilitação”.

Mas também adicionou: “O que está claro é que o mundo tem um sistema de investimentos capaz de conduzir a transição para o baixo carbono – se todos os fundos que analisamos tivessem nota AAA, nós estaríamos muito adiantados para enfrentar o desafio climático global que nos aguarda”.

Alex Kirby é editor da Climate News Network, um serviço de notícias jornalísticas que leva notícias e comentários gratuitos sobre a mudança climática para fontes de notícias do mundo todo.

Este artigo foi originalmente publicado em The Daily Climate, a fonte de notícias sobre a mudança climática publicada por Environmental Health Sciences, uma empresa de mídia sem fins lucrativos.
Scientific American Brasil

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Hidrelétricas 'impulsionam desmatamento indireto' na Amazônia

Floresta foi desmatada no entorno das usinas de Jirau, Santo Antônio e Belo Monte



Ao defender a construção de hidrelétricas na Amazônia, o governo federal costuma citar o argumento de que essas usinas são menos poluentes e mais baratas que outras fontes energéticas capazes de substituí-las. Entre ambientalistas e pesquisadores, porém, há cada vez mais vozes que contestam a comparação e afirmam que o cálculo do governo ignora custos e danos ambientais indiretos das hidrelétricas. Para alguns, esses impactos colaterais influenciaram no aumento da taxa de desmatamento da Amazônia neste ano.

Há duas semanas, o governo anunciou que, entre agosto de 2012 e julho de 2013, o índice de desflorestamento na Amazônia cresceu 28% em relação ao mesmo período do ano anterior, a primeira alta desde 2008. Paulo Barreto, pesquisador sênior da ONG Imazon, atribui parte do aumento ao desmatamento no entorno das hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, no rio Madeira, em Rondônia, e da usina de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará.

Segundo ele, as hidrelétricas atraem migrantes e valorizam as terras onde são implantadas. Sem fiscalização e punição eficientes, diz ele, moradores se sentem encorajados a desmatar áreas públicas para tentar vendê-las informalmente.

No caso de Belo Monte, Barreto afirma que o desmatamento em torno da usina seria menor se o governo tivesse seguido a recomendação do relatório de impacto ambiental da obra para criar 15 mil km² de Unidades de Conservação na região.

Uma pesquisa do Imazon, da qual Barreto é coautor, estima que o desmatamento indireto causado pela hidrelétrica atingirá 5.100 km² em 20 anos, dez vezes o tamanho da área a ser alagada pela barragem.

Na bacia do Tapajós (PA), onde o governo pretende erguer uma série de usinas, ele diz a área desmatada indiretamente chegará a 11 mil km².

Fórmula do desmatamento

O engenheiro Felipe Aguiar Marcondes de Faria desenvolve em seu projeto de PhD na Universidade Carnegie Mellon (EUA) uma fórmula complexa. Ele pretende incluir os efeitos indiretos da construção de hidrelétricas na Amazônia – como o desflorestamento gerado por imigração ou especulação fundiária – no cálculo das emissões de carbono das obras.

A conta, que mede a liberação de gases causadores do efeito estufa, normalmente leva em conta somente as emissões geradas pela perda de vegetação e pela degradação da biomassa na área inundada pelas barragens.

"Se a construção de uma hidrelétrica implicar taxas de desmatamento superiores às de locais onde não existem tais investimentos, nós poderemos acrescentar esse desmatamento extra ao balanço de carbono do projeto".

O pesquisador diz ainda que, além de valorizar terras e atrair imigrantes, a construção de hidrelétricas pode estimular o desmatamento ao melhorar as condições de acesso à região, expondo florestas antes inacessíveis.

Faria também questiona os cálculos que exaltam o baixo preço das hidrelétricas em comparação com outras fontes de energia. "As diferenças não consideram adequadamente os custos socioambientais desses empreendimentos".

Ainda assim, avalia que o Brasil não pode excluir a hidroeletricidade de seus planos de expansão do sistema energético. Para ele, a modalidade oferece grandes vantagens em relação a outras fontes de energia, como flexibilidade para atender à variação da demanda e dispensa de importação de matérias-primas.

Faria defende, no entanto, que o governo mude sua postura quanto às hidrelétricas na Amazônia.

"O desenvolvimento hidrelétrico na Amazônia deveria ser visto não como uma barragem no rio, mas sim como uma chance de criar um novo paradigma de desenvolvimento sustentável para uma região, que crie condições para a manutenção das unidades de conservação e terras indígenas, investimentos em educação e ciência e melhora na saúde da população."

Porém, para o procurador-chefe do Ministério Público Federal no Pará, Daniel César Azeredo Avelino, a construção de hidrelétricas na Amazônia não tem sido acompanhada pela manutenção de áreas protegidas.

Nos últimos anos, o governo reduziu Unidades de Conservação para facilitar o licenciamento das hidrelétricas no rio Madeira e das futuras usinas no Tapajós. Segundo ele, simples sinalizações de que se pretende reduzir essas áreas já motivam o desmatamento.

Em 2012, diz Avelino, um mês após jornais divulgaram que o governo estudava diminuir a Floresta Nacional Jamanxim, no sudoeste do Pará, houve um surto de desmatamento na região.

"Quando se fala em reduzir Unidades de Conservação para hidrelétricas, alimenta-se a ideia de que poderá haver novas reduções, o que encoraja o desmatamento."

Governo responde

No entanto, segundo Francisco Oliveira, diretor do Departamento de Combate ao Desmatamento do Ministério Ambiente, a destruição dentro de áreas protegidas corresponde a menos de 10% do desflorestamento na Amazônia.

Quanto ao desmatamento recente no Pará e em Rondônia, diz que não se deveu necessariamente às hidrelétricas. Oliveira afirma que o desflorestamento em um raio de 50 quilômetros de Belo Monte passou de 380 km², em 2011, para 41 km² em 2013.

Em Rondônia, ele diz que também tem havido redução no ritmo do desmate em áreas próximas às usinas.

Segundo Oliveira, as principais causas para o maior desmatamento na Amazônia no último ano foram: no Pará, a apropriação ilegal de terras (grilagem) na região de Novo Progresso; no Mato Grosso, a expansão da agropecuária; e em Rondônia, a expansão da pecuária.

Oliveira afirma, porém, que, apesar da alta, o índice de desflorestamento em 2013 foi o segundo menor desde que começou a ser medido, há 25 anos.
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terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Notícias Geografia Hoje

Supervulcões seguem regras próprias
Nas mega-erupções a rocha derretida fratura espessas camadas de cobertura

josep salvia i bote/Flickr

Erupções de vulcões pequenos, como o italiano Stromboli, são produzidas pela pressão gerada enquanto a rocha derretida se acumula no subsolo.

Alexandra Witze e Revista Nature

Enormes explosões vulcânicas ocorrem com menos frequência que o esperado por cientistas, e agora vulcanólogos acreditam poder explicar o porquê: super-erupções e erupções menores são disparadas por processos fundamentalmente diferentes.

Vulcões pequenos, como o italiano Stromboli, entram em erupção quando a rocha derretida se eleva a partir das profundezas da Terra e se acumula em uma câmara subterrânea até que a pressão seja suficiente para explodir na superfície. Mas as câmaras de magma de vulcões gigantes – como o que entrou em erupção há dois milhões de anos abaixo do que hoje é o Parque Nacional Yellowstone, no oeste dos Estados Unidos – são grandes demais para que a pressão de vazamentos de magma provoquem uma erupção.

Em vez disso, pesquisadores relatam que a rocha derretida se acumula até que sua flutuabilidade crie um tipo diferente de estresse que quebre o cobertura da câmara e inicie uma erupção.

“Na prática nós identificamos dois mecanismos diferentes que disparam erupções – um para vulcões pequenos de aproximadamente 500 quilômetros cúbicos de magma, e um em que é possível produzir super-erupções”, declara Luca Caricchi, vulcanólogo da Universidade de Genebra, na Suíça.

Caricchi e seus colegas descreveram esse cenário na Nature Geoscience de 5 de janeiro (Scientific American é parte do Nature Publishing Group). Grandes erupções são mais comuns no registro geológico do que cientistas esperariam se simplesmente baseassem as estimativas no número de erupções pequenas que ocorrem com o tempo. Essa diferença poderia decorrer de um problema com a amostragem, ou a uma diferença fundamental entre erupções grandes e pequenas.

Caricchi e sua equipe usaram modelos e simulações para estudar os diversos atores envolvidos em uma erupção: do calor do magma, até as forças necessárias para destruir a cobertura de uma câmara. Para vulcões pequenos, os cientistas confirmaram que a pressão do magma se elevando era suficiente para disparar uma erupção. “É como soprar uma bexiga de festa – se soprar com velocidade suficiente, você pode fazê-la estourar”, compara Caricchi.

Mas adicionar magma a uma câmara muito maior seria como soprar inutilmente um balão de passageiros. Em vez disso, um supervulcão acumula uma quantidade imensa de magma, que é menos densa que a rocha adjacente e portanto mais flutuável. Em algum momento, de acordo com Caricchi, há magma suficiente na câmara para que sua flutuabilidade quebre a rocha acima dela e dispare uma erupção.

A ideia é apoiada por um estudo de laboratório, também publicado em 5 de janeiro na Nature Geoscience. Uma equipe conduzida pelos geocientistas Wim Malfait e Carmen Sanchez-Valle, da ETH Zurique na Suíça, mediu a densidade de rochas derretidas com composição química semelhante à encontrada em muitos vulcões. Os cientistas usaram a Instalação Europeia de Radiação Síncrotron em Grenoble, na França, para recriar as altas pressões e temperaturas encontradas no interior da Terra.

A partir das medidas de densidade eles puderam determinar a flutuabilidade do magma. “Quanto maior fica a câmara de magma, mais importante se torna a flutuabilidade”, observa Malfait.

Caricchi e sua equipe também calcularam o tamanho teórico máximo que uma câmara de magma poderia atingir. O tamanho máximo para uma câmara de magma sem erupções depende de um equilíbrio entre sua espessura e sua extensão horizontal: uma câmara muito espessa entra em erupção, enquanto uma câmara muito vasta começa a se refriar e cristalizar nas bordas.

De acorco com Caricchi, a maior câmara possível teria cerca de 90 quilômetros de diâmetro e conteria cerca de 35 mil quilômetros cúbicos de magma. Isso é sete vezes a quantidade de magma expelido durante a maior erupção conhecida – a da caldeira La Garita, há 28 milhões de anos no que hoje é o Colorado.

Este artigo foi reproduzido com permissão da revista Nature. O artigo foi publicado pela primeira vez em 5 de janeiro de 2014.
Scientific American Brasil

Notícias Geografia Hoje


Cientistas associam luminosidade do solo a terremotos
É muito provável que grandes falhas geológicas gerem luzes estranhas


Downing Street/Flickr
Luzes foram relatadas pouco antes de um terremoto devastador atingir L’Aquila, na Itália, em 2009. Imagem: Flickr/Downing Street

Alexandra Witze e Revista Nature

Um novo catálogo de luzes de terremotos – brilhos misteriosos que às vezes são relatados antes ou durante movimentos sísmicos – descobriu que elas aparecem com mais frequência em ambientes com fendas geológicas, onde o solo está se afastando. O trabalho é a abordagem mais recente dessas luzes enigmáticas, que são descritas há séculos por testemunhas oculares mas que ainda não foram totalmente explicadas por cientistas.

O estudo, publicado no volume de janeiro/fevereiro do periódico Seismological Research Letters, reúne vários campos de pesquisa para propor um mecanismo de emissão das luzes. Os autores sugerem que, durante um terremoto, o estresse do atrito entre rochas produz cargas elétricas, que viajam ao longo das falhas geológicas quase verticais que são comuns em áreas com fendas. Quando as cargas atingem a superfície da Terra e interagem com a atmosfera, elas geram luminosidade.

“Luzes de terremotos são um fenômeno real – elas não são OVNIs”, explica o principal autor do estudo, Robert Thériault, geólogo do Ministério de Recursos Naturais do Quebec, em Quebec City, no Canadá. “podem ser explicadas cientificamente”.

Na fronteira

Um dos problemas de estudar luzes de terremotos é que relatos legítimos se misturam com relatos imprecisos. Algumas testemunhas descrevem coisas improváveis, como chamas e fumaça saindo do solo; outras mencionam nuvens brilhantes que poderiam ser uma aurora, ou faixas de fogos celestes que poderiam ser meteoros.

Mas alguns relatos não podem ser explicados com facilidade, observa John Ebel, geofísico do Boston College em Massachusetts. Em 1727, por exemplo, um homem da Nova Inglaterra passeando com seu cachorro em uma tarde de outubro sentiu o chão começar a tremer e observou uma bola de luz atingir seu animal, que começou a latir.

“Estamos todos interessados em descobrir mais sobre luzes de terremotos”, declara Ebel, não envolvido no novo estudo. “Essa só não é uma área comum de pesquisa científica porque não há como fazer experimentos”.

A equipe de Thériault decidiu compilar todos os relatos confiáveis que conseguiram encontrar, desde o ano 1600 até os dias de hoje. Eles se concentraram em 27 terremotos das Américas e 38 da Europa, e descartaram muitas histórias bizarras. Na costa peruana, em agosto de 2007, um pescador relatou que o céu se tornou violeta durante alguns minutos antes de o mar começar a tremer. Perto de Ebingen, na Alemanha, em novembro de 1911, uma mulher relatou ver luzes no solo que se moviam “como cobras” no início de um terremoto.

Dos 65 terremotos estudados, 56 ocorreram ao longo de uma área com fendas ativas ou antigas. E 63 dos 65 terremotos ocorreram onde as falhas geológicas que se romperam eram quase verticais – em contraste com os ângulos mais rasos de muitas grandes falhas.

De acordo com Thériault e seus colegas, essa geometria aguda poderia explicar o aparecimento de luzes de terremotos. Um dos membros da equipe, Friedemann Freund, físico mineral do Centro de Pesquisa Ames, da Nasa em Moffett Field, Califórnia, suspeita que tudo isso comece com defeitos em uma rocha, onde átomos de oxigênio dentro da estrutura química do mineral tenham um elétron faltando. Quando o estresse de um terremoto atinge a rocha, isso quebra as ligações químicas envolvidas nesses defeitos, criando buracos com carga elétrica positiva. Esses “buracos p” podem fluir verticalmente para a superfície, disparando fortes efeitos de campos elétricos que podem gerar luz.

Espremendo

Experimentos em laboratório mostraram que campos elétricos podem ser gerados ao espremer alguns tipos de rocha. Mas a ideia de Freund é apenas um de muitos mecanismos possíveis para explicar luzes de terremotos. “Isso faz bastante sentido, mas não significa que esteja certo”, observa Ebel.

O catálogo fornece outras ideias para o estudo de luzes de terremotos, conta Thériault. Sismólogos que monitoram falhas ativas, por exemplo, podem procurar mudanças na condutividade elétrica do solo imediatamente antes ou durante um terremoto.

De maneira mais geral, disseminar ideias sobre essas luzes poderia aumentar a consciência de que elas podem sinalizar terremotos, observa Thériault. O fenômeno já alertou pessoas no passado: perto de L’Aquila, na Itália, em abril de 2009, um homem viu o reflexo de luzes brancas nos móveis de sua cozinha nas primeiras horas da manhã e tirou sua família de casa por precaução. Duas horas depois, um terremoto devastador atingiu a cidade.

Este artigo foi reproduzido com permissão da revista Nature. O artigo foi publicado pela primeira vez em 2 de janeiro de 2014.
Scientific American Brasil

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Rumos da matriz energética brasileira

Aumentar a competitividade é crucial para um crescimento econômico robusto e para construir uma estrutura resiliente. Medidas tomadas para superar gargalos que afetam a competitividade brasileira devem produzir resultados no médio prazo, e seus efeitos devem ser sentidos no consumo de energia. Superados esses gargalos, haverá maior pressão sobre a demanda energética, repercutindo na matriz. Falo, aqui, de incertezas, críticas e desafios para o planejamento energético

Amilcar Guerreiro

Mário Leite
 
Amilcar Guerreiro é diretor de Estudos de Economia da Energia e de Meio Ambiente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e ex-secretário de Energia do Ministério de Minas e Energia

Cinco temas, entre outros, condicionam os rumos da matriz energética brasileira: geopolítica energética mundial, mudança do clima global, perfil sociodemográfico, perfil da indústria e competitividade da economia.

O shale gas, tal como o choque nos preços do petróleo há 40 anos, tem potencial para mudar a geopolítica energética mundial, afetando relações de preço entre os energéticos, a importância estratégica deles e de até algumas regiões do mundo. Basta dizer que Estados Unidos e China, os maiores consumidores de petróleo do mundo, detêm as maiores reservas de shale gas do planeta. O Brasil não está à margem desse cenário. As perspectivas que se abrem para o gás não convencional no País são condicionantes, junto com o pré-sal, da evolução da economia e da matriz energética nacional nos próximos 10 ou 20 anos.

Com relação às mudanças climáticas, parece consenso que se deve ampliar o controle das emissões de gases de efeito estufa (GEE), ou a humanidade sofrerá as consequências de sua própria irresponsabilidade. Os Bric mais Japão e Estados Unidos são responsáveis por mais de 50% das emissões globais de GEE (2005). Excluindo o Brasil, 75% das emissões desses países são devidas à produção e ao uso da energia - índice muito próximo à média mundial - e 33% são devidos somente à produção de energia elétrica. No nosso caso, a elevada participação de renováveis na matriz, quase 45%, reduz muitíssimo essas proporções, para 12% e 1%, respectivamente. A biomassa da cana e a hidreletricidade sustentam essa condição favorável, que pode e deve ser mantida nos próximos anos. Balizam a estratégia de expansão da oferta de energia, com o benefício adicional de se tratar de fontes energéticas próprias, sobre as quais o País tem amplo domínio, inclusive no aspecto tecnológico.

A economia brasileira já é hoje uma economia de baixo carbono, condição que autoriza a meta estratégica de manter a intensidade de carbono na economia. Aqui, os desafios a enfrentar são, portanto, diferentes dos da maioria dos países, os emergentes inclusive.

As alterações no perfil sociodemográfico do País são expressivas. Em passado recente, metade da população tinha menos de 20 anos; hoje, 50% têm 30 ou mais. Outras mudanças relevantes que afetam o padrão de consumo de energia foram: aumento da urbanização e da expectativa de vida, avanço da condição da mulher na sociedade e redução do número de filhos por mulher. Não obstante, haverá, em 10 anos, mais 14 milhões de brasileiros - uma Bélgica e meia! - a demandar mais comida, mais produtos, mais serviços e mais energia.

O País vive um histórico período de bônus demográfico, em que a população em idade produtiva é relativamente maior do que a de idosos, jovens e crianças. Trata-se de mais um fator a impulsionar o crescimento econômico, fator que será tão mais relevante quanto melhor for a capacitação da força de trabalho. A perspectiva de crescimento da economia exerce pressão sobre a demanda de energia, apesar das iniciativas de eficiência energética. A propósito, para ficar apenas na eletricidade, as previsões da demanda já consideram intrinsecamente "retirar" do mercado em 2020 o equivalente à geração de uma hidrelétrica de 8.400 megawatts de capacidade.

A evolução do perfil da indústria nacional é outra incerteza crítica quando se pensa no futuro da matriz energética. Há 25 anos, a fatia da indústria no consumo final energético permanece em 35%. Mas, a indústria de transformação perde participação na economia, e produtos manufaturados perdem importância na pauta de exportações. Isso ainda não se refletiu no consumo energético. Contudo, é de se esperar que mudanças no perfil da indústria afetem o consumo setorial de energia, com rebatimento na matriz energética nacional.

Aumentar a competitividade é crucial para um crescimento econômico robusto e para construir uma estrutura resiliente. Medidas tomadas para superar gargalos que afetam a competitividade brasileira, como redução dos juros reais e das tarifas de energia, concessão de projetos de infraestrutura à iniciativa privada e desoneração das folhas de pagamento para o setor exportador, devem produzir resultados no médio prazo, e seus efeitos devem ser sentidos no consumo de energia. Superados esses gargalos, haverá maior pressão sobre a demanda energética, repercutindo na matriz.

A EPE inicia agora um novo ciclo de estudos do planejamento energético de longo prazo, o segundo desde sua criação, o que levará ao Plano Nacional de Energia 2050. Esses estudos envolvem a discussão desses temas por se tratarem de questões de conteúdo potencialmente modificador e portador de futuro, impondo importantes desafios para o planejamento energético.
Planeta Sustentável 

E se todo mundo usasse ar-condicionado como os americanos?

Demanda global de energia deve aumentar substancialmente, a medida que outros países grandes e quentes crescem e adquirem hábitos de consumo como os dos EUA

Vanessa Barbosa

Agro St. Georg/Creative Commons

Se tem um país calorento no mundo é os Estados Unidos. Atualmente, os americanos usam mais energia do que todas as nações do mundo juntas, para se manterem fresquinhos sob o ar-condicionado. Mas à medida que as condições econômicas melhoram em outros países, o aumento no uso deste eletrodoméstico deverá disparar, colocando uma pressão sem precedentes sobre a oferta global de energia.

É o que aponta um estudo da Universidade de Michigan, que projeta o crescimento da demanda de energia nessa seara nas próximas décadas. Em artigo publicado no periódico científico American Scientist, o pesquisador Michael Sivak calcula que oito países têm potencial de superar os americanos: Índia, China, Indonésia, Nigéria, Paquistão, Bangladesh, Brasil e Filipinas.

Para se ter uma ideia do que pode vir pela frente, apenas a cidade de Mumbai, na Índia, tem potencial de gerar uma demanda equivalente a um quarto do consumo americano de um ano, devido a combinação de dois fatores - uma população suficientemente grande e um clima suficientemente quente.

Sivak calculou a demanda potencial de diferentes países com base no "Índice de arrefecimento", que dá uma indicação da energia necessária para resfriar espaços interiores. Com base nesse índice, ele projetou qual seria o consumo de energia em cada país, se o uso de ar condicionado se tornasse tão prevalente como é nos Estados Unidos, onde 87% dos lares estão equipados com ar condicionado.

De acordo com seu artigo, alguns países já estão chegando próximo disso. Na China, o percentual de domicílios com um aparelho de refrigeração cresceu de menos de 1% em 1990 para 62% em 2003. Na Índia, que em 2007 registrava 2% de lares com ar-condicionado, vê as vendas do aparelhos aumentarem 20% a cada ano.

A implicação direta dessas altas é óbvia - o aumento na demanda por energia, diz Sivak. Segundo o pesquisador, a Índia tem potencial de usar cerca de 14 vezes mais energia para resfriamento que os Estados Unidos.

Já a China e a Indonésia superariam o consumo de energia dos americanos em 5 e 3 vezes, respectivamente. O Brasil também está na lista, com potencial de superar o consumo americano de energia pelo ar-condicionado em quase duas vezes.

Para o pesquisador, um caminho possível para frear este aumento na demanda é o da eficiência energética, com o desenvolvimento de aparelhos de ar-condicionado que entregam a mesma qualidade, mas consomem bem menos energia.

E é preciso pavimentar este caminho o quanto antes. Sivak destaca que a mudança climática deverá pressionar ainda mais a demanda por refrigeração no longo em prazo.

Ele cita um estudo feito pela Agência de Avaliação Ambiental da Holanda, que avaliou o futuro uso de energia residencial para refrigeração no contexto da mudança climática. A projeção preocupa. De acordo com o centro de pesquisa, em 2100 a demanda mundial de energia para o ar condicionado pode aumentar em 72%, como resultado das mudanças climáticas.
Revista Exame

Notícias Geografia Hoje

Invasão silenciosa no Lago Paranoá
Em cinquenta anos, as margens do Paranoá encolheram 15%. Mas há boas notícias também para o futuro do nosso lago: pelos planos oficiais, a partir de 2016 ele pode se converter em fonte de água potável

Lilian Tahan

FOTOS: Beto Barata / BRASÍLIA SUBMERSA / DIVULGAÇÃO


Foi o botânico francês Auguste Glaziou quem primeiro vislumbrou, em 1894, o imenso potencial da profusão de nascentes, córregos e rios na região do Planalto Central onde, 66 anos depois, se ergueu Brasília. O naturalista europeu integrava a missão Cruls, grupo de especialistas encarregado de buscar uma área adequada para construir uma grande cidade. A descrição deixada pelo estudioso para a posteridade anteviu o cenário que apareceria muito tempo depois em pleno cerrado: "Além da utilidade de navegação, a abundância de peixe, que não é de somenos importância, e o cunho de aformoseamento que essas belas águas correntes haviam de dar à no­va capital despertariam certamente a admiração de todas as nações". Décadas depois, a previsão de Glaziou se tornou realidade com o surgimento, no fim dos anos 50, de um dos símbolos mais fortes da aguardada cidade: o Lago Paranoá.

A cor esmeralda das águas represadas dos rios admirados pelo botânico francês é coerente com as riquezas acumuladas no maior reservatório do Distrito Federal. Os 40 km² do lago artificial transformaram-se em fonte de lazer, umidade, energia e multiplicação de dezenas de espécies animais e vegetais. Muitas originárias da própria região. Outras trazidas de diversos pontos do Brasil ou do mundo.

Abastecido por 21 córregos de cinco bacias diferentes, o Paranoá em breve poderá se tornar fornecedor de um bem precioso para quem vive na capital. Pelos planos oficiais, a partir de 2016 o lago também vai se converter em fonte de água potável para 600 mil pessoas, contingente superior à população prevista para a cidade no projeto original.

A despeito do crescente aumento de sua importância, o reservatório que abraça Brasília encolheu nas últimas décadas. Essa relação inversamente proporcional é considerada um risco de efeitos devastadores em caso de negligência dos moradores e, principalmente, das autoridades do DF. Desde que os rios foram represados, em 28 de setembro de 1959 (há exatos 54 anos), uma área gigantesca ficou alagada e uma onda de prosperidade se formou no coração da capital. Ao mesmo tempo, iniciou-se uma ação contrária. Em um movimento contínuo, a pressão urbana força as margens e come o Paranoá pelas beiradas.

Exposto a um ininterrupto processo de assoreamento, o reservatório já perdeu 15% de seu tamanho inicial. Mais de dois km de seu espelho-d’água deixaram de existir. Projeções mais catastróficas feitas por especialistas advertem que, se nenhuma providência for tomada, em 300 anos esse oásis poderá virar uma miragem. O cenário desalentador ganha contornos mais dramáticos nas previsões do secretário de Meio Ambiente do Distrito Federal, Eduardo Brandão. "Esse tempo será mais curto, porque a cidade hoje cresce em ritmo muito mais frenético do que há vinte anos", acredita o ambientalista, também presidente do Partido Verde no DF. O lago, evidentemente, não vai secar, mas nenhum especialista ouvido por VEJA BRASÍLIA deixou de ressaltar os perigos do processo de desgaste do Paranoá.

Diretor da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento do Distrito Federal (Adasa), o geólogo Diógenes Mortari confirma que o aumento da população e o incremento das construções provocaram impacto direto no seu uso. A ponto de a Adasa, em conjunto com outras empresas do governo, como a Companhia de Saneamento do DF (Caesb) e a Companhia Energética de Brasília (CEB), ter de controlar sistematicamente a cota de água. Uma régua de medição revela o grau de gravidade do nível do reservatório. No estágio amarelo, significa atenção. No vermelho, determina que a vazão de água deve ser proibida. "O crescimento urbano explodiu, mais pessoas passaram a se valer do lago e então começaram os conflitos", diz Mortari.

O diretor da Adasa não acredita no desaparecimento, mas admite que as pontas atingiram um nível preocupante de assoreamento, nome técnico do acúmulo de sedimentos no fundo. "Em termos de volume é algo pequeno, mas, se olharmos os braços do lago, veremos um excesso fora do comum."

Diante desse cenário, a Adasa também passou a fazer o controle da drenagem pluvial por meio de bacias de contenção e de caixas de decantação, capazes de filtrar as águas que correm para o Paranoá. 
Revista Veja

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Notícias Geografia Hoje



Crise política vira conflito étnico e deixa Sudão do Sul à beira da guerra civil


DEUTSCHE WELLE

O Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou por unanimidade na terça-feira (24) uma resolução para reforçar com 5.500 capacetes azuis a missão no Sudão do Sul (UNMISS), o que eleva o número de soldados na região para 12.500.

"Não há solução militar para este conflito. É uma crise política que requer uma solução pacífica", disse o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, após agradecer ao Conselho de Segurança pela pronta resposta.

Os soldados serão transferidos das missões de Congo, Darfur, Costa do Marfim, Libéria e da região sudanesa de Abyei para ajudar a frear a escalada de violência que deixou milhares de mortos nos últimos dias.

O embaixador do Sudão do Sul na ONU, Francis Deng, saudou a resolução. "Eu asseguro que meu governo está fazendo todo o possível, nessas difíceis circunstâncias, para restabelecer a ordem e a estabilidade."

A UM PASSO DA GUERRA CIVIL

O ministro alemão do Exterior, Frank-Walter Steinmeier, também elogiou a resolução. "Precisamos evitar que o conflito se torne uma guerra civil motivada por razões étnicas", disse.

A correspondente da DW Hannah McNeish disse que no país já se fala em guerra civil. "A situação passou de um conflito político para assassinatos étnicos generalizados", disse McNeish, que está na capital do Sudão do Sul, Juba. Segundo ela, civis armados se juntaram a várias facções militares e estão atacando etnias rivais.

Os tumultos no país começaram quando o presidente Salva Kiir acusou o ex-vice-presidente Riek Machar de uma tentativa de golpe de Estado. A disputa política entre eles está por trás do conflito, já que ambos pertencem a etnias diferentes. Kiir faz parte da etnia Dinka, o maior grupo étnico do Sudão do Sul, enquanto Machar pertence à comunidade étnica Lou Nuer. Ambas as tribos têm travado violentos conflitos desde a independência do Sudão do Sul, em 2011.

O secretário de Estado norte-americano John Kerry tenta mediar negociações para um cessar-fogo. De acordo com a emissora CNN, Kerry conversou por telefone com o ex-vice-presidente Riek Machar.

MILHARES DE MORTOS

Segundo informações da UNMISS, o número de mortos nos combates dos últimos dias é mais alto do que se estimava. O vice-chefe da missão, Toby Lanzer, disse não ter dúvidas de que o número de vítimas chega aos milhares. Até então, as estimativas eram de 500 mortos.

A alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Navi Pillay, informou em Genebra sobre a descoberta de valas comuns no país. Cerca de 45 mil pessoas já se refugiaram em abrigos da ONU para escapar da onda de violência.

FATOR PETRÓLEO

O setor petrolífero foi seriamente afetado pelo conflito. As companhias de petróleo do país estão evacuando seus funcionários depois que pelo menos cinco trabalhadores sul-sudaneses foram mortos na semana passada. O governo, no entanto, insiste que as instalações não foram danificadas, e que o petróleo continua sendo distribuído.

O setor responde por mais de 95% da economia do Sudão do Sul. O jovem país se tornou rico em petróleo após a independência, mas continua extremamente pobre e repleto de armas de pequeno porte devido ao longo conflito com o Sudão, que culminou na separação dos dois países.
Folha de S. Paulo

Notícias Geografia Hoje


Importante para deter enchentes na orla, manguezal é ecossistema ameaçado

DEUTSCHE WELLE

Uma floresta que se ergue do mar. Nas costas tropicais, árvores singulares formam um cinturão verde entre o mar e a terra. Os mangues precisam de águas mornas e uma mistura de água salgada e doce para sobreviver. Numerosas espécies de aves vivem entre seus ramos e raízes aéreas. Na água, peixes nadam entre suas raízes e caranguejos reviram o fundo lamacento.

Desde os anos 80, entretanto, os valiosos manguezais diminuíram em 35% em todo o mundo. Há várias razões para isso, explica Ulrich Saint-Paul, do Centro Leibniz de Ecologia Tropical Marinha, da Universidade de Bremen. Muitas vezes, eles são removidos para a construção de portos, aeroportos ou residências. "Mas estas áreas também são cada vez mais usadas ​para abrigar culturas de caranguejos e camarões, destinadas ao mercado internacional."

Para que o exterior receba camarões a preços baratos, os países que abrigam manguezais pagam um preço alto. Com o fim dessa vegetação, eles perdem um recurso importante, comenta Saint-Paul. "Os mangues não são só importantes zonas de reprodução de peixes, mas servem à proteção costeira. São barreiras naturais contra tempestades e, no quadro climático global, têm uma função importante, pois retêm dióxido de carbono."

A construção de barragens ou o desvio de rios também ameaçam os manguezais, lembra o especialista em política de desenvolvimento René Capote, que examinou manguezais em sua terra natal, Cuba, para seu trabalho de doutorado pela Universidade de Bonn.

Segundo ele, os manguezais garantem uma água mais limpa na zona costeira, através da filtragem de sedimentos. "Isso também é importante para a preservação dos recifes de coral e para termos praias limpas e, portanto, para o turismo", lembra Capote.

BARREIRA NATURAL CONTRA TEMPESTADES

Em eventos climáticos extremos, os manguezais atuam de várias maneiras como um cinturão de proteção. "Esse ecossistema pode absorver uma grande quantidade de água, fazendo com que a inundação de áreas povoadas após fortes chuvas seja reduzida", diz o especialista cubano. Além disso, eles também formam uma barreira natural contra ventos e ondas. "Suas raízes aéreas e galhos seguram a inundação", diz Femke Tonneijck, da organização ambientalista Wetlands International, que luta pela preservação das vegetações de mangue.

Além disso, esse ecossistema pode fornecer lenha e alimentos às populações costeiras, na época posterior a uma catástrofe natural. "No entanto, é necessário um cinturão de manguezais muito largo para atenuar uma grande enchente", sublinha Tonneijck. Por isso, ela luta por uma revitalização das costas por meio de ações complementares, como a construção de diques, em regiões onde os manguezais já desapareceram. Muitas vezes, nessas áreas não há espaço suficiente para muitos quilômetros de cinturão verde.

O replantio também ajuda a combater a erosão costeira. "Trabalhamos numa região de Java onde os mangues foram substituídos por viveiros de peixes e camarões. Para a recuperação, você também precisa de sedimentos, onde os mangues crescem. Em vez de construir estruturas duras, como diques, para proteger a costa de uma erosão adicional, utilizamos estruturas de madeira, similares a cercas, que permitem a passagem de sedimentos. Este método tem sido usado há séculos na Holanda e no norte da Alemanha", diz Tonneijck.

"Existem hoje técnicas muito bem sucedidas, e o Banco Mundial financia tais projetos com muito dinheiro", diz Saint-Paul. "Mas, nesses casos, sempre se comete um erro: os manguezais são replantados como monoculturas. A biodiversidade natural, que proporciona a uma floresta uma estabilidade ecológica muito maior, não é considerada."

Capote enfatiza ser necessário um planejamento de longo prazo e um monitoramento constante das condições de crescimento em projetos de revitalização de manguezais. Muitos projetos têm, segundo ele, fracassado ao fim de poucos anos devido a negligências nos trabalhos de preparo e manutenção de longo prazo.

CULTIVO SUSTENTÁVEL

Capote defende ainda a gestão sustentável dos manguezais existentes, incluindo medidas para uma criação sustentável de peixes e camarão. "Deveria ser introduzido um sistema de rotatividade que protegesse certas áreas e que desse a zonas de mangue já exploradas a oportunidade de se recuperarem. Além disso, deve ser evitada uma poluição duradoura através de rações com aditivos químicos. Uma área só consegue alimentar um certo número de camarões. É preciso escolher entre ganhos de curto prazo, que levam à destruição de manguezais, e um lucro menor, que colabora na conservação dessas áreas a longo prazo."

A consciência da importância dos manguezais aumenta após cada catástrofe provocada por tempestades tropicais, mas ela dura pouco, critica Saint-Paul. "Precisamos de um programa educativo de longo prazo, tanto nas escolas como na educação de adultos, para fazer com que as pessoas que moram perto dos manguezais percebam a importância dessa vegetação e saibam as razões pelas quais ela deve ser protegida." 
Folha de S. Paulo

Notícias Geografia Hoje

O que modelos revelam sobre impactos de mudanças climáticas?
Modelos de impacto tentam traduzir mudanças em efeitos sobre a agricultura, clima e saúde humana
Stephanie Paige Ogburn e ClimateWire

A ciência subjacente aos modelos climáticos melhorou muito nas últimas décadas, em parte devido a um esforço organizado de pesquisa conhecido como CMIP (Projeto de Intercomparação de Modelos Casados, em tradução literal). Através desse trabalho, cientistas melhoraram a precisão de modelos climáticos e sua representação dos processos físicos da Terra.

Mas, de acordo com pesquisadores, outro tipo de modelo usado para projetar impactos climáticos ainda apresenta incerteza significativa. Esses modelos, chamados de modelos de impacto, tomam os resultados de modelos climáticos que mostram mudanças na atmosfera e em sistemas oceânicos e os traduzem em efeitos sobre aspectos como agricultura, inundações, secas e até saúde humana.

Esses resultados seriam incrivelmente úteis para planejadores e desenvolvedores de políticas, mas modelos de impacto ainda em fase inicial, com projeções não muito confiáveis.

Essa é uma das principais razões de cientistas engajados no Instituto Potsdam para Pesquisa sobre o Impacto Climático, na Alemanha, estarem trabalhando para melhorá-los. Esse esforço, conhecido como Projeto do Modelo de Impacto Intersetorial e de Intercomparação, ou ISI-MIP, foi lançado no começo de 2012.

No começo dessa semana, um grupo de mais de 30 equipes de pesquisa de 12 países, todos envolvidos no projeto ISI-MIP, publicaram seus primeiro resultados em uma edição especial do periódico Proceedings of the National Academy of Sciences.

Modelos de impacto são “o segundo passo após os modelos climáticos, e são relevantes para a compreensão do significado da mudança climática para os humanos”, declarou Katja Frieler, pesquisadora de impactos climáticos do Instituto Potsdam, que está coordenando o projeto.

Enquanto os resultados de muitas simulações do modelo têm níveis consideráveis de incerteza, esse primeiro esforço é parte de um processo comparativo semelhante ao de modelos climáticos anteriores. De acordo com Frieler, mais cedo ou mais tarde, o o conjunto de iniciativas tornará modelos de impacto mais robustos.

“Mesmo se houver diferenças entre os modelos, é extremamente útil analisar de onde eles vêm e onde estão suas incertezas”, observou ela.

Os artigos do projeto também foram enviados ao Grupo de Trabalho 2 do Painel Intergovernamental para a Mudança Climática, que poderá usar os resultados em sua avaliação dos impactos da mudança climática.

Será que plantas podem se adaptar a secas frequentes?

Um dos estudos do projeto, por exemplo, explorou o impacto da mudança climática sobre secas hidrológicas, um tipo de seca associada a uma redução no escoamento, o que leva a faltas d’água em rios, aquíferos, reservatórios e outras partes de uma bacia hidrográfica.

Liderados por Christel Prudhomme, hidróloga do Centro para Ecologia & Hidrologia em Wallingford, na Inglaterra, pesquisadores concluíram que em todos os modelos globais de impacto usados em seu estudo, à exceção de um, a seca deve aumentar tanto em extensão global quanto em frequência até o final do século.

Apesar de esse estudo usar uma medida diferente para a seca (trabalhos anteriores se concentraram na umidade do solo), essa descoberta não é qualitativamente diferente do conjunto de resultados de pesquisas realizadas sobre secas e mudança climática, declara Martin Hoerling, meteorologista da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica do Laboratório de Pesquisa do Sistema Terrestre.

Mas um resultado inconsistente no trabalho de Prudhomme levanta perguntas sobre como um planeta cada vez mais quente pode interagir com a biosfera, alterando potencialmente projeções futuras de secas.

Um modelo de impacto usado no estudo, que leva em conta como plantas podem se ajustar a um aumento no dióxido de carbono, não mostrou aumento significativo nas secas. Chamado de modelo JULES, o trabalho supõe que plantas vão “respirar” menos em uma atmosfera rica em CO2, e que portanto não perderão tanta água no processo.

“Se as plantas não drenarem tanto o solo, haverá mais água disponível para escoar”, apontou Prudhomme.

Prudhomme acredita que os resultados do modelo JULES devem fazer pesquisadores re-examinarem suas conclusões anteriores sobre seca hidrológica na mudança climática.

“Existe muita incerteza porque a transformação da chuva em rios é complexa”, declarou ela. “Todos esses modelos tentam resolver essa complexidade de maneiras levemente diferentes”.

E adicionou: “Está na hora de observar modelos hidrológicos com seriedade e compreender suas deficiências, compreender os processos que ainda não conseguimos captar muito bem... e precisamos compreender melhor os motivos de não conseguirmos fazê-lo”.

Hoerling concordou, argumentando que “Esses caras ilustraram outra camada de complexidade que nós realmente precisamos examinar”, especificamente: como plantas respondem ao aumento de gases estufa e como isso afeta a umidade do solo e o escoamento.

Mas ele também salientou que apesar de o modelo JULES demontrar que o ecossistema global poderia mitigar impactos da mudança climática sobre o escoamento de superfície e a hidrologia, todos os sinais ainda apontam para a conclusão de que secas serão piores até o fim do século.

“O que eu ficaria relutante em extrair daqui é que esses autores emitiram um alerta de que talvez as secas não aumentem”, comentou ele. “O conjunto de evidências afirma que a ocorrência de secas vai aumentar”.

Um mergulho nas complexidades de inundações

Outro artigo foi o primeiro a usar tanto modelos climáticos quanto simulações de fluxo de rios de vários modelos hidrológicos para abordar mudanças em riscos globais de inundação. Apesar do fato de cientistas esperarem que impactos de inundações aumentem com a mudança climática, existem poucos artigos publicados nessa área de pesquisa.

De acordo com Rutger Dankers, cienstista do Escritório de Meterologia do Reino Unido, e principal autor do artigo, os resultados, baseados no pior caso de aquecimento conhecido como RCP 8,5, sugerem que em metade das áreas avaliadas, inundações a cada 30 anos se tornarão mais frequentes até o final do século.

Em áreas onde o risco de inundação diminuiu, Dankers sugeriu que isso talvez se deva a reduções em nevascas ligadas à mudança climática.

Mas os modelos de impacto usados no estudo de enchentes também tiveram algumas discordâncias, que são uma fonte de incerteza, apontou ele. Alguns modelos, por exemplo, podem prever aumentos nas enchentes de uma área, enquanto outras preveem reduções.

Essa informação sobre incerteza pode ser devolvida aos desenvolvedores de modelos de impacto, que podem usá-la para melhorar os modelos e descobrir porquê eles têm resultados contraditórios.

“Quais são as razões por trás disso, e quais são os processos de que não temos certeza?”, pergunta Dankers.

Outros resultados de estudos com modelos de impacto publicados na edição especial observaram impactos sobre a disponibilidade de água, agricultura e saúde.

Um estudo quantificou o quanto a escassez de água vai aumentar devido à mudança climática, além da escassez do simples crescimento populacional.

A pesquisa também identificou pontos importantes de impactos da mudança climática na Amazônia, no Mediterrâneo e no Leste da África, onde pressões diferentes, como seca e agricultura, podem interagir.

Frieler, do Instituto Potsdam, declarou que seu grupo planeja continuar a trabalhar em melhorar estudos com modelos de impacto. O Instituto também está tornando os resultados de suas simulações disponíveis a qualquer pesquisador que queira usá-los.

O objetivo, de acordo com ela, é fazer para modelos de impacto o que o CMIP fez para os modelos climáticos: concentrar o foco científico em áreas específicas de melhorias e finalmente obter um conjunto robusto e confiável de modelos.

“Nós acreditamos que seria ótimo estabelecer algo assim para os modelos de impacto também”, conclui ela.
Scientific American Brasil

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Notícias Geografia Hoje


Análise: Fantasma do autoritarismo paira sobre o Egito


BBC BRASIL

Ahmad Harara raramente é visto sem seus óculos de sol da Ray-Ban. Mas para esse dentista egípcio de 33 anos, o acessório não é uma mera questão de estilo.

Quando ele tira os óculos, é para mostrar dois olhos que já não podem ver. O da esquerda é uma prótese e vem com uma pesquena inscrição: "hurriya", que em árabe significa liberdade.

A luta pela liberdade custou a visão de Harara. Ele perdeu cada um dos olhos em um momento diferente no ano de 2011. Nas duas vezes, recebeu tiros da polícia, segundo conta.

Os estilhaços de uma bala lhe roubaram a visão direita no dia 28 de janeiro, dias após o início dos protestos que culminaram na queda do ex-presidente Hosni Mubarak, um dos pontos altos da Primavera Árabe.

O segundo olho foi atingido por um fraco-atirador, em novembro, segundo ele.

"Eu nem sou a pessoa que está pagando o maior preço por tudo isso", diz, enquanto fuma e se serve de café ao estilo turco no Cafe Riche, ponto de encontro de dissidentes políticos no Cairo há mais de meio século.

"Há outros com sequelas muito piores, e eles estão seguindo em frente", diz.

MILITARES, INTOCÁVEIS

Harara também segue em frente e não deixou de lutar contra o regime que o deixou às escuras e que, ele diz, ainda não foi derrubado.

"O sistema continua o mesmo", diz. "O Exército mantém sua posição. Ninguém é responsabilizado por nada. Ninguém fiscaliza. Pelo contrário, eles conseguiram ainda mais privilégios", diz.

"Os militares controlam o Egito desde 1952 e não vem razão para qualquer mudança apenas porque os jovens foram para as ruas", afirma.

Os jovens ainda ocupam as ruas egípcias, ainda que em grupos menores que os vistos em 2011. Ele enfrentam gás de pimenta, canhões de água, sob o risco de pagar com a própria vida, desafiando a lei draconiana que agora proíbe manifestações no país.

Ativistas de direitos humanos dizem que a lei é uma tentativa de aplacar um dos principais ganhos da revolução - a liberdade de expressão.

Dezenas de ativistas foram presos ao desafiar a nova lei. O principal alvo são os simpatizantes do ex-presidente Mohammed Morsi, derrubado pelos militares, além de membros do seu movimento político, a Irmandande Muçulmana.

Detenções

A revolução que derrubou Mubarak abriu caminho para os islamistas chegarem ao poder, liderados por Morsi.

O líder da Irmandade Muçulmana ficou apenas um ano no poder, como o primeiro presidente civil eleito por voto livre.

Morsi acabou derrubado pelos militares em julho deste ano, em um movimento com forte apoio de setores seculares e outros descontentes com a crescente influência religiosa em seu governo. Antes do afastamento, milhares foram às ruas do Egito pedir a saída de Morsi.

Os islâmitas reagiram, e foram reprimidos. Em agosto, as autoridades disperaram com violência duas manifestações pró-Morsi, matando centenas de simpatizantes.

Desde então, milhares foram detidos, incluindo vários membros do alto escalão da Irmandade Muçulmana, incluindo o próprio Morsi, acusado de traição à pátria.

A RESISTÊNCIA ISLAMITA

Tantos "irmãos" muçulmanos estão atrás da grade que a reportagem foi buscar as "irmãs", membros do movimento.

Encontramos um trio no distrito de Nasr City, no Cairo. Uma delas é Wafaa Hefny, uma professora universitária, bastante expansiva.

"Nunca vou desistir", diz ela. "Puxei o meu avô".

Foi seu avô, Hassan al-Banna, quem fundou a Irmandade Muçulmana em 1928. Wafaa diz que o grupo está, na pior das hipóteses, em uma crise, mas está se adaptando à atual realidade.

"Toda a cúpula foi presa", diz. "Em cada distrito, o primeiro, o segundo e até o terceiro grau de liderança foi preso. Mas nós já promovemos os substitutos. Não há lugar vago", diz, com entusiasmo.

Sem divisão

A reportagem acompanhou Wafaa em uma visita a uma jovem viúva, Alshaimaa Abdallah, cujo marido foi morto em agosto.

Alshaimaa nos recebeu coberta com o hijab. Ela disse que seu marido não era um membro da Irmandade Muçulmana, era "apenas um devoto muçulmano, defendendo o Islã".

Agora que ele está morto, Alshaimaa diz que ela e sua família estão prontos a se juntar à Irmandade Muçulmana.

Apesar da dura realidade, de ter de dizer ao filho de quatro anos que o pai morto "está viajando", Alshaimaa se diz "otimista" com o futuro do Egito, dizendo que o país não vai se dividir.

"É muito difícil nos separar. Nos bairros, as pessoas são muito próximas às outras, mesmo se têm posições políticas diferentes", diz.

Culto ao general Sisi

A realidade que se apresenta, no entanto, é de uma dolorosa e amedrontadora divisão na sociedade egípcia.

O que se vê, na terra dos faraós, é a busca por estabilidade e por um líder forte.

Quem tem se apresentado a assumir esse papel é o homem por trás da deposição de Morsi, o general Abdul Fattah al-Sisi, comandante do Exército.

Se Sisi se candidatar a presidente em 2014, e tudo indica que ele o fará, a previsão é que ganhe com folga.

Na praça Tahrir, onde a multidão derrubou o ex-presidente e líder militiar Hosni Mubarak, hoje outra pequena multidão clama para que outro militar seja conduzido ao poder.

"Te amamos, Sisi", cantam os manifestantes, onde antes se ouviam gritos pedindo liberdade e democracia.

"Sisi é uma coroa na cabçea dos egípcios", diz um velho homem na praça Tahrir. "Ele evitou um mar de sangue".

No Egito, muitos dizem que Sisi evitou uma guerra civil ao depor Morsi. O culto ao general é tamanho que seu rosto estampa latas de óleo, pijamas, embalagens das mais variadas e até doces.

No Chocolate Lounge, um café popular entre os diplomatas, o rosto de Sisi enfeita cupcakes e macaroons. Segundo o dono do lugar, os produtos que homenageiam o general são os campeões de venda.

MENOS ESPERANÇA

Para quem lutou pela queda de Mubarak, todo esse culto a Sisi deixa um gosto amargo.

"O regime militar é a contrarrevolução", diz Harara, o dentista que perdeu a visão.

"Eles ainda tentam controlar o país. O Exército nos enganou", diz.

Há no Egito a sensação de que a revolução ainda não é uma obra acabada. Ainda que dois presidentes tenham sido derrubados em três anos, a velha ordem não foi demolida.

O Exército mantem o poder e a esperança de um novo Egito se dilui.

O país não está muito diferente de antes da revolução, segundo Tamara Alrifai, da ONG Human Rights Watch.

"A liberdade de expressão parece ter ficado pior que antes de 2011", diz.

"Há pouco espaço para a oposição na imprensa e há uma onda de detenções e desaparecimentos de qualquer um que ouse desafiar a atual situação. É frustrante ver que quase voltamos ao ponto onde estávamos, três anos atrás", diz.

'OUTRO MUBARAK'

No próximo ano, os egípcios vão votar por uma nova constituição, um novo presidente e um novo Parlamento.

À primeira vista, tudo parece dentro do rito democrático, mas essa não é a realidade, segundo analistas.

"Sisi controla a polícia, o Exército, o Judiciário e a imprensa", me disse um analista independente, que não quis revelar o nome.

"Ele é popular e vai conseguir muitos votos. O temor é que, uma vez no poder, ele nunca vai querer sair. Sisi pode ser apenas um outro Mubarak". 
Folha de S. Paulo

Notícias Geografia Hoje


Local do atentado com carro-bomba em Beirute em 27 de dezembro de 2013 (AFP, Gino Raidy)
 
Análise: Conflito sectário leva Líbano a risco de vácuo de poder
 
BBC BRASIL

A cada assassinato no Líbano, a lista dos prováveis culpados normalmente é limitada a duas possibilidades: Síria ou Israel.

É assim que pensa a maioria dos cidadãos libaneses, que já perdeu a conta de quantas vezes presenciou ou viu na TV compatriotas ou figurões da política nacional mortos ou feridos por ataques inesperados nas ruas das principais cidades do país.

Na semana passada, o ex-ministro das Finanças, Muhammad Shattah, engrossou as estatísticas. Vítima de um ataque com carro bomba, ele foi enterrado neste domingo.

Mas a busca pelas reais motivações desses assassinatos é bem mais complicada e envolve normalmente a seguinte a pergunta: qual é o real propósito desses atentados?

Às vezes, a intenção é apenas aterrorizar. Em outras ocasiões, é privar partidos políticos de suas lideranças mais proeminentes.

Com o assassinato de Shattah, parece que os dois objetivos convergiram em um único: aniquilar um líder em potencial durante um período em que o país está profundamente dividido quanto à guerra civil na vizinha Síria.

Sunita, Shattah era um dos principais conselheiros do ex-primeiro-ministro Saad Hariri. Ambos se opunham ao presidente da Síria, Bashar al-Assad, e ao Hezbollah, o grupo radical xiita que, nos últimos meses, vem enviando reforços para o outro lado da fronteira para apoiar o governo sírio.

O atentado revela uma situação peculiar do país. Não há uma resposta conclusiva sobre "quem e o por que" da longa lista de assassinatos não resolvidos no Líbano.

Porém, não há dúvida de que Shattah era um cérebro da oposição sunita, que se preparava para alcançar um papel maior no país, enquanto tentava convencer a comunidade internacional a apoiar a neutralidade do país no conflito armado na Síria.

POLARIZADO

À BBC, duas fontes confirmaram que Shattah era um dos nomes mais cotados para ocupar o cargo de primeiro-ministro do país, vago há nove meses.

A formação de um gabinete requereria o apoio do presidente do país, Michel Suleiman, que é cristão. Suleiman teria dado aval à escolha de um novo premiê, mas ainda não há certeza sobre isso.

Shattah, um político moderado e um ex-ministro da Economia que nunca teve grande destaque na política, parecia, no entanto, um nome pouco provável para o posto.

Por tradição, o primeiro-ministro do Líbano é sempre um sunita.

Mas em um país profundamente polarizado por um conflito sectário, especialmente devido à sua longa história e a seus laços com a Síria, poucos políticos sunitas conquistam o feito de ter tanto o apoio das ruas quanto do Hezbollah e dos correligionários de Assad.

Embora os xiitas rejeitariam o nome de Shattah para premiê, seus apoiadores e os de Suleiman poderiam unir forças em torno de seu nome. Mas até o assassinato dele, não havia qualquer indicativo que isso aconteceria.

De qualquer forma, o atentado contra o ex-ministro das Finanças retira do campo político um estrategista-chave e possivelmente o único político sunita que poderia acabar com a incerteza existente no país.

O assassinato também envia uma mensagem a Hariri e aos opositores de Assad atualmente abrigados no Líbano.

VOZ MODERADA

Especialistas apontam que o Líbano poderia enfrentar um vácuo de poder nos próximos meses. As eleições para o Parlamento têm de ser convocadas até o próximo verão e o mandato do atual presidente se encerra em maio.

Suleiman advoga abertamente pela neutralidade do Líbano no conflito da Síria e vem surpreendendo ao criticar abertamente o Hezbollah. Em uma recente entrevista à BBC, ele pediu ao grupo que retire seus militantes da Síria.

Considerado uma voz moderada, Shattah foi embaixador nos Estados Unidos e ainda tinha boas conexões em Washington. Ele também foi um dos principais braços direitos do pai de Saad Hariri, Rafik Hariri, que morreu em 2005 vítima de um atentado com carro bomba, a poucos metros do local onde o ex-ministro das Finanças foi morto.

Após a confirmação da morte de Shattah, Saad Hariri acusou a Síria e o Hezbollah de estarem por trás do ataque.

"Aqueles que assassinaram Muhammad Shattah são os mesmos que assassinaram meu pai; também são os mesmos que querem assassinar o Líbano", disse ele.

O governo da Síria negou envolvimento no atentado enquanto a liderança do Hezbollah condenou o ataque, classificando-o como um "crime hediondo", mas sem fazer quaisquer acusações. Atipicamente, dessa vez, Israel não foi implicado no episódio.

A tensão política no Líbano vem sendo agravada recentemente pela guerra civil na Síria. Mas todas as crises por quais passa o pequeno país estão ligadas, direta ou indiretamente, ao seu vizinho mais poderoso.

Aliados da Síria no Líbano, como o Hezbollah, reivindicam grande parte das cadeiras no Parlamento, enquanto a Arábia Saudita, que apoia Hariri e se opõe a Assad, critica qualquer proposta de formação de um gabinete que incluiria o Hezbollah, que, por sua vez, apoia o presidente sírio, Bashar al-Assad.

Cerca de meia hora antes de sua morte, Shattah havia tuitado que o "Hezbollah vem pressionando para obter poderes semelhantes tanto em segurança quanto em questões de política externa que a Síria vem exercendo no Líbano nos últimos 15 anos".

Amigo e aliado de Shattah, o parlamentar libanês Bassem el-Shabb acrescentou que o ex-ministro de Finanças vinha trabalhando duro para convencer a comunidade internacional a apoiar a neutralidade do Líbano no conflito sírio.

PAZ NA SÍRIA

Shattah também vinha sendo um principais políticos libaneses a manifestar apoio à realização de um encontro paralelo à conferência de paz sobre a Síria, em janeiro do ano que vem, na Suíça.

Nessa reunião, ele propunha que a comunidade internacional discutisse o futuro do Líbano.

O objetivo do ex-ministro das Finanças seria pressionar o Hezbollah a aceitar um acordo para a retirada de suas tropas da Síria.

Shattah havia escrito uma carta aberta ao presidente do Irã, Hassan Rouhani na qual fazia tal apelo.

Mas o ex-ministro das Finanças morreu antes que pudesse colher assinaturas dos parlamentares do Líbano para levar adiante a proposta.

Fontes ouvidas pela BBC afirmam, entretanto, que Shattah permanecia pouco otimista de que a Arábia Saudita e o Irã, outro aliado do Hezbollah, se sentariam à mesa para discutir a questão.

O Hezbollah, por sua vez, também vem pagando o preço de seu envolvimento na Síria. Nas últimas semanas, o centro nervoso do grupo, nos subúrbios ao sul de Beirute, vêm sendo alvo de atentados suicidas.

Acredita-se que grupos rebeldes sírios, opositores do presidente Bashar al-Assad, estariam por trás desses ataques.

O Líbano ainda é assombrado por uma longa série de assassinatos não resolvidos desde a morte do ex-premiê Rafik Hariri, em 2005. Um tribunal internacional que investiga o ataque indiciou vários membros do Hezbollah e o governo sírio. Os julgamentos devem começar em meados de janeiro do ano que vem, em Haia, na Holanda.

A maioria desses assassinatos ocorreu antes do início do conflito na Síria, em março de 2011.

O assassinato de Shattah parece ser uma continuação dessa tendência e um lembrete violento de que o destino do Líbano está inextricavelmente ligado ao resultado da guerra na Síria. 
Folha de S. Paulo

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