segunda-feira, 27 de setembro de 2010

O apartheid não morreu

O apartheid não morreu
Aqui a discriminação é a lei. Numa África do Sul onde racismo é crime, um povoado se mantém 100% branco e vive como se fosse um país independente. Bem-vindo (ou não) a Orânia
por Felipe Lessa, de Orânia, África do Sul
Quase todos os carros são brancos em Orânia. Já entre os motoristas não existe quase. São todos brancos mesmo. É um povoado de 700 pessoas fundado por brancos e que só aceita moradores brancos. "Viemos atrás do sonho de ter uma comunidade livre e segura. A África do Sul já foi um país de primeiro mundo há algumas décadas, mas infelizmente não podemos mais dizer isso", diz Andries van der Berg, um oraniano de 24 anos.

Andries tem saudade de um tempo que nunca viveu para valer. Tinha só 4 anos de idade quando o apartheid acabou, em 1990. Nos 42 anos que a política de segregação durou, a elite de origem europeia era privilegiada em todas as esferas: tinha os melhores empregos e vivia em bairros nobres com serviços públicos comparáveis aos dos países ricos. Do outro lado dessa muralha invisível estavam 96% da população: negros e mestiços amontoados em periferias ocupando subempregos. Não ser racista era contra a lei, inclusive: o Estado proibia casamentos entre brancos e negros.

Em Orânia os muros também são invisíveis. Não há cancela com seguranças impedindo negros de entrar. Também nem seria permitido. A Constituição sul-africana mais recente, de 1993, transformou o racismo em crime. Se é assim, então, como Orânia é possível? Porque juridicamente esse povoado não é uma cidade. Mas uma empresa. O lugar em si está subordinado a um município de verdade, Hopetown. Não tem prefeito próprio. Mas tem presidente. E os moradores são os acionistas. Ao comprar uma casa lá, você vira sócio. Como qualquer empresa tem liberdade para recusar sócios, Orânia fica com autonomia para decidir quem pode e quem não pode viver lá, como se fosse um governo de verdade.

Isso foi possível porque os fundadores do lugar compraram uma vila operária abandonada no subúrbio de Hopetown - em 1990, logo que o apartheid acabou e Nelson Mandela saiu da prisão. A empreitada custou o equivalente a R$ 1,1 milhão em dinheiro de hoje. Mas isso só valeu pelo terreno, praticamente: eram 240 casas parcialmente destruídas, sem água, luz ou esgoto. "Começamos do nada", diz, orgulhoso, John Strydom, um dos diretores do povoado-empresa.

Empresa não. País. Eles se sentem mais oranianos do que sul-africanos. Como qualquer nação, buscam depender o mínimo possível do exterior. E ter o máximo de autossuficiência econômica. De fato, a maior parte dos serviços e dos alimentos é produzida na própria cidade. Mesmo sem ter nem 15 ruas, Orânia possui bandeira e uma moeda própria: o ora, que vale o mesmo que o rand sul-africano.

É um sistema financeiro engenhoso: você pega seus rands e troca numa casa de câmbio. Ela deixa o dinheiro aplicado. Os rands não são mais seus, a troca já foi feita. Mas você pode sacar os juros depois. Além disso, vários comerciantes dão um desconto de 5% a quem pagar com o ora. É a colaboração deles para criar uma identidade nacional. E para fortalecer a economia local também. Com a moeda local, oraniano gasta com oraniano, não com sul-africano.

"Nosso objetivo é manter o dinheiro dentro da cidade e, com isso, criar empregos", diz Frans de Klerk, o CEO. Não dá para dizer que não deu certo. Em quase 20 anos de existência, foram construídas 3 igrejas, duas escolas, dois museus e uma estação de rádio. E a maior parte dos oranianos tem negócios próprios no povoado, não precisa sair de lá para ganhar a vida.

Mas, cá entre nós, têm de contar com uma mãozinha dos sul-africanos. O posto de gasolina de Orânia, por exemplo, depende dos motoristas negros para sobreviver. Como ele é o único num raio de 15 quilômetros, os habitantes das redondezas abastecem por lá também. Para ter uma ideia, a SUPER viu durante 1h30 só 4 carros com brancos contra 13 com negros. "Sempre passo por aqui e nunca me trataram mal, mas também nunca abriram um sorriso. Lógico, eu estou gastando meu dinheiro no posto. Mas não gosto deste lugar. Nem um pouco", diz a comerciante negra Corina Mathlante.

O isolamento parece não ter fim. Enquanto o país está fervendo por causa da Copa do Mundo, que começa em 11 de junho, o clima em Orânia está frio, até gelado. Sabe como seria se o Brasil sediasse o próximo mundial de curling? É mais ou menos assim que está o clima do povo de Orânia para a copa. "Acho que algumas pessoas vão assistir os jogos pela televisão...", desconversa John Strydom. O negócio ali é atletismo e rúgbi, o esporte tradicional da elite branca.

Tribo de holandeses

O racismo dos oranianos não se limita a um brancos x negros. A questão étnica ali é mais profunda. Tanto que não é qualquer tipo de branco que vive por lá: somente africâneres, os descendentes dos holandeses que iniciaram a colonização do país no século 17 ("orânia" vem de orange, a cor-símbolo da Holanda). Se você for um branco sul-africano descendente de ingleses, que também dominaram a região, não entra.

O fato é que os africâneres dominaram politicamente e culturalmente o país na época do apartheid, mas perderam parte desse poder com a democratização, em 1994. O idioma africâner, um dialeto que veio do holandês dos anos 1600, fazia parte das matérias obrigatórias nas escolas e era número 1 nas universidades. Com a democratização, o inglês tem se tornado dominante no ensino, constituindo também uma segunda língua universal - pela qual as dezenas de etnias negras do país podem se comunicar. "Fomos marginalizados", reclama (em inglês) Carel Boshoff, um dos fundadores de Orânia.

Faz muito mais tempo que os africâneres se sentem marginalizados. Começou quando os ingleses invadiram a praia deles na Áfica do Sul, atrás das jazidas de diamante e de ouro, em 1877.

Os súditos da rainha Vitória expulsaram os colonos descendentes dos holandeses à bala. Aí os africâneres reagiram e pegaram suas terras de volta depois de uma batalha sangrenta. Após muita negociação, um acordo de paz acabou assinado. Pois bem, esse foi só o primeiro episódio. Na virada para o século 20 começaria outra guerra pelo ouro. E os ingleses, com um exército bem superior, massacrariam os africâneres, mandando milhares deles para férias forçadas em campos de concentração.

Se museus existem para relembrar o passado, o de Orânia faz isso com maestria: a maior parte do acervo é composto de carabinas, revólveres e espingardas. São 43. Fora a réplica de cera representando o sofrimento das mulheres nos campos de prisioneiros.

Independência. Ou morte?

Mesmo com uma história de tanta tensão, a relação com o governo é surpreendentemente boa. Prova disso é a visita feita pelo então presidente Nelson Mandela, em 1994, como um gesto de reconciliação entre negros e africâneres. O atual chefe de Estado, Jacob Zuma, também demonstrou interesse em conhecer o povoado. Uma amostra de simpatia, mas também da total falta de receio do governo sul-africano com esses loirinhos que brincam de Banco Imobiliário em seu bairro.

Mas isso não impede Orânia de pensar grande. "Vejo um futuro promissor. Somos uma alternativa para os africâneres e continuaremos crescendo." Crescendo até declarar independência? "Não. Não pretendemos nos tornar uma nação. Mas, se a relação com a África do Sul ficar ruim, será a nossa única opção. Para nos sentirmos seguros, precisamos sentir que pertencemos a algum lugar", diz Boshoff. Mas talvez exista um jeito melhor de saber sobre o futuro de Orânia do que perguntar para os líderes: dar uma volta na piscina pública de lá. É o ponto de encontro dos adolescentes, cheio de casais namorando, moleques fazendo brincadeiras... Lá de trás vem uma garota usando um daqueles óculos tipo persiana, cheia de pose. Na mão um aparelhinho tocando Single Ladies, da Beyoncé. Shantal Williams, 16, não tem nada do jeitão tradicionalista-rural dos africâneres. A menina quer se formar em música - em outra cidade, claro. "Até gosto de morar aqui, mas prefiro lugares de cultura mista, sabe? A gente pode trocar talentos com pessoas diferentes... Aqui é tudo muito igual."

Nome Oficial - Orânia
Localização - África do Sul, a 650 km de Johannesburgo
População - 700
"Independência" (ano da fundação) - 1991
Atividade econômica - Agricultura de azeitonas, pêssegos e figos.
Forma de governo - Empresarial.
Etnia - Africâner.

Para saber mais
The Afrikaners: Biography of a People
Hermann Giliomee , University of Virginia Press, 2003.

Revista Superinteressante

As chaves para entender as mudanças climáticas

A ciência já dispõe de meios para analisar o clima de eras passadas e como a natureza e o homem interferiram nesses padrões. Esse conhecimento vai ser crucial num período de graves alterações climáticas no planeta
A história da raça humana deve muito às variações climáticas no passado. O conhecimento sobre o clima daquelas épocas é decisivo para entendermos como nos tornamos aquilo que somos. E não há dúvida de que nosso futuro será fortemente influenciado pelo clima.

Os cientistas que pesquisam o Sistema Terra têm noção da sua complexidade e dos seus constantes reajustes. Atualmente, pela primeira vez uma espécie - o Homo sapiens - tornou-se o principal agente de transformação desse sistema e dos padrões climáticos. Hoje entendemos melhor como essas transformações ocorrem, em escalas relevantes para as regiões e sociedades onde vivemos. Para isso, é preciso perceber a diferença entre a variabilidade natural e a antrópica, aquela relacionada à influência humana - uma diferença que, com o tempo, vai se tornar cada vez mais indistinta.

As questões apresentadas a seguir ilustram a contribuição das Ciências da Terra para o melhor conhecimento das mudanças climáticas.

O que se sabe dos padrões das alterações climáticas registradas ao longo dos últimos quatro ciclos glaciais?
Durante os 4,6 bilhões de anos da Terra, ocorreram diversos episódios de resfriamento e aquecimento climático. Desde a década de 1960 foi possível identificar vários avanços glaciais apenas nos últimos 2 milhões de anos. A mais recente era glacial (cujo apogeu foi há somente 21 mil anos), uma das mais intensas, cobriu de gelo as montanhas e vastas áreas do norte da Europa e da América do Norte.

Avanços recentes na leitura e na datação de registros obtidos nos oceanos, nas camadas de gelo polares e em formações de poeira e de fósseis na China Central revelam que os principais eventos climáticos afetaram toda a Terra ao mesmo tempo. A melhor explicação para isso são as variações da órbita terrestre em torno do Sol.

A atenção dos cientistas voltou-se recentemente para as causas do aumento e da redução da camada de gelo e para a descoberta de que houve muitos eventos rápidos e intensos (em escalas temporais de cem a mil anos). Esses eventos não podem estar ligados às variações orbitais, mas a outros processos do Sistema Terra.

Novos esforços têm sido direcionados para pesquisar as relações entre esses fenômenos. Por exemplo, como eventos que começam no Atlântico Norte parecem ter efeitos na Ásia Oriental? Como as mudanças em um sistema podem alterar a dinâmica de outros?

Cada glaciação está associada a um nível do mar muito inferior ao observado atualmente. Em alguns casos, vastas plataformas continentais ficaram expostas, tornando-se rotas de migração para plantas, animais e pessoas e obstruindo o fluxo d'água entre os oceanos Índico e Pacífico. Essas terras também contribuíram para o aumento da produção (natural) de gases causadores do efeito estufa. A interpretação dos vestígios arqueológicos e da disseminação da cultura humana deve levar em conta a história das variações do nível do mar.

Reconhecer os padrões comuns às glaciações mais recentes é essencial para compreendermos o funcionamento dos sistemas climáticos numa escala ampla e o desenvolvimento e a difusão das sociedades humanas.

Qual tem sido a variabilidade climática nos últimos mil anos?
Os climas variam em termos de temperatura, precipitação e freqüência de eventos extremos, como secas, tempestades e inundações. Esses fatores controlam a produtividade dos sistemas naturais e agrícolas, a freqüência dos incêndios florestais, a qualidade da água e os danos em bens e infra- estrutura.

Somos o principal agente de mudança dos padrões do clima

Uma observação cuidadosa dos registros climáticos a longo prazo é importante para as sociedades modernas porque fornece uma base para o conhecimento de tendências recentes e suas causas potenciais. O início do período Holoceno (há cerca de 10 mil anos) foi marcado por uma influência antrópica restrita nos sistemas climáticos. Foi também nesse período que se iniciou a agricultura. Há cerca de 5 mil ou 6 mil anos, os sistemas agrícolas difundiram-se pelo leste e oeste da Eurásia, e há 3 mil anos, vastas áreas do mundo já eram cultivadas. Os registros geológicos mostram que essas mudanças foram acompanhadas por desflorestamentos, incêndios, taxas de erosão maiores e pequenas obras de engenharia destinadas a reter ou tirar água em excesso dos solos.
A influência do homem sobre o clima tem favorecido a ocorrência de eventos extremos, como inundações (acima) e secas. Esses fatores controlam a produtividade dos sistemas agrícolas e a qualidade da água, e seu desequilíbrio pode levar a fome e a sede a comunidades inteiras (direita).
NESSA ÉPOCA, o homem se tornara uma forte influência nos processos da natureza em escalas regionais, embora não chegasse a interferir nas variações climáticas. A expansão da agricultura de várzea no Holoceno médio pode ter contribuído para a emissão de metano (gás-estufa), um pontochave para a influência humana na química atmosférica, mudando sua temperatura e capacidade de retenção de água.

Informações detalhadas desse passado recente podem ser obtidas pela análise de anéis de crescimento de árvores antigas, das camadas de gelo polares e de sedimentos em lagos. Todos esses registros permitem reconstituições precisas de mudanças climáticas.

As melhores reconstituições são as da temperatura média dos últimos mil anos nas zonas de latitude média a alta do Hemisfério Norte. Esses registros mostram temperaturas relativamente amenas durante o fim do século 11 e no século 12, bem como no início e no fim do século 14. Mas as temperaturas médias foram mais baixas que as atuais entre os séculos 14 e 19. Essas fases são conhecidas como o Período Medieval Quente e a Pequena Idade do Gelo. A história mostra que essas anomalias tiveram conseqüências expressivas nas sociedades. Nos períodos mais quentes, o cultivo do trigo ocorria mais ao norte, enquanto a produção de vinho acontecia o mais cedo possível. Na Pequena Idade do Gelo, os níveis de doença e a decadência agrícola em áreas marginais foram significativos. Em muitos casos, as diferenças de temperatura não excediam 0,2º C a 1º C em comparação com as verificadas no início do século 20. Essas pequenas variações e suas conseqüências deveriam ser uma evidência para quem acredita que a variação entre 1º C e 5º C prevista para os próximos 50 a 100 anos não trará alterações significativas.
O que causou essas mudanças? Alguns sugerem que a variação da energia solar está na base de certas tendências a longo prazo, mas o aquecimento recente não tem precedentes. Muitas dessas fontes têm mostrado que o clima caminha numa direção nunca vista nos últimos 10 mil anos. Alterações na energia emitida pelo Sol, na quantidade de cinzas e gases vulcânicos na atmosfera, assim como mudanças nas correntes oceânicas, têm sido invocadas para explicar algumas das tendências verificadas nesse período, mas nenhuma delas justifica as repentinas alterações nos últimos 50 anos. Acredita-se agora que os desflorestamentos, as edificações e as emissões de gases causados pelos humanos influenciam fortemente o aquecimento global.

Apesar disso, precisamos compreender a importância relativa do homem em face das influências naturais nos sistemas climáticos, a fim de perceber a origem das mudanças. A pesquisa sobre essas variações naturais, como o El Niño, deve ter prioridade máxima, pois ajudará a revelar os mecanismos que estão na base da ocorrência das mudanças climáticas, em escalas temporais relevantes para as sociedades humanas.

No passado, que impactos as mudanças climáticas tiveram nas sociedades?
Muitas civilizações desapareceram devido a uma variedade de razões, incluindo o clima. A seca pode ter sido a responsável pelo colapso da cultura harappa no noroeste da Índia, dos maias na América Central e dos hohokam no Arizona.

Em outros lugares, os problemas surgiram devido ao excesso de água. O fluxo máximo do rio Yang-Tsé, por exemplo, ocorre quando o escoamento proveniente do planalto tibetano coincide com as chuvas associadas às monções de verão. De vez em quando (com a periodicidade de alguns anos), ocorrem graves inundações que, embora depositem sedimentos ricos em nutrientes, causam perdas de vidas e afetam colheitas e propriedades.

A organização dos dados essenciais sobre as mudanças ambientais e a história das sociedades dará base a discussões sobre as novas tecnologias, as novas nações, e poderá ajudar na compreensão de alguns dos desentendimentos existentes entre povos no Oriente Médio, na África Oriental e em outros locais.
A emissão de gases-estufa, produzidos pela queima de combustíveis fósseis (acima), influencia fortemente o aquecimento global, alterando as condições de vida de hábitats como a Antártica (esquerda).
UM ANO INTERNACIONAL DEDICADO AO PLANETA
A União Internacional das Ciências Geológicas (IUGS), que representa cerca de 250 mil geocientistas de 117 países, proclamou um Ano Internacional do Planeta Terra 2007-2009 com o subtítulo "Ciências da Terra para a Sociedade". Os propósitos salientam a relação entre a humanidade e o planeta, e demonstram quanto os geocientistas são importantes na criação de um futuro equilibrado e sustentável. Proclamado através da ONU, o Ano Internacional foi considerado atividade central pela Divisão das Ciências da Terra da Unesco. Ele também é apoiado por organizações congêneres da IUGS, como a União Internacional de Geodesia e Geofísica (IUGG) e a União Geográfica Internacional (IGU), além do Conselho Internacional para a Ciência (ICSU).
Segundo as diretrizes da ONU para a proclamação de anos internacionais, os assuntos elegíveis devem corresponder a uma "preocupação prioritária de direitos políticos, sociais, econômicos, culturais, humanitários ou humanos", envolvendo "todos os países (ou a maioria deles), independentemente do sistema econômico e social", e deve "contribuir para o desenvolvimento da cooperação internacional na resolução de problemas globais", dando especial atenção aos temas que afetam os países em desenvolvimento.

Qual é o papel das atividades humanas no clima?
Sabemos que a atividade humana originou mudanças na química atmosférica e na cobertura vegetal, causando uma séria degradação da biodiversidade. Além disso, têm sido produzidos milhares de novas substâncias químicas sintéticas, cujo efeito na biosfera não é totalmente conhecido. Muitos sistemas lacustres, por exemplo, tornaram-se ácidos como conseqüência direta das emissões de gases industriais ao longo dos últimos 150 anos. A mudança dos ciclos biogeoquímicos origina reações complexas nos elementos- chave dos sistemas climáticos e, conseqüentemente, nas atividades econômicas e na qualidade da água e dos alimentos.

Uma das formas de monitorar a mudança do clima induzida pelo homem é estimar as emissões de gases-estufa resultantes da atividade humana. Conseguimos estimar esses valores, mas não conseguimos identificar os locais afetados por essas emissões. Estarão os gases concentrados nos solos e integrados na cobertura florestal? Terão os oceanos absorvido a maioria deles? Ou estarão todos esses fatores (ou ainda outros) envolvidos?

A contribuição relativa para o clima das mudanças na cobertura vegetal e na química da atmosfera ainda é pouco estudada. A pesquisa nessa área deve priorizar o estudo de processos biológicos, de ciência do solo e oceanográficos.

Qual é o papel dos modelos de previsão climática e como avaliar seu sucesso?
Os modelos de simulação parecem ser o caminho a seguir para a previsão climática. Eles usam equações matemáticas para descrever o mundo físico e as reações dinâmicas entre oceanos, atmosfera e a cobertura vegetal. Os resultados desses modelos estão condicionados pelo nosso conhecimento sobre os sistemas da Terra, pela capacidade de representação da realidade, pelas operações matemáticas e pela capacidade de informática necessária para os cálculos. Atualmente, utilizam-se mais de 25 modelos de simulação global, os quais geram freqüentemente resultados que variam em grau menor ou maior. Isso reflete as dificuldades de integrar os elementos físicos de modo significativo e a vulnerabilidade de muitos elementos do sistema quando pequenas alterações podem ser muito ampliadas, como demonstra o registro geológico.

Nos últimos tempos, foram desenvolvidos sistemas integrados que associam modelos climáticos, econômicos, demográficos, de emissão de poluentes, agrícolas e de ecossistemas. Os melhores sistemas permitem interações entre os módulos, de modo que mudanças numa parte do sistema podem obter reações dinâmicas dos outros subsistemas.

É preciso criar um sistema independente de avaliação que identifique os melhores modelos e as soluções para aprimorá-los. As prioridades na pesquisa devem incluir a coleta de melhores dados e com maior cobertura geográfica.

Os geocientistas têm um currículo notável no estudo de climas do passado e dos sistemas da Terra, e, muitas vezes, das relações entre ambos. Parte de seu programa de pesquisa pode se concentrar na identificação de como vários cenários, dos quais depende a sobrevivência das pessoas, irão repercutir nesses sistemas. Uma boa liderança levará a decisões fundamentadas e a um planejamento prudente.

Autores: John Dodson (University of Western Australia), com Keith Alverson (IGBP PAGES), Yuan Daoxian (Karst Dynamics Laboratory, Guilin, Chinese Academy of Geological Sciences), Jens Wiegand (University of Würzburg), Wyss Yim (University of Hong Kong), Ted Nield (Geological Society of London).

PARA SABER MAIS
Site: www.yearofplanetearth.org

Revista Planeta

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

ONU lança década de combate à desertificação em evento no Brasil

20.08.2010

Großansicht des Bildes mit der Bildunterschrift: Avanço rápido das zonas secas é preocupante

Apesar de toda a informação disponível, governos ainda não conseguem lidar com o avanço das áreas secas. Evento no Brasil discute a problemática e marca o início da Década das Nações Unidas Contra a Desertificação.

Toda a informação disponível na atualidade sobre o processo de desertificação não deixa dúvida: nas últimas décadas, o avanço das pesquisas permitiu um melhor conhecimento da problemática, de suas causas e impactos. Mas ainda falta muito para que todos esses dados se transformem em práticas, se traduzam em técnicas efetivas para amenizar a situação de mais 2 bilhões de pessoas que moram em áreas secas.

Esse foi o ponto de debate da 2º Conferência Internacional: Clima, Sustentabilidade e Desenvolvimento em Regiões Semiáridas (Icid), que encerrou o ciclo de discussão nesta sexta-feira (20/09), em Fortaleza. Acabado o evento, agora tem início a Década das Nações Unidas para os Desertos e Luta Contra a Desertificação 2010/2020.

O avanço da área seca é preocupante em mais de 100 países do globo. A desertificação é um risco presente em 33% da superfície da Terra, em zonas áridas e semiáridas. "É preciso pisar no acelerador. E as recomendações que saem daqui aumentam a pressão sobre os tomadores de decisão", disse à Deutsche Welle Egon Krakhecke, secretário de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável do ministério brasileiro do Meio Ambiente.

Receita do ICID

Estudos produzidos por pesquisadores do mundo todo sugerem uma mudança de cenário nada animadora. Se as previsões de aquecimento do planeta em 2 graus se confirmarem, um terço da comida disponível nos dias de hoje não existirá mais.

Segundo dados das Nações Unidas, 12 milhões de hectares por ano se transformam em desertos ao redor do mundo. O problema é causado pela degradação contínua do solo, devido às mudanças climáticas, à exploração agrícola desenfreada e à má gestão dos recursos hídricos.

No Brasil, o desmatamento é o principal fator do avanço das zonas secas. Mesmo a caatinga, bioma exclusivamente brasileiro, já teve quase metade de sua cobertura vegetal desmatada, segundo dados do Ministério do Meio Ambiente.

Bildunterschrift: Großansicht des Bildes mit der Bildunterschrift: Desertificação ameaça mais de 2 bilhões de pessoas

Egon Krakhecke, no entanto, ressalta que o país avançou no controle do desmatamento e no sistema de monitoramento. Segundo dados oficiais, a área de floresta amazônica desmatada em 2004 era de 27 mil quilômetros quadrados, em 2009 caiu para 7,4 mil quilômetros quadrados. Ainda assim, o desmatamento e a queimada são as maiores fontes brasileiras de emissão de dióxido de carbono, o que coloca o país na quinta posição no ranking mundial.

"O Brasil está fazendo a sua parte para combater o problema, em relação aos compromissos assumidos em Copenhague. Mas esperamos mais dos países ricos", afirmou Krakhecke.

Cenário brasileiro e cooperação

A região semiárida do território brasileiro ocupa os estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia, além do Vale do Jequitinhonha, no Norte de Minas Gerais, e parte da região norte do Espírito Santo. É nesse solo que as secas vitimam milhares de pessoas.

O regime de chuvas é irregular, de 400 a 800 milímetros anuais. Os longos períodos de estiagem, que ocorrem de forma cíclica, trazem sérios danos sociais para a população e afetam de forma drástica a economia local.

Apesar de a região semiárida brasileira contar atualmente com mais indústrias, sua economia depende bastante da pecuária extensiva e da agricultura de baixo rendimento. Algumas medidas de convívio com o clima foram implantadas na região, como a instalação de 300 mil cisternas. A água da chuva é acumulada nesses reservatórios e ajuda as famílias a enfrentar até 9 meses de seca.

O programa pode ser exportado para Níger, país africano que tem 77% do território desertificado. O Brasil também coopera com Moçambique em ações de abastecimento de água para a população que vive no campo.

O governo brasileiro anunciou a liberação de 12 milhões de reais em pesquisas para o desenvolvimento da região semiárida. Os projetos devem focar tecnologias para a recuperação de áreas degradadas, além de técnicas do uso sustentável dos seus recursos naturais.

Autora: Nádia Pontes
Revisão: Marcio Damasceno


DW-WORD.DE DEUTSCHE WELLE

Missão de combate acaba, mas norte-americanos continuam no Iraque

31.08.2010

Großansicht des Bildes mit der Bildunterschrift: Tropas norte-americanas encerram presença no IraqueSete anos depois da invasão, tropas dos EUA deixam o campo de batalha no Iraque e passam a exercer papel de apoio às forças nacionais. Estados Unidos falam em longa cooperação, e há quem duvide de uma retirada total.

Pouco depois de assumir a presidência dos Estados Unidos, Barack Obama prometeu acabar com a guerra no Iraque "de forma responsável". Um ano e meio depois, a última tropa norte-americana de combate deixou o país asiático nesta terça-feira (31/08).

Segundo os cálculos do governo de Washington, mais de 90 mil soldados se retiraram do Iraque nos últimos 18 meses. Os 50 mil restantes saem do campo de batalha e passam a dar assistência às forças de segurança iraquiana.

Em seu depoimento sobre o assunto, publicado no site da Casa Branca, Obama afirma que "continuará construindo uma forte parceria com o povo iraquiano, com aumento de compromisso civil e esforço diplomático".

O vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, viajou ao Iraque para participar da cerimônia da troca de comando. Em companhia do presidente iraquiano, Jalal Talabani, do primeiro-ministro, Nouri al-Maliki, e também do presidente do Supremo Conselho Muçulmano, Ammar al-Hakim, Biden também deve opinar sobre as negociações da formação do novo governo no país do Oriente Médio.

Bildunterschrift: Estátua de Saddam Hussein destruída em 2003
Diplomacia e outros interesses

As tropas de combate saem, mas a presença norte-americana poderá ser notada na enorme embaixada em Bagdá, em diversas missões e bases no país, onde os EUA continuarão prestando assistência à tecnologia armamentista, e a força aérea iraquiana, que continuará sendo montada. O Iraque vai abrigar também um escritório de cooperação em questões de segurança entre os dois países, e continuará tendo milhares de agentes de segurança norte-americanos.

"Eu não acho que os americanos sairão 100% do Iraque. Mais de 4 mil soldados morreram. E bilhões foram gastos. Essa região continua sendo importante para os interesses dos EUA. Eu não acredito que os americanos se retirarão da região depois de tantos esforços. Eu acho que eles ficarão aqui de algum jeito, e que exercerão influência", opina Azzad Othman, professor da Universidade de Erbil, na região curda do norte do Iraque, única do país que goza de estabilidade e certo progresso econômico.

A retirada total das tropas norte-americanas deve ocorrer até o fim do próximo ano – quando os 50 mil soldados que agora passam a "força de apoio" deixarão de fato o país. Ali Dabbagh, porta-voz do governo iraquiano, reforça a ideia de cooperação a longo prazo.

"Queremos uma parceria estratégica com os Estados Unidos. Assinamos 11 contratos com empresas estrangeiras de petróleo, apenas uma delas é dos Estados Unidos. Ninguém pode nos impor regras, sejam os Estados Unidos ou os países da região", declarou Dabbagh sobre o futuro da relação bilateral.

Segurança interna

Os iraquianos assistem à movimentação no país com temor de que os atentados dos radicais se intensifiquem. Os ataques quase que diários na capital, Bagdá, contra diversas instituições, deixam a impressão de que os terroristas podem agir a qualquer momento, e em qualquer lugar.

Os radicais também exploram o fato de que, seis meses depois das eleições iraquianas, o país ainda não conseguiu formar um governo. O vice-primeiro-ministro, Azad Barwari, adverte para tempos difíceis: "A questão da liderança política, dos recursos naturais e da disputa territorial só pode ser resolvida de forma democrática, respeitando a Constituição e com aceitação mútua. Se não conseguimos resolver todas as essas questões até 2011, nosso futuro estará em xeque."

Bildunterschrift: Atentado em Bagdá: iraquianos temem aumento da violência

A versão norte-americana

O "assunto político" Iraque merece uma seção exclusiva – e uma das mais longas – no site do governo dos Estados Unidos. E para os cidadãos norte-americanos que não sabem muito sobre o distante país do Oriente Médio, há informações sobre a geografia, história e governo iraquiano.

Definido como um país rico em petróleo e gás natural, em 2008 o Iraque faturou 58 bilhões de dólares com suas exportações – 84% correspondem a petróleo, sendo os Estados Unidos o principal mercado.

Na longa descrição sobre os fatos históricos do Iraque, a atuação norte-americana é citada com ênfase num episódio de 1991. Naquele ano, uma aliança de países liderada pelos Estados Unidos – em nome das Nações Unidas – expulsou soldados iraquianos do Kuwait, após a invasão de agosto de 1990.

O Conselho de Segurança da ONU exigiu então que o governo de Saddam Hussein entregasse suas armas de destruição de massa que, segundo acusam os norte-americanos, foram usadas para reprimir movimentos curdos no país depois da guerra contra o Irã (1980-1988).

E foi nessas circunstâncias que começou a ocupação: "Depois que o Iraque falhou em cooperar com as inspeções da ONU, as forças lideradas pelos Estados Unidos invadiram o país em março de 2003, depuseram o ditador Saddam Hussein (executado em 30 de dezembro de 2006 pelo governo do Iraque), conta o site, que acrescenta a seguir: "O objetivo da política dos Estados Unidos é um Iraque soberano, estável e autônomo."

Autores: Nádia Pontes / Ulrich Leidholdt
Revisão: Roselaine Wandscheer

DW-WORD.DE DEUTSCHE WELLE

Aquecimento global ajuda petroleiro russo a reabrir rota no Ártico

27/08/2010
IGNACIO ORTEGA
DA EFE, EM MOSCOU

A redução da camada de gelo que cobre o oceano Glacial Ártico devido ao aquecimento global permitiu que um petroleiro russo reabrisse a rota marítima ártica, alternativa ao canal de Suez e até agora fechada ao tráfego comercial.

O petroleiro Báltika zarpou do porto de Murmansk (mar de Bárents) em 14 de agosto, e depois de uma semana e meia de travessia já se encontra em águas do mar de Chukotka, região onde se encontra o estreito de Bering, que separa os oceanos Ártico e Pacífico.

SXC

Aquecimento global ajuda petroleiro russo em rota ártica

No começo da próxima semana, o navio chegará às águas do Pacífico, onde já não necessitará seguir a trilha produzida pos três quebra-gelos nucleares que o acompanham durante vários milhares de quilômetros.

Os quebra-gelos Rossia, Taymir e 50 Let Pobedy acompanharam o petroleiro durante mais da metade de sua viagem, ainda que na última fase o primeiro deles foi capaz de abrir sozinho a trilha no gelo.

O Báltika é um petroleiro com 44 metros de largura máxima, e por isso, nas zonas onde a camada de gelo é mais grossa é necessária a escolta de três quebra-gelos, o que não será o caso de outros navios de menor tamanho.

O petroleiro russo, que leva 72 mil toneladas de gás condensado à China, percorreu em 11 dias a distância que separa Murmansk da localidade de Pevek, no mar de Chukotka. Lá a tripulação obteve provisões de água potável e descansou durante três dias.

Segundo o especialista do Instituto de Geografia da Academia de Ciências da Rússia, Ivan Lavrentiev, a espessura do gelo diminuiu com o aquecimento global, o que ajudou a abrir o caminho de volta.

Com este trajeto, a Rússia pretendeu mostrar que a rota marítima ártica é segura e viável economicamente, a tempo de enviar uma mensagem para os navegantes de outros países --Estados Unidos, Canadá ou Dinamarca-- que têm pretensões territoriais na região.

A Rússia prevê apresentar em 2013 na Organização das Nações Unidas (ONU) uma reclamação territorial sobre a área.

Folha de São Paulo

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