segunda-feira, 7 de março de 2011

A geografia do carnaval carioca

Estudo relaciona o surgimento das escolas de samba à urbanização da cidade

Por: Catarina Chagas

Não é só em fevereiro que a Sapucaí atrai atenções: o geógrafo Marcelo Pereira Matos, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), respira carnaval o ano inteiro. Há cinco anos, ele estuda as relações entre o desenvolvimento urbano do Rio de Janeiro e a proliferação das escolas de samba. Para isso, determinou três períodos distintos da história dos desfiles: 1932-1942, 1943-1983 e 1984-2001.

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Carnaval popular na avenida Rio Branco, em 1969 (fotos: Arquivo Nacional)

Quando as escolas começaram a surgir, eram atrações secundárias em relação às grandes manifestações do carnaval da época . Cerca de 100 integrantes desfilavam na Praça Onze, numa passarela formada entre arquibancadas desmontáveis. O primeiro desfile formal, em 1932, foi realizado com o patrocínio do Jornal Mundo Sportivo . A prefeitura oficializou o evento em 1935.

Durante o período inicial das apresentações, grande parte da população de baixa renda morava na área central do Rio e as escolas, como a Deixa-Falar (a primeira da cidade), se concentravam sobretudo no núcleo metropolitano. O contexto político do Estado Novo influenciou decisivamente as agremiações, que eram obrigadas a apresentar em seus enredos temas nacionalistas e sofriam forte repressão policial.

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No início do século, havia, além das escolas de samba, desfilavam também as chamadas grandes sociedades. Essas associações de elite se apresentavam em carros puxados por burros. A foto acima retrata a Sociedade Pierrot da Caverna

A partir de 1943, o desenvolvimento levou à reestruturação do centro e provocou alterações fundamentais na estrutura urbana. As obras forçaram sucessivas mudanças na localização da folia, que passou pelas avenidas Rio Branco e Presidente Antônio Carlos antes de se instalar definitivamente na avenida Marquês de Sapucaí, em 1978.

O segundo período da história das escolas de samba -- considerado seu auge -- foi marcado pelo surgimento de novas agremiações. Apesar da estagnação da área central do Rio como local de moradia, a cidade cresceu muito na periferia e as escolas acompanharam a expansão rumo às zonas Norte e Oeste, direcionada pelo traçado das linhas de trem.

Segundo Matos, o sentimento de comunidade, mais forte na periferia, é fundamental tanto para a criação de uma escola de samba quanto para sua sobrevivência. "Analisando o próprio nome das escolas, podemos observar a referência espacial e a ideologia da união de uma comunidade", explica. O pesquisador reuniu mais de 70 nomes que comprovam essa afirmativa, entre eles agremiações famosas como Unidos da Tijuca ou Acadêmicos do Salgueiro.

Com a inauguração do Sambódromo, em 1984, o desfile passou a obedecer a regras externas (como as exigências feitas pelas emissoras de TV), tornou-se palco da promoção de artistas famosos e minimizou a importância das próprias comunidades.

Apesar disso, comunidades de áreas recentemente ocupadas e novas favelas se organizaram em novas agremiações, como a Renascer de Jacarepaguá. Cresceu também a quantidade de escolas na periferia e em outros municípios da região metropolitana. A distribuição das escolas estendeu-se, enfim, por todos os espaços do Rio de Janeiro. "Afinal, a estrutura urbana constitui, ao mesmo tempo, o território das políticas urbanas e o território das práticas sociais e manifestações culturais", conclui Matos.

História do Carnaval

Até o início do século 20, o carnaval tinha outra cara. Sua primeira manifestação veio com os portugueses no século 17: o entrudo. Essa brincadeira democrática entre escravos e senhores durou três séculos, até que atos de violência levaram à proibição do festejo. Mais tarde, a festa foi retomada com a apresentação dos ranchos (formados pelos baianos que vinham morar na cidade), corsos (desfiles de carros enfeitados) e grandes sociedades (associações de elite que desfilavam em carros alegóricos com mensagens políticas). Nesse contexto, surgiram as escolas de samba, a partir da década de 1930. 29/03/2004 | Atualizado em 14/10/2009

Catarina Chagas
Ciência Hoje On-line

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