terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Notícias Geografia Hoje


Estudos dizem que existem 17 bilhões de 'Terras' na Via Láctea
Dois estudos independentes chegaram à conclusão que pelo menos uma a cada seis estrelas da galáxia têm planetas do mesmo tamanho que o nosso
Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics
Ilustração mostra a variedade de planetas detectados na Via Láctea pela sonda Kepler

Os astrônomos que estão procurando por novos lares para a humanidade já têm mais lugares para pesquisar. Uma nova estimativa divulgada nesta segunda-feira (7) sugere que a Via Láctea tem pelo menos 17 bilhões de planetas do tamanho da Terra -- mais de dois para cada habitante do planeta. Isto não quer dizer que todos sejam habitáveis, mas já é um ponto de partida para a busca de planetas parecidos com o nosso.

Os cientistas ainda não encontraram um planeta gêmeo da Terra - que seja tanto do tamanho certo, mas que esteja na chamada zona habitável, que ganhou o apelido de "Cachinhos de Ouro": onde não seja nem tão quente, nem tão frio, a ponto de existir água em estado líquido. 


Mas dois grupos independentes chegaram à nova estimativa, baseada em uma nova análise de dados da sonda Kepler da Nasa, lançada em 2009 com a missão de rastrear novas Terras, descobrindo novos planetas quando eles passam na frente de suas estrelas.


Uma equipe, liderada por François Fressin, do Centro Harvard-Smithsonian Center para Astrofísica, calculou que pelo menos uma a cada seis estrelas da galáxia têm um planeta do tamanho da Terra em órbita. Outro grupo, da Universidade da Califórnia em Berkeley e da Universidade do Havaí, usou outro método e também determinou que 17% das estrelas da galáxia têm sistemas com planetas entre uma e duas vezes o diâmetro da Terra.

Os resultados foram apresentadas na reunião anual da Sociedade Astrônomica Americana, em Long Beach, na Califórnia. Os resultados foram apresentadas na reunião anual da Sociedade Astrônomica Americana, em Long Beach, na Califórnia. No evento, também foram anunciados novos números da missão Kepler: o total de candidatos a planeta já encontrados já chega a 2740 corpos celestes -- quatro deles estariam na zona habitável, mas mais estudos ainda são necessários.

ESO
Imagem obtida pelo telescópio VISTA mostra parte central da Via Láctea

(Com informações da AP)
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Notícias Geografia Hoje

Cientistas dizem que planeta como a Terra pode estar a 13 anos-luz
Estudo com estrelas anãs vermelhas mostra que planetas potencialmente habitáveis podem ser vizinhos do Sistema Solar


Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics, David A. Aguilar
Ilustração mostra planeta hipotético com duas luas orbitando uma estrela anã vermelha

Astrônomos anunciaram nesta quarta-feira (6) a descoberta de que um planeta parecido com a Terra pode estar bem mais próximo do que se imagina, a cerca de 13 anos-luz de distância, ou cerca de 124 trilhões de quilômetros. Ele ainda não foi propriamente encontrado, mas um estudo sobre estrelas anãs vermelhas mostra que estatisticamente, ele está bem perto.

Em termos espaciais, esta distância é praticamente vizinha. De acordo com Courtney Dressing, autora do estudo, se nossa galáxia, a Via Láctea, fosse do tamanho dos Estados Unidos, estes 13 anos-luz seriam equivalentes ao comprimento do Central Park, em Nova York.

As pequenas e frias anãs vermelhas são o tipo estelar mais comum na Via Láctea, com cerca de 75 bilhões de estrelas. 



A equipe do Centro de Astrofísica Harvard-Smithsonian usou dados da missão Kepler para estimar que 6% das anãs vermelhas têm planetas como a Terra, isto é, que tenham o mesmo tamanho que o nosso e que recebam tanta luz de sua estrela como a Terra recebe do Sol.

Esta alta taxa de ocorrência deve simplificar a busca por vida extraterrestre.

Ainda assim, é preciso ajustar as expectativas: por serem bastante diferentes do Sol, os planetas que orbitam anãs vermelhas podem também muito diferentes da Terra. Porque as anãs vermelhas são bem menores, os planetas potencialmente habitáveis teriam que orbitar muito mais perto de sua estrela. Eles seriam rochosos como a Terra, mas com atmosferas diferentes, que poderiam gerar tipos de vida completamente diferentes do nosso.

Como as anãs vermelhas também podem ser bem mais velhas que o Sol, isso significa que os planetas também podem ser mais antigos e suas potenciais formas de vida, mais antigas, com mais tempo de evolução.

O Sistema Solar tem 4,5 bilhões de anos, por exemplo, enquanto algumas anãs vermelhas têm 12 bilhões de anos.

O estudo será publicado na próxima edição do periódico Astrophysical Journal . 

(Com informações da AP)
http://ultimosegundo.ig.com.br

Notícias Geografia Hoje

Miniplaneta é achado muito além do Sistema Solar
Reuters

Astrônomos descobriram o menor entre os mais de 800 planetas já localizados fora do nosso Sistema Solar, anunciaram cientistas nesta quarta-feira.

O planeta, chamado Kepler-37b, é um dos três que já foram achados circulando uma estrela amarela semelhante ao Sol, localizada na constelação da Lira, a cerca de 210 anos luz de distância. Um ano-luz mede cerca de 10 trilhões de quilômetros.

"Vemos planetas muito grandes, e eles são incomuns. Planetas do tamanho da Terra parecem ser bastante comuns, então nossa suposição é de que planetas pequenos devem ser ainda mais comuns", disse Thomas Barclay, do Centro de Pesquisa Ames, da Nasa, em Mountain View, na Califórnia.

Mas quanto menor é o planeta, mais difícil é localizá-lo.

O Kepler 37-b e seus dois planetas-irmãos foram descobertos com um telescópio espacial da Nasa, também chamado Kepler, que estuda a luz de cerca de 150 mil estrelas semelhantes ao Sol.

O telescópio detecta sutis oscilações na luz dessas estrelas quando um planeta passa à frente delas.

Dos 833 planetas extrassolares já conhecidos, 114 foram encontrados pela equipe científica do Kepler, segundo o site do projeto. Mais cerca de 3.000 candidatos a planeta estão sendo analisados.

O Kepler-37b orbita 10 vezes mais perto de sua estrela do que a Terra em relação ao Sol, o que lhe dá uma temperatura de superfície de cerca de 427 graus Celsius.

"Este (planeta) particular está longe de ser habitável", disse um astrônomo da Universidade da Flórida, Eric Ford.

Mercúrio é o planeta mais próximo do Sol em nosso sistema solar, por isso cientistas compararam o Kepler-37b a um mini-Mercúrio.

O pequeno planeta é ligeiramente maior do que a Lua.

(Reportagem de Irene Klotz)
Jornal Estado de S. Paulo

Notícias Geografia Hoje


Pobreza reina na área mais protegida do Pará
Com 74% de seu território preservado e protegido, a região da Calha Norte traz poucas alternativas de renda para a população

Jornal Estado de SãoPaulo

CALHA NORTE (PARÁ)- Se o desmatamento gera pobreza nas cidades e comunidades ao seu entorno, tampouco a conservação da floresta por si só tem conseguido garantir um quadro econômico melhor. A região mais preservada e protegida do Pará é também uma das mais pobres do Estado. É o que mostra um levantamento do instituto de pesquisa Imazon divulgado hoje e obtido com exclusividade pelo Estado. O trabalho identificou que os indicadores socioeconômicos da Calha Norte são inferiores aos da média do Estado e mostra que é preciso avançar muito em soluções que possibilitem um desenvolvimento sustentável aliado à floresta para que ela possa permanecer preservada.


Evelson de Freitas/AE
Barco leva oito horas no percurso entre Oriximiná e Santarém; viajantes dormem em redes



A região, localizada ao norte do Estado, à margem esquerda do Rio Amazonas, tem 27 milhões de hectares e abriga cerca de 321 mil pessoas. Remota, cortada por rios com vários trechos não navegáveis, acabou ficando fora do alcance do desenvolvimento e do arco do desmate. Até 2011, só 5% desse território havia sido desmatado, contra uma média de 20% do resto do Estado.

Caso raro no Brasil, foi protegida pelos governos federal e estadual de modo preventivo. Hoje, 74% da área é composta por áreas protegidas (unidades de conservação e terras indígenas). Mas a proteção e a riqueza de biodiversidade ainda não se traduziram em melhores condições de vida para a população.

Em geral, o próprio Pará se encontra em situação mais precária que os outros Estados. O PIB per capita médio, de R$ 7.993 em 2008, de acordo com os últimos dados do IBGE, o deixava na 22.ª posição no ranking nacional. Menor do que a média para toda a Amazônia Legal (R$ 11.200). Já municípios da Calha Norte apresentaram média de R$ 6.155.

Os indicadores sociais também são ruins, segundo o levantamento. Por exemplo: somente 11% dos domicílios da região têm saneamento adequado (IBGE, 2010). A média do Pará era de 19% e a da Amazônia Legal, 24%. O Índice Firjam de Desenvolvimento Municipal reforça o retrato. Numa classificação que vai de 0 (baixo estágio de desenvolvimento) a 1 (alto estágio), os municípios da Calha Norte ficaram, em média, com nota 0,533. As médias do Pará (0,628) e da Amazônia Legal (0,658) os colocam em desenvolvimento moderado.

Antes do ‘boom-colapso’. Para Adalberto Veríssimo, pesquisador sênior do Imazon e um dos autores do estudo, a ocorrência de indicadores baixos era esperada pelas características da região: muito grande, muito afastada, com pouca gente. Mas é diferente de outras regiões do Pará que sofreram com o processo que ficou cunhado como "boom-colapso" - na onda do desmatamento, num primeiro momento ocorre um rápido e efêmero crescimento de renda e emprego, seguido depois de um colapso social, econômico e ambiental.

"A Calha Norte é pobre, mas tem pouca violência, não tem miséria como vemos nas regiões devastadas pelo desmatamento. Os indicadores do Estado são superiores, mas porque estamos falando da média. Nesses locais eles são bem piores", diz.

"Ao criarem áreas protegidas e chegarem na Calha Norte antes do problema, os governos federal e estadual tiveram uma visão estratégica. O desafio agora é como fazer com que essas amplas reservas tragam uma oportunidade e não um estorvo econômico para as populações", afirma. E agir rápido, com uma "estratégia de vacina", como definiu Veríssimo, para impedir que a região cometa os mesmos erros de outras e tenha o velho modelo econômico de desmatamento que só leva a mais pobreza.

"A realidade é que a área se mantém preservada porque o desenvolvimento não chegou. Mas está começando. Linhas de transmissão estão sendo instaladas para levar energia até Manaus, os prefeitos querem empreendimentos", comenta Carlos Augusto de Alencar Pinheiro, gerente da regional de Santarém do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão responsável pela gestão das UCs federais. "Por isso a hora é de discutir qual seria o desenvolvimento adequado para a região."

O estudo mostrou que a região não tem aptidão agrícola. A vocação é manter a floresta, que pode gerar renda com o manejo de madeira e outros produtos (como castanha e óleo de copaíba), e os serviços ambientais. Num primeiro momento, portanto, a atividade mais fácil a se investir é nas concessões florestais, que já começaram, mas ainda de modo discreto. Elas podem geram renda para as comunidades e para os municípios.

Outra riqueza ainda ativa é a mineral, em especial a bauxita, com a qual se produz a alumina. Na vila de Porto Trombetas, no município de Oriximiná, a Mineração Rio do Norte atua desde o fim dos anos 1970. A Reserva Biológica do Rio Trombetas e posteriormente a Floresta Nacional Sacará-Taquera foram criadas em torno da área de exploração. Numa política que na época tinha mais a ver com a proteção do minério que do ambiente. Mas que acabou servindo para controlar a atividade e estabelecer as regras de recuperação do ambiente, de modo que hoje ela é "mais uma solução que um problema", como define Veríssimo.

São os royalties da mineração, que vão para Oriximiná, que possibilitaram que a cidade seja a mais rica da região. Mesmo assim há problemas como falta de saneamento adequado - só 29% dos domicílios o têm.

Em entrevista ao Estado, o vice-prefeito Antonio Odinélio (PV) se queixou da falta de repasse do governo federal, mas admitiu que de fato não se investiu na área. Seu grupo governa a cidade há oito anos.

Terras-raras, um desafio nacional

Para fugir da dependência externa, Brasil projeta investimentos

FRANCISCO LUIZ NOEL


Extração de nióbio em Araxá (MG): resíduos 
preciosos / Foto: Juca Martins/Pulsar Imagens


Dos quase 120 elementos da tabela periódica apresentada nas aulas de química aos estudantes, os 15 metais da penúltima linha e os dois que encabeçam a terceira coluna, com números atômicos 57 a 71, 21 e 39, têm configurações eletrônicas semelhantes. A maioria forma a família dos lantanídeos, mas, linguagem científica à parte, todos compartilham um nome genérico: terras-raras. De difícil extração, dispersos em vários minerais na natureza, esses elementos se transformaram no pivô de uma disputa mundial da qual o Brasil participa na retaguarda, apesar de reunir potencial para estar na linha de frente.

Os elementos terras-raras são insumos obrigatórios para uma infinidade de produtos que incorporam tecnologia de ponta. Suas aplicações abrangem de telas de cristal líquido a fertilizantes agrícolas, de baterias elétricas a vidros de alta refração, de superímãs usados em carros elétricos e usinas eólicas a catalisadores para o refino de petróleo, passando por chips de memória e inúmeras ligas metálicas. Estratégicos como matéria-prima para a indústria do século 21, esses metais alimentam um mercado global da ordem de R$ 10 bilhões anuais e agregam valor a produtos que movimentam mais de R$ 80 bilhões.

Apesar da denominação, os 17 elementos não são terra nem tão raros, merecendo o nome por terem aspecto terroso, concentrações dispersas e produção complexa. À exceção do escândio e do promécio, classificados em separado, as terras-raras são divididas em três grupos: leves (lantânio, cério, praseodímio e neodímio), médias (samário, európio e gadolínio) e pesadas (ítrio, térbio, disprósio, hólmio, érbio, túlio, itérbio e lutécio). Algumas, como o túlio, somam reservas maiores do que elementos como o mercúrio. Todas ocorrem em variados minerais – entre eles a monazita, fosfato de terras-raras que já foi farto no litoral norte do Rio de Janeiro e é vendido para o exterior.

A liderança isolada na produção mundial de terras-raras, estimada em 134 mil toneladas em 2010, pertence à China, que se vale desses insumos para abastecer o mundo com produtos eletrônicos. Controlando 97% da oferta internacional, os chineses são donos de reservas de 36 milhões de toneladas, correspondentes a 37% do volume conhecido desses elementos no mundo. Também têm reservas expressivas a Comunidade dos Estados Independentes (CEI, formada pela Rússia e outras ex-repúblicas soviéticas), com 19%; Estados Unidos, com 13%; Austrália, com 6%, e Índia, com 3%. Depois da China, que usou 70 mil toneladas de terras-raras em 2010, o segundo consumidor é o Japão, seguido por Estados Unidos, Alemanha e França.

O Brasil, que processa 650 toneladas de compostos por ano, importou 1,3 mil toneladas de terras-raras em 2010, totalizando negócios de US$ 14,1 milhões – uma fatia correspondente a apenas 1% do mercado mundial. Sob a forma mineral ou em produtos acabados, as importações foram efetuadas por segmentos industriais do ramo de catalisadores, vidros, cerâmicas e turbinas eólicas. No mesmo ano, as exportações brasileiras de compostos de terras-raras somaram US$ 1,4 milhão. Parte das vendas internacionais foi celebrada pela estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB), que embarcou no período 1,5 mil toneladas de monazita, proveniente do norte fluminense, para a empresa chinesa Beijing HMC Mining Trade Co.

O quase monopólio da China na oferta global desses insumos passou a preocupar as empresas de tecnologia avançada do mundo ocidental quando, em 2010, o país começou a restringir as exportações na área. A exemplo do que já haviam feito em 2011, os chineses fixaram para 2012 uma cota de somente 30,8 mil toneladas para as vendas externas, invocando a necessidade de reduzir impactos ambientais da mineração em regiões como a de Baotou, na Mongólia Interior, no norte do país, que abriga o maior polo de produção desses minerais no mundo. Por conta da lei da oferta e da procura, como era de se esperar, a medida jogou os preços das terras-raras para o alto, levando os Estados Unidos, a União Europeia e o Japão a protocolar na Organização Mundial do Comércio (OMC) uma reclamação por violação das regras do mercado internacional. No fundo, diz o geólogo Romualdo Paes de Andrade, do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) – autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia –, o objetivo da China é, principalmente, atrair investimentos externos de indústrias que usam esses insumos em seus processos.

Preços elevados

Das 17 terras-raras, duas são exclusividade da China: o térbio e o disprósio, elementos empregados na fabricação de ímãs permanentes. Os dois são objeto de poucos projetos em outros países, que dificilmente irão fornecê-los no curto prazo. A situação restringe as opções para a abertura de fábricas dependentes de superímãs, produtos responsáveis por 25% da demanda por terras-raras. Não é por menos que a relevância estratégica do domínio sobre esses insumos tornou recorrente no mercado uma frase atribuída ao falecido secretário-geral do Partido Comunista da China, Deng Xiaoping, líder do país entre 1978 e 1992: “O Oriente Médio tem petróleo; a China, terras-raras”.

Os riscos de instabilidade no fornecimento mundial de terras-raras, em face das restrições chinesas, redobraram a importância do aumento da produção em outros locais. Mais de 200 empreendimentos, encabeçados por 165 empresas, estão sendo desenvolvidos em 24 países, de acordo com estudo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Os projetos maiores estão nos EUA, na CEI e no Canadá, assim como na China. Calcula-se que a elevação da oferta fora do domínio chinês, com esperada queda de preços, só acontecerá em 2015, quando a demanda anual deverá superar 180 mil toneladas. Até lá, porém, essas matérias-primas tendem a escassear e a ser negociadas a valores inflacionados.

“Os preços de alguns elementos se multiplicaram por 10, 20 e até mais”, afirma José Guilherme da Rocha Cardoso, chefe do Departamento de Indústria de Base do BNDES. “Como são muitas as indústrias ao redor do mundo que demandam terras-raras, também tem sido grande a procura por novos fornecedores.” Coautor de um estudo sobre a situação, as perspectivas do mercado e as oportunidades abertas ao Brasil na área, Cardoso destaca que o desejo dos usuários é dispor de fontes alternativas capazes de aliviar o ônus representado pela concentração da oferta nas mãos dos chineses, “pois já se viu que isso pode ser problemático para o setor”, ele enfatiza.

Foi com isso em vista que os Estados Unidos começaram a tirar do papel um projeto de vulto: a retomada das atividades de extração em Mountain Pass, no estado da Califórnia. Operada pela empresa Molycorp, a mina foi, entre 1960 e 1980, a maior produtora de terras-raras do mundo, mas acabou desativada em 2002 por força do crescimento da oferta chinesa e da consequente queda dos preços internacionais. Outros países que também estão investindo com o objetivo de aumentar a disponibilidade desses insumos são a Austrália, o Canadá, a Dinamarca e a África do Sul. No Brasil, mineradoras, autoridades e pesquisadores também se movimentam para determinar o tamanho das reservas de terras-raras no país e incrementar sua oferta.

O interesse brasileiro pela conquista de um lugar no reduzido grupo de países produtores teve como marco inicial o I Seminário Brasileiro de Terras-Raras, promovido em dezembro de 2011, no Rio de Janeiro, pelo Centro de Tecnologia Mineral (Cetem), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. No encontro, realizado em parceria com o Ministério de Minas e Energia, especialistas e representantes de empresas trocaram experiências sobre pesquisas, projetos e financiamentos com o claro objetivo de fortalecer a cadeia produtiva desses minerais no país.

Para dimensionar as reservas brasileiras, o governo realiza o estudo “Avaliação do Potencial dos Minerais Estratégicos do Brasil”, coordenado pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM), da pasta de Minas e Energia. O projeto, de R$ 18,5 milhões, faz parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e tem conclusão prevista para 2013. O seminário promovido pelo Cetem apontou antecipadamente, porém, perspectivas promissoras para o país na mineração e no processamento de terras-raras, desde que o poder público e o capital privado se articulem e banquem os investimentos necessários. As reservas provadas do país, com concessões de lavra, ainda são modestas: pouco mais de 31 mil toneladas, menos de 1% do volume mundial.

Grandes reservas

Todavia, afirmam os especialistas, o Brasil reúne grande potencial para produzir essas importantes matérias-primas. Com a experiência de quem estudou o tema por mais de três décadas, o geólogo e pesquisador emérito do Cetem Francisco Eduardo Lapido-Loureiro, recentemente falecido, apresentou no seminário de 2011 um estudo sobre a situação e o futuro da indústria mineroquímica no país. No mapa brasileiro desses insumos, quatro grandes depósitos já dimensionados são destaque: Araxá e Poços de Caldas, em Minas Gerais, Catalão, em Goiás, e Presidente Figueiredo, no Amazonas. Sempre associadas a outros elementos, as terras-raras são encontradas em pelo menos outros 36 locais do país, no litoral e no interior. A maioria das ocorrências, contudo, ainda não foi objeto de pesquisas do Departamento Nacional de Produção Mineral ou das mineradoras.

As reservas de terras-raras em Catalão são estimadas em 120 milhões de toneladas – volume que, se confirmado, é quase quatro vezes o da China, conforme destacou Lapido-Loureiro em seu estudo. Os direitos minerários das áreas assinaladas nesse município goiano, nas localidades de Córrego do Garimpo e Lagoa Seca, pertencem à Vale Fertilizantes, que opera uma mineração de fosfato em Tapira (MG). Em Minas, o potencial de Araxá começa a ser explorado pela Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM). No município amazonense de Presidente Figueiredo, as terras-raras estão em Pitinga, onde a Paranapanema explora uma das maiores minas de cassiterita do planeta.

Pode-se afirmar que Araxá, na região do Alto Paranaíba, a leste do Triângulo Mineiro, entrou definitivamente no foco de mineradoras, pesquisadores e autoridades estaduais e federais. No município, a CBMM opera a maior mina de nióbio do mundo, material que é vendido a diversos países para a fabricação de aços de alta resistência. O nióbio ocorre em mineral rico em terras-raras, que começaram a ser processadas pela empresa numa planta-piloto com capacidade para 1,2 mil toneladas anuais de compostos químicos. O investimento na tecnologia que utiliza os resíduos da mineração do nióbio foi da ordem de R$ 62,5 milhões, parte dele bancada pelo governo de Minas Gerais.

Outra empresa atraída para a região é a canadense Mbac, que criou a Araxá Mineração e Metalurgia, voltada ao desenvolvimento de um projeto associado à produção de fosfatos e nióbio em lavra vizinha à da CBMM. A Vale Fertilizantes também estuda a produção de terras-raras no Alto Paranaíba, vinculada à sua unidade de mineração de fosfato. Um dos potenciais clientes da mineradora é a Petrobras, sócia da Fábrica Carioca de Catalisadores, que importa terras-raras da China para a fabricação de catalisadores de fluidos para as refinarias de petróleo nacionais.

A demanda local por elementos de terras-raras, assim como a procura por parte de compradores externos, é considerada vital para estimular investimentos e alavancar sua produção interna. Uma perspectiva animadora para esse segmento é, nos próximos anos, o esperado salto na produção de petróleo depois das descobertas do pré-sal e da construção de novas refinarias pela Petrobras. A movimentação de indústrias multinacionais de componentes de computadores e celulares rumo ao Brasil também pode contribuir para esse mercado.

Na cadeia de produção de terras-raras, o grande objetivo é tê-las sob a forma de metal, de alto valor agregado. Antes, no processo de beneficiamento, os minerais que contêm esses elementos são separados e submetidos a tratamento químico para a concentração de cada terra-rara em óxido. Esses compostos são usados na indústria, em ramos como os de catalisadores, baterias elétricas e materiais para polimento de lentes de precisão. Num passo mais avançado da cadeia, os óxidos são base para os metais terras-raras, indispensáveis a produtos como ímãs permanentes, em que o neodímio é misturado ao ferro e ao boro.

O país ainda não detém tecnologia comercial para a produção desses metais, ao contrário da China. Romualdo Paes de Andrade, do DNPM, observa que, apesar de contar com experiência tecnológica na produção dos óxidos, o Brasil estacionou no setor em meados dos anos 1990, quando passou a contar com a oferta chinesa. Um dos exemplos da dependência tecnológica é, no Rio de Janeiro, o projeto-piloto do trem de levitação magnética que a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) está construindo na ilha do Fundão. Sem gases nem ruído, o trem vai flutuar num campo magnético produzido por superímãs. “A ideia é ótima, mas ficamos na dependência do ímã, que vem da Coreia do Sul”, afirma Romualdo.

Alto valor agregado

No que respeita ao governo federal, a importância de o Brasil lançar-se à produção de terras-raras é destacada no Plano Nacional de Mineração 2030, anunciado em fevereiro de 2011 pelo Ministério de Minas e Energia. O plano fixa diretrizes para políticas de médio e longo prazo nas áreas de geologia, recursos minerais, mineração, transformação mineral e metalurgia. Responsável por 4,2% do Produto Interno Bruto (PIB), 20% do valor das exportações e 1 milhão de empregos, o setor mineral deverá receber investimentos privados e públicos de R$ 700 bilhões, gerando produtos de alto valor agregado num cenário global de competitividade acirrada.

“É nesse contexto que os importantes recursos identificados de terras-raras no Brasil, com teores e reservas elevados, deverão merecer uma atenção muito especial e a execução de um amplo programa de PD&I [pesquisa, desenvolvimento e inovação]”, salienta o Plano Nacional de Mineração. Na aplicação industrial desses insumos, o programa chama a atenção para a “energia verde” (turbinas eólicas e células fotovoltaicas), carros híbridos elétricos, ímãs permanentes de alto rendimento, supercondutores, luminóforos e comunicação a distância, lembrando ainda que o país já produziu óxidos de terras-raras a partir de monazita.

O Brasil foi fornecedor de compostos de terras-raras entre o fim do anos 1940 e 2000, tendo sido, principalmente, um grande exportador de monazita. A atividade teve início no bairro paulistano de Santo Amaro, utilizando monazita da praia de Buena, no atual município de São Francisco de Itabapoana, no norte fluminense, e era desenvolvida pelas Indústrias Químicas Reunidas (Orquima), em São Paulo, e pela Sociedade Comercial de Minérios (Sulba), no Rio de Janeiro. Essas empresas foram estatizadas em 1960, já que a monazita é um fosfato de terras-raras associadas a urânio e tório, elementos radiativos, que, pela importância estratégica, têm pesquisa e lavra restritas ao Estado, de acordo com a legislação.

A extração e o processamento estatais de monazita foram efetuados até 2010 pelas Indústrias Nucleares do Brasil (INB), que receberam em 1988, quando a empresa foi criada, a responsabilidade pela mineração em Buena e pelas instalações de Santo Amaro. Um ano depois, a INB inaugurou uma usina no bairro paulistano de Interlagos, para separar terras-raras com o uso de tecnologia japonesa, processo que seria transferido a sua unidade no norte do Rio de Janeiro. Depois de diversas interrupções desde os anos 1990, as operações da INB com terras-raras foram retomadas em 2004. A lavra de monazita em Buena foi encerrada em 2010, devido ao esgotamento das jazidas da empresa.

No estudo sobre o panorama das reservas de terras-raras no Brasil, o pesquisador Francisco Eduardo Lapido-Loureiro salientou que o país precisa caracterizá-las logo e traçar prioridades de produção. “Para que o Brasil retome o lugar de destaque na produção de terras-raras, não deve limitar-se à extração, mas, principalmente, voltar-se à implantação de um amplo programa de PD&I que leve ao desenvolvimento, em cadeias produtivas, de processos e de produtos de alto valor agregado”, defendeu. No DNPM, Romualdo Paes de Andrade ressalta que é essencial que o governo estimule a especialização de cientistas no setor e saia à procura de cooperação tecnológica com outros países, incluída, é claro, a China.
Revista Problemas Brasileiros

O bom exemplo que vem da Europa

O Velho Mundo procura fontes alternativas de energia em nome da preservação do planeta

CARLA ARANHA



Painel fotovoltaico / 
Foto: Marcos Santos/USP Imagens

A intensidade do verão no hemisfério norte pegou de surpresa europeus e americanos. Em Paris, a fonte Trocadéro, em frente à Torre Eiffel, tornou-se uma piscina a céu aberto. Em Munique e Berlim, na Alemanha, a população procurou rios e parques para se refrescar. Cenas parecidas se repetiram na Inglaterra, em Portugal e na Espanha. Nos Estados Unidos, incêndios, queimadas e uma forte estiagem não só tiraram o sossego de muita gente como também afetaram a economia. Na agricultura, houve perda de 100 milhões de toneladas de milho e 20 milhões de toneladas de soja, com prejuízos financeiros da ordem de US$ 18 bilhões. De acordo com dados da National Oceanic and Atmospheric Administration (Noaa) – agência americana com foco nas condições dos oceanos e da atmosfera –, a porção norte do globo viveu em 2012 o verão mais quente desde pelo menos 1880, quando as medições de temperatura começaram a ser registradas. A tendência, segundo pesquisadores, é que o calor continue a bater recordes na Europa e nos Estados Unidos – com invernos igualmente extremos. Para o pesquisador James Hansen, da Nasa, as ondas de calor têm acontecido em grande parte como consequência do aquecimento global. “Estações muito frias ou muito quentes estão se tornando mais frequentes por causa das mudanças no clima causadas por ações do homem. Portanto, é emergencial a redução dos gases que causam o efeito estufa para estabilizarmos o clima”, ele diz.

Embora o consumo de combustíveis fósseis e poluentes, com destaque para o petróleo, continue aumentando no mundo, principalmente nos países emergentes, nem todas as nações estão de braços cruzados na luta contra a emissão de gases prejudiciais à atmosfera. Na Alemanha, por exemplo, matrizes mais tradicionais estão sendo substituídas pelas renováveis, com destaque para a solar, a eólica e a de biomassa. Depois do desastre nuclear de Fukushima, no Japão, em 2011, o governo alemão decidiu abrir mão da energia nuclear. Das 22 usinas que até então estavam em funcionamento no país, oito já foram fechadas. As demais deverão ter o mesmo fim até 2022. A Alemanha pôde fazer essa opção com alguma tranquilidade porque já há algum tempo o país vem incentivando alternativas de consumo e geração. Atualmente, os alemães são líderes mundiais em energia limpa. “É uma questão de sobrevivência da espécie humana e de bem-estar das pessoas. O ar menos poluído significa uma vida melhor, aqui e agora”, diz Norbert Allnoch, diretor do Instituto da Indústria de Energia Renovável (IWR), sediado em Münster. “Simplesmente não temos opção. O planeta está a caminho do colapso e as mudanças climáticas são um fato. Portanto, é preciso fazer algo com urgência”, complementa. O país já obtém 20% de toda a eletricidade que consome a partir da energia solar, eólica e de biomassa. Até 2020, a Alemanha pretende reduzir em 40% a emissão de gases de efeito estufa, segundo o governo alemão.

Em maio do ano passado, o país de Angela Merkel bateu o recorde mundial de geração de energia solar. Foram produzidos 22 gigawatts de eletricidade por hora, o equivalente a 20 usinas nucleares operando em capacidade total. “Realmente, é um número espantoso, resultado de anos de investimento na área”, diz Allnoch. Hoje, a Alemanha gera cerca de 55% de toda a eletricidade obtida com a radiação do sol no mundo. O ramo fotovoltaico tem crescido no país como resultado de uma política estatal. No ano 2000, foi aprovada a Lei de Energias Renováveis, estabelecendo um compromisso do governo de subsidiar a instalação de painéis solares em residências e em propriedades rurais. A legislação também determina que o Estado compre, por um preço acima do valor de mercado, a totalidade da energia solar gerada pelos cidadãos. Para não sobrecarregar as contas públicas, o gasto é dividido entre todos os contribuintes, que pagam um pequeno adicional no imposto de renda em nome da geração de energia solar. “Essa política tem levado cada vez mais alemães a colocar painéis solares em suas casas”, diz o diretor da IWR.

Mudança de matriz

Nos últimos anos, todavia, com a crise econômica que tomou conta da Europa, alguns críticos passaram a vociferar contra o custo que tudo isso tem representado. Segundo dizem, as contas do próprio governo em algum momento podem não fechar. Atualmente, devido aos incentivos à produção fotovoltaica, os alemães arcam com uma das tarifas de energia elétrica mais elevadas da Europa. “Trata-se de um compromisso feito às custas do povo, e muitos não estão de acordo”, condena Holger Krawinkel, da Federação das Organizações de Consumidores Alemães. Outro argumento ainda é mencionado pelos que são contrários ao programa energético: como nos meses de inverno há poucas horas de sol – e mesmo no restante do ano não existe garantia de boa luminosidade diária –, todos os anos é necessário importar energia nuclear de países como a República Tcheca e a França. Saliente-se que, entre os franceses, também tem havido um considerável movimento na direção dos recursos renováveis.

Depois da crise nuclear no Japão, a França também começou a reestudar sua matriz energética. O país se firmou, ao longo dos anos, como grande fornecedor de eletricidade gerada em usinas nucleares. Cerca de 75% da energia consumida no país é obtida dessa forma. Com 58 reatores e uma capacidade de geração de 63 gigawatts, a França é um dos maiores exportadores mundiais de eletricidade – na maior parte, vendida para nações vizinhas, como Alemanha, Itália e Suíça. Sem deixar de lado as usinas nucleares, pelo menos por enquanto, a França deverá investir mais em outras fontes energéticas no médio e longo prazo. Não é à toa que uma das principais bandeiras da campanha eleitoral do presidente François Hollande foi justamente uma guinada em direção à economia verde. Enquanto o conservador Nicolas Sarkozy defendia a continuidade na forma como a nação vem conduzindo seu programa de geração de eletricidade, Hollande já anunciou que a utilização de energia nuclear deverá ser reduzida pela metade até 2025. O país prepara investimentos principalmente na matriz eólica. Pelo menos três grandes geradoras de energia produzida pelo vento deverão ser construídas no país até 2015.

Subsídios governamentais já convenceram seis empresas a instalar turbinas eólicas na região do Canal da Mancha e em outras regiões da costa francesa. A regulamentação sobre investimentos e o sistema de preços da energia eólica serão votados no primeiro semestre de 2013, em Paris. “Temos de estabelecer regras claras e capazes de incentivar as empresas do setor a construir indústrias de geração alternativa de eletricidade. É primordial recuperar o tempo perdido e dar início a esse programa o quanto antes”, diz Marie-Hélène Aubert, especialista em ecologia, membro do Partido Socialista e fundadora da Associação Internacional por uma Agricultura Ecologicamente Intensiva (AEI).

Nos países nórdicos, a utilização de recursos renováveis ganhou força já há algum tempo. Na Noruega, por exemplo, hoje 99% da eletricidade é gerada por hidrelétricas. Pouco antes da crise do petróleo, em 1973, o governo norueguês começou a fazer grandes investimentos no represamento da água para gerar energia. Repleto de rios e cachoeiras, o país era um candidato óbvio a sair na frente em termos de hidrelétricas. Nos anos 1970, o planejamento estratégico feito pela Noruega antevia que, até 1985, essa nação dependeria apenas da água para ter eletricidade. Essa previsão se confirmou. Em 15 anos, de 1970 a 1985, a produção nas hidrelétricas naquele país aumentou cerca de 4% ao ano. Atualmente, quase mil empreendimentos do gênero estão em operação, muitos deles de pequeno porte. “A intenção era proteger o meio ambiente, mas sem desalojar moradores locais. Por isso optamos pela construção, preferencialmente, de usinas menores e capazes de atender sub-regiões”, explica Einar Ove Andersen, diretor da empresa Agder Energi Group. Nos últimos dois anos, no entanto, o sistema enfrentou desafios. A combinação de invernos mais frios que o usual – quando parte da água que abastece os reservatórios congela – e a escassez de chuvas fizeram com que as hidrelétricas trabalhassem apenas com metade de sua capacidade naqueles meses. Houve falhas no fornecimento de energia, e isso afetou, inclusive, a indústria local. “Qualquer anormalidade no abastecimento de água para as usinas é bastante prejudicial porque dependemos apenas das hidrelétricas para gerar energia”, explica Andersen. Hoje, depois de alguns ajustes que incluíram a reforma de reservatórios mais antigos, a produção está normalizada. “É claro, porém, como tudo no mundo, que não estamos imunes às variações climáticas abruptas e é impossível afirmar que falhas não voltarão a ocorrer”, ele diz.

Fabricantes europeus

Segundo o relatório “Who is Winning the Clean Energy Race” (“Quem está Ganhando a Corrida por Energia Limpa”), da Pew Charitable Trusts e da Bloomberg New Energy Finance, o Brasil foi o décimo país do mundo que mais investiu em energia limpa em 2011. Nações como Estados Unidos e China, grandes poluidoras mundiais, fizeram esforços naquele ano para atrair recursos para o setor e aparecem nos primeiros lugares da listagem. No Brasil, as fontes renováveis representaram 88,8% da eletricidade gerada em 2011, segundo o Ministério de Minas e Energia, com destaque para as hidrelétricas, responsáveis por quase a totalidade desse montante. A participação da energia eólica, no entanto, vem crescendo – de 2010 para 2011, houve um acréscimo de cerca de 24% na produção. A expectativa é que nos próximos anos essa matriz ganhe maior expressão. De qualquer modo, a geração de energia como um todo deverá continuar aumentando. Estima-se que o consumo mantenha a progressão de no mínimo 2% ao ano, a exemplo do que já vem acontecendo. Por outro lado, a oferta de energia vem crescendo, hoje, a um ritmo de cerca de 1% ao ano, tomando como base o período 2010-2011. A necessidade de resolver esse descompasso entre geração e demanda tem sido mais um motivo para estimular as discussões sobre novas fontes de energia.

Na visão dos especialistas, o país finalmente começou a olhar com mais atenção para a energia fotovoltaica e eólica. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) lançou recentemente um projeto que procura incentivar a contribuição entre o meio acadêmico e as concessionárias para a obtenção de energia limpa. Um desses programas já está sendo colocado em prática pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pela CPFL Energia, que trabalham em parceria com outras 19 empresas coligadas e empreendimentos que nasceram no campus daquela escola pelas mãos de alguns de seus graduandos, como as firmas Hytron, Eudora Solar e Instituto Aqua Genesis. Essa força-tarefa está sendo encarregada do desenvolvimento tecnológico de usinas de energia solar e eólica que deverão ser instaladas em Campinas até 2014. Pesquisadores e empreendedores têm a missão de, entre outras atribuições, criar tecnologia que permita a conexão de painéis solares à rede elétrica. “Além disso, vamos aprimorar o controle de conversores eletrônicos de potência”, afirma Ernesto Ruppert Filho, pesquisador do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético da Unicamp e um dos responsáveis pelo projeto.

Serão testados também aerogeradores, que obtêm energia elétrica através do vento, em simulações de capacidade de produção de eletricidade com projeções anuais. O estudo deve subsidiar projetos com vistas a ampliar o aproveitamento do vento como matriz energética. Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), do Ministério de Minas e Energia, até 2014 deverão ser construídos 281 parques eólicos.

Um dos motivos para a ascensão dessa matriz, que hoje responde por 1,5% do total de energia gerado no país, é seu baixo custo, hoje em torno de R$ 100 por megawatt-hora, três vezes menos que há uma década. O preço vem caindo por conta de melhorias tecnológicas, que permitem um aproveitamento maior da capacidade das torres eólicas, assim como da chegada ao Brasil de fabricantes europeus dispostos a cobrar menos para ganhar mercado. De todo modo, essa forma de energia vem conquistando espaço no país desde 2004, quando foi regulamentado o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa), como peça fundamental da reestruturação do setor elétrico nacional. Para Ruppert Filho, a intenção era aumentar o uso de fontes de energia limpa e afastar de vez o fantasma de um apagão como o de 2001. “É evidente, porém, que ainda há desafios a enfrentar”, ressalva ele.

Talvez um dos principais entraves ao desenvolvimento dessas novas matrizes seja a necessidade de melhorar a tecnologia existente. Hoje, a maior parte dos sistemas e peças utilizados para a construção de parques eólicos, por exemplo, é importada, principalmente da Europa. Apropriados para as condições climáticas europeias, esses equipamentos apresentam muitas vezes rendimento diferente no Brasil. Por isso, estão sendo realizados esforços para aprimorar a tecnologia local, como no caso da parceria entre a Unicamp e empresas nacionais. Pesquisadores e membros da indústria defendem também a importância de estudar a criação de empreendimentos capazes de gerar boa quantidade de energia a partir da utilização concomitante de aerogeradores e painéis solares.

De acordo com Maurício Tolmasquim, presidente da EPE, o futuro da energia eólica e das demais fontes alternativas é promissor no país. A região nordeste é a que mais deve concentrar investimentos nesse tipo de geração nos próximos anos, aposta o mercado. Segundo a EPE, por suas características naturais e ventos fortes, o nordeste tem um potencial eólico de pelo menos 143 GW, equivalentes à capacidade de dez usinas semelhantes a Itaipu, e estados como a Bahia, Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte vêm atraindo investimentos no setor. A expectativa é que até 2016 sejam instalados 18 parques eólicos na região. “Esse total atenderia as necessidades locais de abastecimento e abriria novas portas para a geração de energia limpa no país”, diz Tolmasquim.

A luta pelo fim da poluição

Ao mesmo tempo em que investem em energia limpa, os europeus vêm, desde os anos 1970, adotando políticas públicas para incentivar as caminhadas e o uso de bicicleta como forma de colaborar para a despoluição do meio ambiente e promover estilos de vida mais saudáveis. Amsterdam, na Holanda, Copenhague, na Dinamarca, e Munique, na Alemanha, são consideradas modelos nesse tipo de iniciativa. Há 40 anos, a municipalidade fechou diversas ruas do centro de Munique para a circulação de carros, mesmo sob protesto dos comerciantes, preocupados com a queda em suas vendas, que afinal não aconteceu. E mais vias na região central deverão se tornar exclusivas para pedestres nos próximos anos.

Para incentivar as caminhadas e o transporte em duas rodas, as autoridades providenciaram a construção de calçadas mais largas, passagens subterrâneas para as ciclovias em cruzamentos mais movimentados e lombadas nas principais ruas, para forçar os veículos a trafegar em menor velocidade – uma medida que tem o propósito de proteger pedestres e ciclistas.

Hoje, Munique é uma das cidades mais convidativas do mundo no que respeita a andar de bicicleta, com mais de 600 quilômetros de ciclovias e 35 mil vagas de estacionamento só para ciclistas. O conjunto de políticas implementado pelo governo local vem dando resultado. Hoje, de todos os deslocamentos diários na cidade, 24% são feitos de bicicleta. Além disso, cerca de 47% do trajeto que as pessoas fazem de casa para o trabalho acontece a pé ou sobre duas rodas. Praticamente todo o restante é realizado de metrô ou ônibus. O carro é mais utilizado fora da cidade, para viajar nos fins de semana.

Copenhague, onde 35% da população vai para o trabalho ou para a escola de bicicleta, também se destaca no quesito de incentivo aos meios de transporte não poluentes. A cidade está a caminho de se tornar a capital verde da Europa. Até 2015, deverão ser instaladas novas pontes para pedestres e ciclistas entre o centro e o porto, região bastante frequentada. Também está em pauta a construção de mais ciclovias. Nos próximos anos, o governo local espera que pelo menos metade da população utilize apenas a bicicleta para seus deslocamentos, contribuindo para uma redução de 80 mil toneladas por ano na emissão de gases causadores de efeito estufa.
Revista Problemas Brasileiros

Andrômeda




Os redemoinhos  de poeira  enchendo a galáxia de Andrômeda,  destaca-se o  colorida nesta nova imagem do Observatório Espacial Herschel, uma missão da Agência Espacial Europeia, com a participação da NASA

África - Divisão


Viagem ao mundo em miniatura

Tecnologia das coisas minúsculas promete revolucionar conhecimento humano

EVANILDO DA SILVEIRA


Eisi Toma, da USP: avanços chegaram ao 
mercado / Foto: Marcos Santos/USP Imagens


Nunca o tão pequeno se tornou tão grande. A frase, publicada no artigo “O Gigantesco e Promissor Mundo do Muito Pequeno”, de autoria dos pesquisadores Henrique Eisi Toma e Koiti Araki, da Universidade de São Paulo (USP), é uma síntese precisa do que ocorre com a nanotecnologia. Esse mundo da escala do átomo e das moléculas promete uma revolução tecnológica maior do que todas as outras pelas quais a humanidade já passou, como a da agricultura, a da manufatura e a da microeletrônica. Diferentemente das anteriores, no entanto, que se limitavam à sua área específica, ela impactará todos os setores industriais, além da biologia e da medicina. Estima-se que, em 2015, o mercado mundial de produtos nanotecnológicos venha a movimentar em torno de US$ 3 trilhões (R$ 6,09 trilhões ao câmbio de setembro).

Um dos estudos mais completos já realizados no Brasil sobre o assunto, feito em 2010 pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), ligada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), traz mais dados a respeito. Chamado Panorama da Nanotecnologia no Mundo e no Brasil, o trabalho, como o título promete, fornece uma série de informações que mostram o estado atual dessa tecnologia. O levantamento começa pela nanociência, que embasa o avanço da nanotecnologia. Há diferenças entre as duas. A primeira estuda as propriedades dos materiais na escala do nanômetro; já a segunda é o emprego prático desse conhecimento voltado para o desenvolvimento e manipulação de nanomateriais, com o objetivo de criar produtos para fins comerciais.

Isso é possível porque a nanotecnologia nada mais é do que a engenharia de materiais em escala de átomos e moléculas. O prefixo grego nano significa anão e é empregado para indicar um bilionésimo de qualquer unidade de medida, como metro, quilograma ou litro, por exemplo. O nanômetro equivale, portanto, a um bilionésimo de metro. É nessa escala que se medem átomos e moléculas. Só para comparar, um fio de cabelo tem a espessura de 50 mil nanômetros. Uma analogia ajuda a dar uma ideia melhor da extensão que separa uma coisa da outra. Em relação ao tamanho, uma nanopartícula está para uma moeda de R$ 1 como esta está para a Terra. Ou seja, se a nanopartícula tivesse o tamanho da moeda, a moeda teria a dimensão do planeta.

A utilização de átomos como unidade básica na indústria torna possível a construção de nanodispositivos capazes de realizar tarefas até antes inimagináveis. Permite, ainda, desenvolver novos materiais, computadores e outros sistemas. Por isso, a possibilidade de manipular materiais na escala atômica ou molecular, em que as propriedades diferem significativamente daquelas do mundo que vemos, terá grande impacto em muitos processos industriais tradicionais, principalmente nos setores farmacêutico, químico, de energia, petróleo, mineração, metalomecânico, têxtil e automotivo. Na verdade, a nanotecnologia estará presente em praticamente todos os processos de fabricação da economia moderna, gerando ganhos de produtividade, redução de custos e o surgimento de novos produtos.

Quem primeiro vislumbrou esse mundo novo foi o físico americano Richard Feynman (1918-1988), Prêmio Nobel de Física em 1965. “Em 1959, durante uma palestra com o inusitado título ‘Há Muito Espaço Lá Embaixo’, ele disse que estava para nascer um novo mundo e que se poderia escrever a Encyclopaedia Britannica na cabeça de um alfinete”, frisa Eisi Toma, que é pesquisador do Laboratório de Química Supramolecular e Nanotecnologia, do Instituto de Química da USP. “Eu diria que Feynman foi até comedido”, ele diz, afirmando que a enciclopédia pode ser escrita num espaço bem menor.

Iniciativa estratégica

Não é à toa, portanto, que esse campo da ciência é tido como estratégico pelos países desenvolvidos, com os Estados Unidos na dianteira. Como aconteceu em outros ramos do conhecimento, os americanos saíram na frente também aqui. “Em termos mundiais, a nanotecnologia começou a deslanchar em 2000, quando o governo Clinton anunciou o lançamento da National Nanotechnology Initiative (Iniciativa Nacional de Nanotecnologia)”, esclarece Toma. “Esse programa foi copiado pela Coreia do Sul e pelo Japão em 2001, por Israel, Alemanha, Taiwan e China em 2002, pela Inglaterra em 2003 e pelo Brasil em 2004, após visita de prospecção na Europa promovida pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, da qual tomei parte”, diz.

Aqui, o interesse do governo começou um pouco antes, no entanto, quando, em 2001, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) lançou um edital para a formação das Redes Cooperativas de Pesquisa Básica e Aplicada em Nanociência e Nanotecnologia. Foram formadas quatro redes, reunindo pesquisadores de todo o país. Em 2005, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva lançou o Programa Nacional de Desenvolvimento da Nanociência e Nanotecnologia, com o objetivo de atender as demandas estratégicas identificadas pela comunidade dedicada ao desenvolvimento da área.

Mais recentemente, o país deu um passo adiante em relação ao tema com a criação, em abril passado, do Sistema Nacional de Laboratórios em Nanotecnologias (SisNano), que tem como principal objetivo mobilizar as empresas instaladas no Brasil e apoiar suas atividades para o desenvolvimento de processos, produtos e instrumentação que envolvam ciência e tecnologia na nanoescala. O que se busca também com esse sistema é consolidar e ampliar a pesquisa em nanotecnologia e nanociências, expandindo a capacitação científica e técnica necessária para explorar os benefícios resultantes em áreas como microeletrônica, nanotoxicologia, energias renováveis e limpas, biotecnologia e fármacos.

Para isso, a ideia é integrar os trabalhos dos 16 institutos nacionais de ciência e tecnologia (INCTs) do MCTI dedicados a estudos de nanotecnologia, além de mais dez unidades de pesquisa atuantes na área. Segundo Adalberto Fazzio, subsecretário da Secretaria de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do MCTI, irão despontar duas categorias de laboratórios: os estratégicos, instalados em unidades de pesquisa do próprio ministério, e os associados, pertencentes a universidades ou outras instituições. “A principal diferença entre eles é que os primeiros devem reservar no mínimo 50% de seu tempo para uso das empresas e, os segundos, 15%”, explica. “A meta é aumentar a competitividade industrial, introduzindo ferramentas e técnicas em nanoescala nas empresas, visando à inovação e ao acesso a novos mercados.”

Outra iniciativa do governo foi a criação, em maio último, do Comitê Interministerial de Nanotecnologia, composto por oito ministérios (Meio Ambiente; Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Defesa; Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; Educação; Minas e Energia, e Saúde, além do MCTI). O objetivo é propor mecanismos de coordenação das atividades relacionadas a essa área. Como explica Fazzio, “a meta é melhorar a gestão e a governança das atividades em nanotecnologia. O desenvolvimento industrial do país depende de pesquisa e investimento na área. Se queremos inovação, se queremos uma indústria de manufaturados forte, precisamos de uma tecnologia forte. Hoje, isso passa necessariamente pela nanotecnologia.”

A criação do SisNano e do Comitê Interministerial também vai ter como consequência um aumento dos investimentos governamentais na área. Segundo Fazzio, nos últimos dois aportes eles foram pouco relevantes, não passando de R$ 10 milhões anuais. “Com o SisNano, o MCTI investirá R$ 130 milhões, dos quais R$ 30 milhões em subvenção a empresas”, informa. “Esse dinheiro terá de ser destinado à pesquisa e ao desenvolvimento nas áreas de papel e celulose, plásticos e borracha, e higiene pessoal e cosméticos. Outros R$ 48 milhões irão para os laboratórios estratégicos e R$ 32 milhões para os associados. Os R$ 20 milhões restantes serão destinados ao Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano), que fica no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) e será o de referência no Brasil.”

No CNPEM ficará sediado o Centro Brasil-China de Pesquisa e Inovação em Nanotecnologia (CBC-Nano), criado em fevereiro deste ano. Os dois países vão investir US$ 10 milhões nesse centro, com o objetivo de desenvolver, em cooperação, novas tecnologias em nanoescala. Segundo a portaria federal que o instituiu, o CBC-Nano terá a forma de uma rede virtual de pesquisa e desenvolvimento. Ele faz parte do novo Acordo de Cooperação Científica e Tecnológica firmado pelos dois governos no ano passado. O centro vai coordenar as atividades que envolvam a cooperação Brasil-China e promover o avanço científico e tecnológico da investigação e de aplicações de materiais nanoestruturados.

Mercado bilionário

Apesar de todas essas iniciativas, o que o governo brasileiro investe em nanotecnologia é muito pouco diante do desembolso dos países desenvolvidos, ou até mesmo em relação aos gastos de algumas nações em desenvolvimento, como a China. Segundo o último relatório anual, de 2011, da Cientifica, uma empresa inglesa que reúne informações sobre as tecnologias emergentes para as comunidades acadêmicas e empresariais, o investimento governamental global na área, no ano passado, acumulou US$ 65 bilhões, valor que deverá chegar a US$ 100 bilhões em 2014. Quando a isso são somados os gastos das empresas, a previsão é que os investimentos cheguem a US$ 250 bilhões em 2015. Os governos que mais investiram, em 2011, foram o americano, com US$ 2,18 bilhões, e o chinês, com US$ 1,3 bilhão. Parte desse dinheiro vai para a pesquisa.

Segundo o levantamento da ABDI, entre 1996 e 2005 o número de trabalhos científicos em nanociência no mundo cresceu a uma taxa de 16% ao ano, ou seja, ele dobra a cada 4,7 anos, mais que quatro vezes o crescimento anual da produção científica em geral. Os dados revelam que o número de artigos da área, em relação ao total geral, quase triplicou durante a última década, passando de 1,5% a 4,2%. Em outras palavras, a nanociência vem avançando muito mais rápido que as demais áreas do conhecimento. Como não poderia deixar de ser, isso se refletiu no desenvolvimento de tecnologia, com a consequente criação de novos produtos – o que é atestado pelo número de patentes: de acordo com o estudo da ABDI, a taxa média de crescimento anual dos registros feitos pelo escritório de patentes dos Estados Unidos, o United States Patent and Trademark Office (USPTO), entre 1981 e 2006 foi de 12,9%.

Esses novos produtos vêm ajudando a movimentar um mercado bilionário, que cresce a passos largos. Ainda de acordo com a pesquisa da ABDI, em 2004, os produtos nanotecnológicos haviam feito girar na economia mundial não mais de US$ 13 bilhões, representando menos do que 0,1% da produção global de bens manufaturados no período. Três anos depois, esse mercado se multiplicaria por dez, chegando a US$ 135 bilhões (incluindo semicondutores e eletrônicos). A previsão é que esse valor atinja US$ 1 trilhão no ano que vem e US$ 2,95 trilhões em 2015, ou mais de 15% do total de produtos industrializados fabricados no planeta. Hoje, desse mercado, a maior parcela tem origem no setor químico (53%), seguido pelo de semicondutores (34%).

No Brasil, não há dados sistematizados e confiáveis sobre produtos, processos e serviços baseados em nanotecnologia. O que se conhece são alguns números da produção científica no campo da nanociência. Segundo a ABDI, de 2005 a 2008 foram publicados 833 artigos por 2.242 cientistas brasileiros de 541 instituições de pesquisa. Uma busca na Plataforma Lattes, banco de dados administrado pelo CNPq que reúne informações sobre a quase totalidade dos pesquisadores locais, mostra que havia no país, no mesmo período, 3.502 cientistas que se dedicavam à nanociência. Deles, 1.040 investigavam nanopartículas; 832, nanoestruturas; 719, materiais nanoestruturados; 581, nanocompósitos; 448, nanomateriais; e 445, nanotubos.

Apesar de incipiente no país, a nanotecnologia brasileira já deu frutos. Embora possam parecer coisa de ficção científica, alguns produtos já são realidade entre nós. Vários exemplos vêm da indústria automotiva. Segundo o engenheiro Ricardo Takeo Kuwabara, da SAE Brasil – braço local da Sociedade de Engenheiros da Mobilidade –, que em julho coordenou um simpósio sobre novos materiais e nanotecnologia realizado em São Paulo, ela tem evoluído muito desde que os dois primeiros microscópios eletrônicos foram importados em 1987 pela USP e por uma empresa nacional de autopeças. “A partir daí foram desenvolvidos no Brasil plásticos de engenharia com características especiais de resistência e maleabilidade, chapas metálicas mais finas e resistentes e tintas e vernizes anticorrosivos”, enumera. A lista inclui ainda filmes antibacterianos para revestimentos internos e pneus que fazem os carros consumirem menos combustível, porque geram pouco atrito na rodagem, mas sem perder a aderência.

Nanocápsulas

Há outros produtos brasileiros nesse rol, em áreas tão diversas como cosméticos, catalisadores, revestimentos plásticos, borrachas e ligas metálicas, e até uma língua eletrônica mais sensível que a humana na distinção de sabores. Mas é em termos mundiais que a gama de produtos cresce e se avoluma. “Ainda na área automotiva, foram criados metais e pinturas que se autorregeneram após sofrer riscos ou danos”, acrescenta Kuwabara. “Também há o desenvolvimento de semicondutores capazes de reconhecer a fisionomia sonolenta do motorista e emitir comandos à ECU [electronic control unit, unidade eletrônica de controle] do veículo, evitando acidentes.”

Entre todos os campos que, de uma forma ou de outra, sofrerão o impacto da nanotecnologia dois se destacam: a medicina e a eletrônica. Na primeira, por exemplo, já estão sendo desenvolvidas nanocápsulas, que levam o remédio diretamente ao tecido, órgão ou tipo de célula onde ele se faz necessário, evitando que chegue a regiões do organismo em que possa causar efeitos colaterais. Existem, também, nanoprojéteis capazes de atacar tumores. É o que acontece no caso do câncer de mama, que há mais de dez anos é tratado com sucesso com um nanomedicamento à base de paclitaxel, uma substância que, na forma anteriormente usada, exigia a combinação com um produto tóxico para poder ser absorvida pelo organismo.

Na área da eletrônica, segundo Eisi Toma, é possível considerar a nanotecnologia uma extensão natural da microeletrônica, e sua realidade pode ser vista nos grandes avanços que já estão no mercado, tais como processadores, sistemas de memória, monitores e outros dispositivos. “Tudo isso, hoje, é nano”, diz o pesquisador da USP.

Ainda de acordo com Eisi Toma, existem atualmente dispositivos com 20 nanômetros, dos quais é possível colocar mais de 1 bilhão num pequeno cartão, para gerar os computadores que ficam cada vez mais finos e possantes. “Se isso fosse feito com as válvulas dos anos 1950, precisaríamos de uma área equivalente à da cidade de São Paulo, sem falar que seria usada toda a energia consumida pela metrópole”, diz.
Revista Problemas Brasileiros

Pero Vaz de Caminha estava certo

A terra do "em se plantando tudo dá" investe na pesquisa para ser celeiro do mundo

EVANILDO DA SILVEIRA



Cultura de trigo / Foto: Marcos Santos/USP Imagens


“Contudo a terra em si é de muito bons ares frescos e temperados como os de Entre-Douro-e-Minho, porque neste tempo d’agora assim os achávamos como os de lá. Águas são muitas; infinitas. Em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo; por causa das águas que tem!” Por certo, quando escreveu esse trecho de sua famosa carta, dando conta ao rei de Portugal da descoberta do Brasil, Pero Vaz de Caminha não conhecia nada do imenso território ao qual havia aportado, em 1500, junto com os outros tripulantes da esquadra de Pedro Álvares Cabral. Quanto à quantidade de água ele acertou, é verdade – o país abriga 12% de toda a água doce do mundo –, mas em relação à fertilidade da nova terra estava redondamente enganado. Para que nela tudo desse e ela tivesse a produtividade excepcional de agora, que coloca o país como um dos gigantes mundiais do agronegócio, muito esforço, pesquisa e tecnologia tiveram de ser aplicados ao longo dos últimos 512 anos.

Hoje, além de produzir a maioria dos alimentos que consome – é praticamente autossuficiente em todos os itens da cesta básica, com exceção do trigo –, o Brasil ainda se coloca como o maior exportador de soja em grãos e seus derivados (farelo e óleo), carnes, açúcar e produtos florestais. No ranking mundial, ocupa a liderança na produção de açúcar, café em grãos e suco de laranja, e a segunda posição em soja em grãos, carne bovina, tabaco e etanol. E, ao longo do tempo, a safra de grãos vem crescendo continuamente: segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), a colheita de 2011 foi de 162,8 milhões de toneladas, volume que deverá ficar em torno de 180 milhões de toneladas em 2012, segundo estimativas divulgadas pelo governo em outubro.

Ainda de acordo com o Mapa, o agronegócio é um dos motores da economia brasileira, respondendo por 25% do Produto Interno Bruto (PIB) e por um terço dos empregos. Em 2008, o Brasil ultrapassou o Canadá e se tornou o terceiro maior exportador agrícola do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da União Europeia. Em 2011, as exportações agropecuárias brasileiras chegaram a U$ 94,6 bilhões, 24% a mais que no ano anterior. No início de 2010, um em cada quatro produtos do agronegócio em circulação no mundo era brasileiro. As projeções oficiais indicam que, até 2030, um terço dos itens agrícolas comercializados no planeta terão origem no Brasil, principalmente por causa da crescente demanda dos países asiáticos.

Toda essa pujança, no entanto, não foi conseguida de uma hora para a outra, como num passe de mágica. Os primeiros agricultores brasileiros tiveram muitas dificuldades para viver da lavoura. O motivo é simples, como lembra o engenheiro agrônomo Magno Antônio Patto Ramalho, doutor em genética e melhoramento de plantas e professor da Universidade Federal de Lavras (Ufla). “Com raras exceções, as espécies cultivadas no Brasil foram importadas”, explica. “A maioria delas veio de regiões temperadas, com condições climáticas e de fertilidade do solo bem distintas das existentes aqui. Foi preciso, sobretudo, dedicação e persistência para possibilitar que o cultivo se desse em condições econômicas favoráveis para os agricultores.”

Maior rendimento

Contudo, isso apenas não é suficiente para explicar as transformações ocorridas. O fato é que sem a ciência provavelmente o Brasil não teria chegado tão longe, e estaríamos hoje importando alimentos. Foram as pesquisas científicas que tornaram possível a introdução, a adaptação e o melhoramento genético de várias espécies agrícolas. Isso, por sua vez, deu origem ao cultivo, sob as condições tropicais e subtropicais, de plantas com maior rendimento, qualidade e sabor e resistentes às principais pragas e doenças. Apenas para citar alguns exemplos, é o caso do milho híbrido adaptado às condições climáticas e ambientais do Brasil, e de variedades de café de menor porte e mais produtivas que as tradicionais.

Concorreu para isso a criação de instituições científicas, como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), fundada em 1973. Antes delas, outros estabelecimentos já vinham contribuindo para a melhoria da agricultura brasileira. É o caso, por exemplo, do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), fundado em 1887 pelo imperador dom Pedro II, com a denominação de Estação Agronômica de Campinas. “Nesses 125 anos de existência, o IAC já desenvolveu 960 variedades agrícolas, despontando entre elas arroz, feijão, café, frutas, hortaliças, oleaginosas, cana-de-açúcar, citros e tantas outras”, conta o farmacêutico bioquímico Marco António Teixeira Zullo, que foi seu diretor-geral no período de 2008 a 2011.

Para se ter uma ideia desse trabalho e dessas conquistas, de acordo com ele cerca de 90% dos cafeeiros do tipoarabica cultivados no Brasil, atualmente, são oriundos de variedades criadas pelo IAC. O instituto também se destaca na área de frutas. “O alicerce de toda a fruticultura paulista e, por consequência, brasileira, teve origem ali”, ressalta Zullo. “Um exemplo é o pêssego, que tem ganhado espaços em localidades de clima quente no interior do estado de São Paulo.”

As pesquisas da Embrapa também têm contribuído para expandir a produção da fruticultura, em especial no nordeste. Foram criadas novas variedades de uva, banana, abacaxi, melão, coco e acerola, por exemplo, mais adaptadas à região. Tecnologias como o uso de porta-enxertos e o desenvolvimento de videiras livres de vírus viabilizaram altas safras de uvas de boa qualidade. Também se destaca a técnica da indução floral, que é o uso de hormônios vegetais para acelerar ou uniformizar a ocorrência das flores de um vegetal e, consequentemente, dos frutos. Ela tem sido empregada com sucesso nas plantações de manga nas regiões do vale do Açu e do vale do São Francisco, garantindo a regularidade da oferta da fruta no mercado consumidor durante todo o ano.

De acordo com o engenheiro agrônomo José Roberto Rodrigues Peres, chefe-geral da Embrapa Cerrados, graças a essas tecnologias, nos últimos quatro anos o Brasil duplicou a exportação de frutas e o nordeste passou a ocupar um lugar de destaque no setor. Atualmente, a maior região produtora de melão no país localiza-se no polo Açu-Mossoró, no Rio Grande do Norte. Já o polo Petrolina-Juazeiro firmou-se como grande exportador de manga, banana, coco, uva, goiaba, melão e pinha. “Isso garante o emprego de 400 mil pessoas em áreas do semiárido da Bahia e de Pernambuco, revertendo o êxodo rural”, diz Peres. “Agora, a Embrapa está transferindo essas tecnologias de sistemas de cultivo de frutas tropicais para alguns países da América Latina, do Caribe e da África.”

O Brasil e as nações dessas regiões também poderão ter em breve produtos agrícolas mais ricos em vitaminas e nutrientes que os consumidos hoje. É o resultado de um processo chamado biofortificação de alimentos, realizado por meio do método de melhoramento genético clássico, em que as plantas com as características buscadas são selecionadas e cruzadas para obter a variedade de interesse. É um trabalho lento e demorado, que pode se estender por 10 a 15 anos, mas com resultado certo. Um exemplo é um tipo de mandioca com 40 vezes mais vitamina A que as comuns, que está sendo desenvolvida no IAC.

A engenheira agrônoma Teresa Losada Valle, pesquisadora do instituto e responsável pelo projeto, explica que a planta convencional tem 20 unidades internacionais (UI) de vitamina A por 100 gramas de raízes frescas, enquanto a nova variedade, chamada IAC 6/01, terá 800 UI. Ela é resultado do cruzamento de outra biofortificada, a 576/70 (que tem cerca de 220 UI e foi criada pelo IAC na década de 1970) com a SRT 1221(vassourinha-amarela). “Além de ter mais vitamina A, as duas (576/70 e 6/01) rendem duas vezes mais na lavoura que as comuns”, diz Teresa. “E são também muito mais resistentes a doenças e a alterações climáticas e ambientais.”

Da China aos trópicos

A biofortificação também vem sendo empregada pela Embrapa. No caso, para criar sete variedades de plantas – abóbora, arroz, batata-doce, feijão, feijão-caupi (fradinho), milho e trigo – mais ricas em ferro e zinco e com maior resistência a doenças e mudanças climáticas. “Até o momento, lançamos dez cultivares, dos quais três de mandioca e um de batata-doce, com teores superiores de betacaroteno (um precursor da vitamina A, ou seja, que depois de ingerido se converte nela), três de feijão-caupi e três de feijão comum mais ricos em ferro e zinco”, conta Marília Regini Nutti, pesquisadora da empresa e coordenadora do projeto. “Demoramos cerca de cinco a seis anos para desenvolver cada um, todos por melhoramento genético convencional.”

Na verdade, esse projeto é parte de um trabalho mais amplo, que vem sendo realizado por uma rede mundial de pesquisas, a HarvestPlus, que congrega cientistas de vários países. Ela surgiu em 2002 como uma iniciativa do Grupo Consultivo sobre Pesquisa Agrícola Internacional (CGIAR, na sigla em inglês), com financiamento da Fundação Bill e Melinda Gates e outros doadores, para a pesquisa em biofortificação. No Brasil, o projeto teve início em 2003, sob a coordenação da Embrapa, e hoje integra a Rede BioFORT, que reúne mais de 150 pessoas de diferentes áreas do conhecimento, de 11 estados. “Por meio dessa rede, interagimos com universidades, centros de pesquisa nacionais e internacionais, associações de produtores, governo, prefeituras e organizações não governamentais”, explica Marília. O objetivo é diminuir a desnutrição e garantir maior segurança alimentar, por meio do aumento dos teores de ferro, zinco e vitamina A na dieta da população carente.

Quando se fala da melhoria de espécies agrícolas não se pode esquecer a soja (ver “Um Presente da Deusa Ciência”,PB nº 408, novembro-dezembro de 2011). Originária da China, essa planta da família das oleaginosas foi introduzida no Brasil no início do século passado e, no princípio, só se adaptou bem nos estados do sul, onde os dias são longos na estação quente, como em sua terra natal. Foi necessário muito trabalho dos cientistas brasileiros para que ela pudesse ser cultivada em áreas tropicais, ou seja, a maior parte do território nacional, onde os dias, mesmo no verão, pouco ultrapassam as 12 horas de luz. Hoje, o resultado pode ser visto na produtividade das lavouras, que avançou mais de 70% entre 1988 e 2010.

Além do melhoramento genético, duas outras tecnologias contribuem para o bom desempenho da soja. Uma delas é a fixação biológica de nitrogênio, ou seja, o uso de bactérias em vez de adubos à base desse elemento químico. Pesquisadores daqui descobriram que uma delas, a Bradyrhizobium sp., tem a capacidade de captar o nitrogênio do ar e fixá-lo nas raízes das plantas – o solo é poroso e o ar penetra nele, sendo portanto aproveitado pelas bactérias para absorção do nitrogênio. Foi desenvolvido assim um processo pelo qual esses microorganismos são inoculados nas sementes antes do plantio, dispensando depois a adubação. Graças a isso, 52 milhões de toneladas de nitrogênio deixam de ser aplicadas todos os anos nos 24 milhões de hectares cultivados com soja no Brasil, gerando uma economia anual da ordem de US$ 5 bilhões.

De nada adiantaria, no entanto, espécies melhoradas e aperfeiçoadas se não houvesse boas terras onde semeá-las. De novo, a ciência dos homens deu uma mãozinha à natureza. Técnicas de uso e conservação e novas tecnologias agrícolas, como a adubação e a calagem (aplicação de calcário), o plantio direto e o manejo integrado de pragas e doenças tornaram possível incorporar ao sistema produtivo da agricultura brasileira vastas áreas de terras pobres, em que a fertilidade era baixa. O exemplo mais marcante é o cerrado, que, com seus 207 milhões de hectares, dos quais cerca de 139 milhões agricultáveis, é, atualmente, uma das maiores fronteiras agrícolas do mundo.

Dessas novas tecnologias, pode-se afirmar, uma das mais importantes é o plantio direto, um sistema de cultivo em que a semeadura é feita sem revolvimento do solo, e no qual são empregadas a rotação de culturas e a cobertura permanente da terra, seja com plantas em desenvolvimento seja com restos da lavoura do ano anterior. “Os benefícios dessa técnica não se limitam aos aspectos econômicos”, diz Peres, da Embrapa Cerrado. “Ela faz bem também para o ambiente. A redução das tradicionais operações de preparo do solo contribui para a queda da emissão de gases de efeito estufa, já que diminui significativamente o uso de combustíveis fósseis, propiciando um corte no consumo de óleo diesel de aproximadamente 20 milhões de barris, provenientes do refino de 75 milhões de barris de petróleo”, diz.

Processo de adaptação

O manejo integrado de pragas e doenças é outra tecnologia que ajudou a tornar a agricultura brasileira um grande negócio. Mais uma vez a soja serve de exemplo. Cientistas do país desenvolveram variedades dessa oleaginosa com resistência a várias doenças causadas por fungos, como as chamadas olho de rã, cancro da haste, oídio e podridão vermelha da raiz. “Com isso, 4 milhões de litros de fungicidas deixam de ser aplicados em por volta de 5 milhões de hectares”, informa Peres. “Os resultados são menos impactos ao ambiente e ganhos econômicos de cerca de US$ 280 milhões por ano”, acrescenta.

Assim como a soja, grande parte das olerícolas (nome técnico das hortaliças) cultivadas hoje no país veio de fora e, por isso, igualmente teve de passar por um processo de adaptação. Segundo o professor Ramalho, um papel importante nesse trabalho foi desempenhado na metade do século passado pelo pesquisador Marcílio Dias, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo em Piracicaba. Ele foi um dos principais responsáveis pela adaptação no Brasil de algumas espécies de brássicas, grupo das hortaliças que inclui o repolho-chinês, os brócolis, a couve-de-bruxelas, o repolho, a couve-flor e a couve. “Com temperatura alta, a couve-flor, por exemplo, não floresce e não tem valor comercial”, explica Ramalho. “Por isso, até 1960, ela só era cultivada em regiões serranas, como Petrópolis e Teresópolis, no Rio de Janeiro.”

Isso começou a mudar em 1954, quando Dias introduziu no Brasil linhagens da Índia, que foram cruzadas com as cultivadas nas regiões serranas, obtendo a cultivar Piracicaba Precoce nº 1, hoje a base genética da maioria das variedades de couve-flor plantadas em quase todo o país. Resultado semelhante foi obtido com a cenoura, que hoje é produzida em boa parte do território nacional, inclusive no verão. Ramalho chama a atenção para um detalhe que realça o feito de Dias. “A adaptação às altas temperaturas, nesses casos, foi em uma magnitude muito maior do que a variação que, se imagina, será causada pelo aquecimento global”, diz.

Mais recentemente chegou ao campo uma nova tecnologia ainda controversa: a das plantas transgênicas. “Ela abre a possibilidade da inserção de genes de interesse produtivo ou qualitativo que antes não estavam disponíveis em determinada espécie, aumentando-se, assim, as perspectivas do melhoramento genético”, explica o pesquisador Messias José Bastos de Andrade, da Ufla.

No Brasil já está liberado o plantio comercial de espécies transgênicas de soja (desde 2003) tolerante a herbicidas, algodão (2005) e milho (2007) resistentes a insetos, e feijão (2011) imune ao vírus do mosaico dourado do feijoeiro, doença transmitida pela mosca-branca (Bemisia tabaci), que pode causar perdas de cerca de 80% na produção. Também estão sendo desenvolvidos mamão e batata geneticamente modificados imunes a vírus. “No momento, há vários estudos em andamento com vistas a chegar aos chamados transgênicos de segunda geração”, informa Andrade. “Eles possibilitarão aumentar a qualidade dos alimentos agrícolas e sua vida nas prateleiras dos supermercados, bem como melhorar seu teor nutricional.”
Revista Problemas Brasileiros

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Impacto (nem tão) profundo

Apesar de pequeno, impacto de meteorito na Rússia foi o mais importante desde 1908. Astrônomos brasileiros comentam dificuldade de prever choques de pequenas rochas com a Terra.

 Marcelo Garcia


O rastro luminoso e o barulho provocados pela queda do meteorito geraram pânico na região. Impacto causou muitos danos e deixou cerca de mil feridos. (imagem: Youtube)


Para os moradores da região de Tcheliabinsk, na Rússia, a ficção dos filmes-catástrofe pareceu mais real nesta sexta-feira (15/02). Desde as primeiras horas do dia, a imprensa mundial noticiava a cena, tantas vezes veiculada pelo cinema: a queda de um meteorito naquela longínqua terra. O acidente deixou cerca de mil feridos, muitos deles pelos estilhaços de vidros despedaçados no impacto, mas foram poucos casos graves. Segundo astrônomos, o incidente não teve relação com a passagem do asteroide 2012 DA14 nas proximidades do nosso planeta na tarde de hoje. 

O meteorito russo, que, segundo estimativas da Academia Russa de Ciências, tinha cerca de 10 toneladas e 15m de comprimento, entrou na atmosfera terrestre a uma velocidade de 54 mil km/h e provavelmente se fragmentou ao atingir uma distância de 50 a 30 km da superfície. Além disso, como explica o astrônomo argentino Fernando Roig, do Observatório Nacional, ao quebrar a barreira do som, o deslocamento do corpo empurrou o ar à sua frente e gerou uma onda de choque que atingiu os prédios da cidade – fenômeno parecido com os provocados por aviões supersônicos militares, mas muito mais intenso.

"Pelas imagens registradas no momento da queda e pelas notícias que têm chegado da Rússia, também parece que houve uma explosão e fragmentação do corpo antes de ele atingir o solo, o que deve ter produzido outras ondas de choque", afirma. "Essa explosão deve ter sido a principal responsável pelos estragos causados."

Além de quebrar janelas, o impacto também danificou prédios, derrubou o teto de uma fábrica e espalhou pânico na população – mas, por sorte, não afetou as diversas usinas nucleares da região, segundo as autoridades russas. O incidente também provocou reações políticas e boatos dos mais diversos. O presidente Vladimir Putin criticou o sistema de alerta da Rússia contra meteoritos e uma agência de notícias afirmou que o governo russo teria interceptado a rocha, que se desintegrou e caiu em três cidades – nada confirmado oficialmente. Num démodé arroubo de Guerra Fria, o líder do partido liberal-democrata russo, Vladimir Zhirinovsky, teria chegado a cogitar se o episódio não se trataria de um teste de novas armas norte-americanas.

Coincidência?

Além de impressionante, o evento é um prato cheio para os alarmistas de plantão. Isso porque nesta sexta-feira outro asteroide, o 2012 DA14, passou bem perto do nosso planeta – a apenas 22 mil quilômetros da Terra, a menor distância já registrada para um objeto do tipo. Mas calma: segundo a Nasa, o episódio ocorrido na Rússia nada tem a ver com a passagem dessa pequena rocha de 50 metros de diâmetro nas cercanias de nosso planeta.

O astrônomo brasileiro Enos Picazzio, da Universidade de São Paulo (USP), reforça a independência dos eventos e explica que a queda de rochas vindas do espaço na Terra não é algo raro – pelo contrário, acontece todos os dias. “Corpos do tamanho de grãos de areia ou mesmo com algumas dezenas de centímetros de diâmetro caem diariamente em nosso planeta, mas produzem apenas fugazes traços luminosos”, afirma. “E é bom lembrar que boa parte da superfície da Terra é formada por água ou regiões desabitadas, então não há ninguém lá para registrar.”


Em 1908, ocorreu a mais poderosa explosão da história recente da Terra, que os cientistas acreditam ter sido provocada pelo choque de um grande bloco rochoso vindo do espaço na Sibéria. O evento, no entanto, ainda é cercado de mistério e polêmica. O incidente de hoje provavelmente é o mais importante registrado desde então. (imagem: Leonid Kulik Expedition)

Segundo o astrônomo, no entanto, apesar de já conhecermos praticamente todos os grandes asteroides com quilômetros de extensão capazes de cruzar com a Terra, ainda há muito o que aprender sobre os asteroides menores, com dezenas de metros ou menos de comprimento. “A identificação dessas rochas depende da observação da luz do Sol refletida em sua superfície, que varia de acordo com seu tamanho e composição, com maior ou menor presença de materiais escuros, como o carbono, ou brilhantes, como o silício”, explica. “Conseguimos identificar e prever a trajetória de algumas rochas do tamanho do 2012 DA14, mas corpos ainda menores, como o que se chocou com a Rússia, são difíceis de observar mesmo dias antes de um impacto.” 

Mas ele pondera que incidentes como o de hoje são raros e podem ser separados por décadas ou séculos. Talvez o último registro importante de um grande choque com a Terra seja de 1908, o chamado evento Tunguska. O incidente, cuja origem ainda provoca polêmica, teria gerado uma energia equivalente a 300 bombas atômicas e levado à devastação de uma enorme área da Sibéria, na Rússia. O Brasil também pode ter tido seu próprio Tunguska, em tamanho reduzido: há indícios de um forte impacto na região do rio Curuçá, no Amazonas, ocorrido em 1930, e expedições na área já encontraram uma enorme cratera no local, escondido pela floresta.
Revista Ciência Hoje

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