domingo, 8 de maio de 2011

Arroz com feijão ameaçado

Fast food muda perfil da alimentação de brasileiros e prejudica sua saúde

FERNANDA COLAVITTI
fcolavitti@edglobo.com.br

Galileu/Galileu
Foto: Ricardo Padue
A globalização alimentar cresce rapidamente no Brasil pelo seu pior lado: o da chamada junk food, os lanches e outros alimentos rápidos. A proliferação das redes de fast food, com seus cardápios variados de guloseimas gostosas e calóricas, como hambúrgueres, salgadinhos e doces —, aliada à variedade de alimentos disponíveis nos supermercados, está modificando os hábitos alimentares de norte a sul do país.

Nos últimos anos, o brasileiro tem se dividido entre a tradição do arroz com feijão, e a tentação — em alguns casos, irresistível — da 'comida rápida', como mostra um amplo mapeamento da alimentação no Brasil, publicado, no mês passado, no livro 'Um, Dois, Feijão com Arroz'.

Ainda que o bom e velho arroz com feijão continue sendo a base das refeições no país, o levantamento detectou um aumento no consumo de alimentos ricos em gorduras e açúcares, e pobres em nutrientes fundamentais, como cálcio e ferro, fibras, além do crescente entusiasmo pelos refrigerantes, em praticamente todos os Estados. 'Estamos trocando os pratos mais tradicionais de cada região pela comida globalizada', resume o nutrólogo Mauro Fisberg, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), um dos autores do livro.

Ao contrário do que se imagina, não é somente entre os moradores das grandes cidades, como Rio de Janeiro e São Paulo, que ocorrem essas mudanças no perfil nutricional — ainda que estejam no topo do ranking.

No Piauí, pratos típicos — como o frango com farinha de mandioca, consumido em viagens e passeios —, estão dando lugar aos salgadinhos e refrigerantes. No Espírito Santo as refeições antes preparadas e consumidas em casa foram substituídas por comidas prontas de restaurantes e lanchonetes.

Em Goiânia, os refrigerantes, que não apareciam na dieta da população em estudos anteriores, já se tornaram o 12º componente do total de calorias da dieta das famílias — o consumo diário é de 98 mililitros, acima dos quase 93 mililitros de sucos naturais de frutas.

Surto de obesos
Os mineiros também sofreram mudanças significativas em seus hábitos alimentares, trocando as preparações típicas mais sofisticadas por pratos semiprontos. O estudo aponta outras substituições no Estado, como o café com leite pelo achocolatado, os vegetais in natura pelos alimentos industrializados e os doces de leite, em compota e cristalizados, pelos pudins, tortas e chocolates.

Batata cancerígena?

Galileu/Galileu
Foto: Ricardo Padue

Como se não bastasse causar uma série de problemas de saúde já comprovados, como doenças cardiovasculares e metabólicas, o excesso no consumo de frituras ganhou mais argumentos contrários nos últimos meses.

Um estudo publicado por pesquisadores suecos, em abril, mostrou que batatas fritas e outros alimentos ricos em carboidratos geram uma substância cancerígena, a acrilamida, quando submetidos a altas temperaturas.

Após serem confirmados por pesquisas na Noruega, Reino Unido e Estados Unidos, os resultados tornaram-se motivo de preocupação para a Organização Mundial da Saúde (OMS), que no mês passado reuniu especialistas para investigar a quantidade da substância necessária ao desenvolvimento da doença em humanos - já que os experimentos foram feitos em animais.

'Apesar de ainda não estarem comprovados, são estudos que devem ser levados a sério', aconselha a nutricionista Maria Alice de Assis, da Universidade Federal de Santa Catarina. Mais um motivo para maneirar nas deliciosas porções de 'fritas'.





Slow Food em alta

Galileu/Galileu
Slow Food: ingredientes regionais e alta gastronomia
Foto: restaurante LeTanTan

Mais do que saciar a fome - e bem rápido para não perder muito tempo - e manter as funções vitais do organismo, o ato de sentar-se à mesa para comer deve ser um momento de prazer; e a comida, parte undamental da identidade cultural de um país.

Esses são os princípios do movimento Slow Food, surgido na Itália, em 1986, como reação ao avanço das redes de fast food, com seus hambúrgueres e batatas fritas. Espalhados em 40 países, inclusive no Brasil, os cerca de 70 mil membros do Slow Food pretendem impedir o domínio dos lanches rápidos, embutidos e pré-cozidos sobre as comidas regionais.

Para isso, trabalham na divulgação da filosofia do movimento, sintetizada em um anifesto, que prega a necessidade de redescobrir a riqueza da culinária regional e evitar a padronização.

'Nossa idéia não é acabar com as redes de fast food, mas fazer frente à perda cultural gastronômica de cada país, resgatar o hábito de apreciar o alimento com calma e de relaxar à mesa', explica Heloisa Mader, fundadora do Convivium do movimento em São Paulo, cuja sede é o restaurante Le Tan Tan.

Desde o final de junho, a casa incorporou ao seu cardápio nove pratos tipicamente brasileiros, como o creme de milho com paio e couve, originário do interior de Minas Gerais. O restaurante também irá promover, uma vez por mês, eventos gastronômicos abertos a todos que não agüentam mais comer enlatados, embutidos e lanches.

Revista Galileu

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