sábado, 12 de março de 2011

AIDS E OUTRAS DOENÇAS DA GLOBALIZAÇÃO

A epidemia da globalização

Divulgação

Rock Hudson: o ator de Hollywood morreu em 1985 e foi a primeira celebridade vitimada pela Aids


Quando o americano Robert Gallo isolou o vírus da Aids, em 1983, a doença era chamada de "peste gay" e matava nove em cada dez pacientes, na imensa maioria homossexuais e usuários de drogas injetáveis. A façanha do americano, repetida quase ao mesmo tempo pelo francês Luc Montagnier, abriu caminho para a sintetização das drogas antivirais que transformaram a Aids em uma doença crônica, tratável e de baixa letalidade. Gallo está com 66 anos e trabalha atualmente na pesquisa de uma vacina contra a Aids. Prevê que esse medicamento pode estar disponível em no máximo seis anos. O cientista americano deu esta entrevista a VEJA em 1996, ano que foi um marco no tratamento da doença. O coquetel de drogas que interrompe quase completamente a proliferação do vírus começava a dar resultados positivos. Gallo falou a VEJA dessa revolução no momento exato do disparo do primeiro tiro.

set 96 Robert Gallo


VEJA –
Existe fundamento para o entusiasmo despertado pelas novas drogas contra a Aids?

GALLO – Lamento dizer: sim e não. São bastante raros os casos de drogas capazes de combater com eficácia algum tipo de vírus. É muito mais difícil combater um vírus do que parasitas e bactérias, que vivem fora da célula. Os parasitas e as bactérias têm seu próprio metabolismo, são mais fáceis de atingir e, portanto, mais fáceis de destruir. Mas é evidente que estamos no limiar de uma nova era nas investigações. Sabemos muito mais sobre vírus em geral e, especialmente, sobre o HIV. Era apenas uma questão de tempo até que drogas relativamente potentes e específicas fossem encontradas. O que tem causado entusiasmo na comunidade científica é o uso das novas drogas, baseadas na inibição de uma das enzimas necessárias para a reprodução do vírus HIV, a protease. Esses novos medicamentos agem em conjunto com as drogas antigas, como o AZT, que atua sobre a transcriptase reversa, outra enzima do ciclo do HIV. Esse coquetel de remédios não deixa muita margem para que o HIV escape da célula infectada para atacar as células vizinhas, mas é preciso destacar também os aspectos negativos da medicação, os problemas que persistem.

VEJA – E o problema do preço, já que o coquetel anti-Aids custa cerca de 10 000 dólares anuais?

GALLO – O grande problema com essas drogas é, de fato, o custo. Quem pode comprá-las? Noventa por cento dos doentes não podem. Qualquer solução para o tratamento da Aids terá, obrigatoriamente, de incluir o lado econômico. O custo elevado torna essas drogas inacessíveis aos pacientes dos países em desenvolvimento e, até mesmo, a muitos pacientes das nações industrializadas.

VEJA – Quais serão os próximos passos contra a Aids?

GALLO – É necessário aprofundar nossos conhecimentos sobre o HIV e desenvolver uma maneira mais natural e biológica de controlar a reprodução do vírus no organismo. A indústria farmacêutica deverá continuar o que está fazendo, ou seja, desenvolver novas substâncias químicas contra as enzimas do vírus – a protease, a transcriptase reversa, a integrase. A indústria está atualmente numa posição muito favorável. Essas enzimas são fáceis de estudar e, quando se descobre sua estrutura molecular, torna-se simples encontrar as drogas mais eficazes para anular sua atuação.


Leia entrevista na íntegra



De doença fatal a mal crônico

Desde que os primeiros casos de Aids foram diagnosticados, em 1981, a pesquisa médica sobre a doença passou por três fases. A época inicial ficou marcada pelas primeiras e seminais descobertas, como o isolamento do vírus, em 1983, e a invenção do teste anti-HIV, em 1985. Para os pacientes a Aids era ainda uma doença fatal, que matava em média em um ano. Os avanços científicos começaram a render frutos em 1986, com a descoberta do AZT, medicamento que prolongava a sobrevida dos pacientes. Essa foi a segunda fase da moléstia, que durou dez anos. Em 1996, foi descoberto o coquetel de drogas que dificulta a proliferação do HIV no organismo. Os remédios do coquetel vêm recebendo aperfeiçoamentos a cada ano. Com os cuidados necessários, a Aids pode ser cuidada e mantida sob controle como uma doença crônica qualquer, como, por exemplo, o diabetes.

Fama e calvário

Além do ator Rock Hudson, outros famosos levaram a opinião pública a discutir sobre a Aids:

Cazuza O cantor viveu sua agonia em público, falando corajosamente sobre a doença. Morreu em 1990

Magic Johnson O craque do basquete americano descobriu ser soropositivo em 1991. Tornou-se usuário do coquetel de drogas em 1996 e hoje leva uma vida normal, administrando vários negócios e produzindo um programa na MTV

O paciente zero

O comissário de bordo canadense Gaetan Dugas é considerado o "paciente zero" da Aids. Estima-se que ele tenha contaminado aproximadamente 250 pessoas por ano em diversos países no início da década de 80. Sua história foi contada no livro E a Vida Continua, publicado nos Estados Unidos em 1987 e considerado uma das melhores crônicas sobre a doença. A obra sugere que a Aids seria uma "epidemia da globalização", própria de uma era em que existe facilidade de locomoção. A Sars seria outra dessas epidemias.

Nenhum comentário:

Geografia e a Arte

Geografia e a Arte
Currais Novos