domingo, 30 de agosto de 2009

Agricultura do Futuro: Um Retorno às Raízes?

A agricultura de grande escala se tornaria mais sustentável se as principais plantas cultivadas sobrevivessem por anos e formassem sistemas de raízes profundas
por Jerry D. Glover , Cindy M. Cox e John P. Reganold
MICHAEL S. LEWIS National Geographic/Getty Images


O CULTIVO MODERNO DE ALIMENTOS depende altamente de irrigação e outros insumos; ao mesmo tempo, esgota o solo e polui o ambiente. O desenvolvimento de versões perenes como o híbrido experimental do trigo-grama Thinopyrum intermedium e triticale, mostrado na página oposta, poderia comprometer menos recursos

Para muitos de nós de regiões ricas, parece fácil para os produtores rurais cultivarem nosso alimento. No entanto, a agricultura moderna exige áreas vastas de terra, irrigação, energia e produtos químicos. Observando essa demanda por recursos, a Avaliação do Ecossistema do Milênio, de 2005, patrocinada pela Organização das Nações Unidas, sugere que “dentre todas as atividades humanas, a agricultura pode ser a maior ameaça à biodiversidade e ao funcionamento do ecossistema”.

Hoje, grande parte do alimento vem direta ou indiretamente (na forma de ração animal) de ce-reais, legumes e oleaginosas. Fáceis de transportar e armazenar, relativamente não-perecíveis e razoavelmente ricos em proteínas e calorias, essas culturas ocupam cerca de 80% das terras agrícolas globais. Mas são todas plantas anuais, ou seja, devem ser cultivadas a partir de sementes todo ano, usando métodos de cultivo com recursos intensivos. O maior problema é que a degradação do meio ambiente provocada pela agricultura provavelmente se agravará à medida que a população humana faminta crescer para 8 bilhões ou 10 bilhões nas próximas décadas.

É por isso que melhoristas de plantas, agrônomos e ecologistas estão trabalhando no desenvolvimento de sistemas de cultivo de grãos que funcionarão como os ecossistemas naturais. A chave é a transformação das principais produtoras de grãos em plantas perenes, que possam viver por muitos anos. Essa idéia poderá ainda levar décadas para ser implementada, mas avanços significativos na ciência do melhoramento de plantas finalmente a estão deixando dentro do alcance.

Raízes do Problema

Nos anos 70, o geneticista de plantas Wes Jackson, do Kansas, deu um passo para 10 mil anos no passado para comparar a agricultura industrial de hoje aos sistemas naturais que a precederam. Antes de os seres humanos impulsionarem a abundância de plantas anuais por meio da domesticação e agricultura, diversas plantas perenes dominavam quase todas as paisagens do planeta – como ainda acontece nas áreas atuais não cultivadas. Mais de 85% das espécies de plantas nativas da América do Norte, por exemplo, são perenes.


JERRY D. GLOVER


PLANTAS PERENES, como o trigo-grama Thinopyrum intermedium (à dir. nos painéis), com suas raízes bem mais desenvolvidas do que plantas anuais como o trigo-de-inverno (à esq. nos painéis), acessam nutrientes e água em um volume de solo maior. As raízes perenes também favorecem o desenvolvimento de microorganismos e outras atividades biológicas que enriquecem o substrato

Jackson observou que as gramíneas e as flores perenes das pradarias do Kansas eram altamente produtivas ano após ano, enquanto formavam solos ricos – e os mantinham. Não precisavam de fertilizantes ou herbicidas para prosperar e afastavam naturalmente pragas e doenças. A água nos solos da pradaria era cristalina e a vida selvagem, abundante.

Em comparação, viu que os campos próximos, cultivados com plantas anuais como milho, sorgo, trigo, girassol e soja, exigiam cuidados freqüentes e caros para permanecer produtivos. Como as plantas anuais têm raízes rasas – a maioria chega a 0,3 metro de profundidade – e vivem apenas até a colheita, havia problemas de erosão e esgotamento da fertilidade do solo ou contaminação da água. Além disso, os campos agrícolas eram quase que completamente destituídos de vida selvagem. Resumindo, o problema era sustentar monoculturas anuais por largas extensões de terra. E a solução, como nos campos naturais, pode estar num sistema diversificado e resistente de raízes perenes.

Se as plantas anuais são problemáticas e os ecossistemas naturais oferecem vantagens, por que nenhuma de nossas principais culturas de grãos apresenta raízes perenes? A resposta está nas origens da agricultura. Quando nossos ancestrais neolíticos começaram a colher plantas com sementes, vários fatores determinaram a preferência pelas anuais.

As primeiras plantas anuais domesticadas, o trigo emmer e a cevada silvestre, tinham sementes grandes. E para assegurar uma colheita confiável a cada ano, os primeiros agricultores teriam replantado algumas das sementes que colheram. Provavelmente, as sementes das plantas com qualidades mais desejáveis, como alto rendimento, debulha fácil e resistência, tenham sido preferidas. Assim, o cultivo ativo e a pressão da seleção evolucionária resultaram rapidamente em plantas anuais domesticadas com qualidades mais atraentes que suas parentes anuais silvestres. Apesar de algumas plantas perenes também terem sementes de bom tamanho, não precisavam ser replantadas e não estariam sujeitas ao mesmo processo de seleção – nem se beneficiariam dele.


STEVE CULMAN Cornell University


O solo resultante, escuro e granulado, retirado de uma campina perene, retém bastante água e nutrientes. O solo de uma cultura anual adjacente (à esq. na foto) é pálido e tem estrutura mais fraca e cheia de torrões

Raízes como Solução

Com suas raízes normalmente mais profundas que 2 metros, as comunidades de plantas perenes são reguladoras-chave de funções do ecossistema, como gerenciamento da água e dos ciclos de carbono e nitrogênio. Apesar de precisarem investir energia na manutenção de tecido subterrâneo suficiente para sobreviver ao inverno, as raízes perenes entram em ação sempre que as temperaturas estão altas o suficiente e os nutrientes e a água, disponíveis. Seu estado constante de prontidão permite que sejam altamente produtivas, porém resistentes aos problemas ambientais.

Em um estudo que durou um século sobre os fatores que afetam a erosão do solo, por exemplo, a grama-timóteo, uma variedade de capim perene, provou ser cerca de 54 vezes mais eficaz na manutenção da camada superior do solo que as plantas anuais, além de promover uma redução de cinco vezes na perda de água e de 35 vezes na perda de nitrato em solo plantado com uma mistura de alfafa e gramíneas perenes, em comparação com o solo cultivado com milho e soja. Raízes mais profundas e estações mais longas de crescimento também permitem às perenes ampliar seu seqüestro de carbono, principal ingrediente da matéria orgânica do solo, presente 50% a mais nos “campos perenes” que naqueles com plantas anuais. Como não precisam ser replantadas a cada ano, as perenes exigem menos maquinário, pesticidas e fertilizantes, o que reduz o uso de combustível fóssil. Assim reduzem a emissão de dióxido de carbono, ao mesmo tempo que melhoram a fertilidade do solo.

O custo com herbicidas na produção de plantas perenes pode ser de quatro a 8,5 vezes menor que com as anuais, acarretando menos gastos para o agricultor. A vida selvagem também se beneficia: a população de aves, por exemplo, mostrou ser sete vezes maior em campos de plantas perenes. Além disso, as perenes podem ser cultivadas de forma sustentável em terras marginais, que já possuem solo pobre ou que seriam rapidamente esgotadas em poucos anos de cultivo intensivo de plantas anuais.

Por todos esses motivos, os melhoristas de plantas dos EUA e do mundo iniciaram pesquisas e programas de melhoramento ao longo dos últimos cinco anos para o desenvolvimento de trigo, sorgo, girassol, Thinopyrum intermedium (um tipo de trigo-grama) e outras espécies como plantas perenes de grãos. Quando comparada à pesquisa dedicada às plantas anuais, o desenvolvimento de grãos perenes ainda está em sua primeira infância. Mas avanços significativos no melhoramento de plantas ao longo das últimas duas ou três décadas tornarão viável o desenvolvimento em grande escala de culturas perenes de grãos altamente produtivas nos próximos 25 a 50 anos.


CINDY M. COX


CROMOSSOMOS de trigo perene híbrido experimental são marcados com fluorescência para revelar se são originários do pai trigo-grama (verde) ou trigo (vermelho). Essa técnica ajuda a identificar as combinações desejáveis de cromossomo e acentua as anomalias, como cromossomos misturados (setas)

Os desenvolvedores de culturas perenes estão empregando basicamente os mesmos dois métodos usados por muitos outros cientistas agrícolas: a domesticação direta de plantas silvestres e a hibridização das plantas existentes de cultura anual com suas parentes silvestres.

Evolução Assistida

A domesticação direta de plantas silvestres perenes é a abordagem mais direta para a criação de culturas perenes. Com métodos comprovados de observação e seleção de plantas superiores, os melhoristas buscam aumentar a freqüência de genes para características desejáveis, como separação mecânica fácil da semente da palha, uma semente grande que não se despedaça, maturidade simultânea, palatabilidade, linhagens fortes e alta produção de sementes. Muitas plantas cultivadas existentes, como milho e girassol, facilitaram sua domesticação dessa forma. Em poucos passos, por exemplo, os americanos transformaram os girassóis silvestres com cabeças e sementes pequenas no familiar girassol com cabeça e sementes grandes (ver quadro na pág. 60).

Programas ativos de domesticação de grãos perenes estão atualmente concentrados no trigo-grama Thinopyrum intermedium, no girassol silvestre Helianthus maximiliani, em uma flor das pradarias (Desmanthus illinoensis) e no linho (uma espécie perene de Linum genus). Desses, a domesticação do Thinopyrum intermedium, um parente perene do trigo, é talvez o que esteja no estágio mais avançado.

Para usar uma planta anual existente na criação de uma perene, uma ampla hibridização pode reunir as melhores qualidades da planta anual domesticada e de sua parente perene silvestre. As domesticadas já possuem atributos desejáveis, como alto rendimento, enquanto suas parentes silvestres podem contribuir com variações genéticas adaptadas ao próprio hábitat perene, assim como resistência a doenças e pragas.


THE LAND INSTITUTE


A CRIAÇÃO DE PLANTAS HÍBRIDAS
pode exigir o resgate do embrião do ovário

Das 13 principais culturas de grãos e oleaginosas, dez são capazes de hibridização com parentes perenes, segundo o melhorista de plantas T. Stan Cox, do Land Institute, uma organização sem fins lucrativos do Kansas, fundada por Jackson para a agricultura sustentável. Programas de melhoramento por todos os EUA estão atualmente buscando híbridos interespecíficos (entre espécies) e intergenéricos (entre gêneros) para desenvolver trigo, sorgo, milho, linho e girassol perenes. Há mais de uma década, pesquisadores da University of Manitoba, assim como cientistas de várias instituições canadenses, estudam o uso de recursos em sistemas perenes. A University of Western Australia criou um programa de pesquisa para desenvolver trigo perene no Cooperative Research Center for Future Farm Industries (Centro Cooperativo de Pesquisas para Futuras Culturas Agrícolas), proposto pelo governo. Além disso, cientistas do Food Crops Research Institute em Kunming, na China, dão continuidade ao trabalho iniciado pelo International Rice Research Institute (Instituto Internacional de Pesquisa do Arroz) nos anos 90 para o desenvolvimento de híbridos perenes de arroz para regiões elevadas.

No Land Institute, os melhoristas estão trabalhando tanto com o trigo-grama perene domesticado quanto no cruzamento de espécies de trigo perenes (principalmente Th. intermedium, Th. ponticum e Th. elongatum) com espécies anuais. No momento, 1.500 desses híbridos e milhares de suas progênies estão sendo selecionados em busca de características perenes. O processo exige trabalho intensivo e consome tempo. Assim que os melhoristas identificam candidatos à hibridização, administram a troca de genes entre espécies díspares, manipulando o pólen para fazer um grande número de cruzamentos entre as plantas, selecionar a progênie com características desejáveis e repetir esse ciclo de cruzamento e seleção várias vezes.

No entanto, a hibridização é o meio potencialmente mais rápido, apesar de mais tecnologia ser necessária para superar as incompatibilidades genéticas entre as plantas parentes. Uma semente produzida pelo cruzamento entre duas espécies distantes, por exemplo, freqüentemente abortará antes de se desenvolver plenamente. Esse espécime pode ser “resgatado” cultivando-se o embrião em um meio artificial até este produzir algumas poucas raízes e folhas, e então transferindo-o para o solo, onde poderá crescer como uma planta normal. Ao chegar ao estágio reprodutor, entretanto, as anomalias genéticas da planta híbrida, como a incapacidade de produzir sementes, freqüentemente se manifestam.

Uma híbrida parcial ou plenamente estéril geralmente é o resultado de cromossomos incompatíveis dos pais dentro de suas células. Para produzir óvulos ou pólen, os cromossomos da híbrida devem se alinhar durante a meiose e trocar informação genética uma com a outra. Se os cromossomos não puderem encontrar seus pares porque a versão de cada um dos pais é diferente demais, ou se diferirem no número de cromossomos, a dança da meiose é interrompida. Há algumas formas de superar esse problema. Como as híbridas estéreis são geralmente incapazes de produzir gametas masculinos, mas são parcialmente férteis com gametas femininos, polinizá-las com um dos pais originais, um processo conhecido como retrocruzamento, pode devolver a fertilidade. Dobrar o número de cromossomos, espontaneamente ou adicionando substâncias químicas como colquicina, é outra estratégia. Apesar de cada método permitir a paridade de cromossomos, eliminações subseqüentes de cromossomos em cada geração sucessiva ocorrem com freqüência em trigo híbrido perene, principalmente com cromossomos herdados do pai perene.


JIM RICHARDSON


Um pesquisador embala o sorgo anual para coletar pólen, com o sorgo perene alto ao fundo

Devido ao conjunto desafiador de genes criado pela ampla hibridização, técnicas de biotecnologia que podem revelar que pai contribuiu com que parte do genoma da progênie são úteis. Uma delas, a hibridização genômica in situ, por exemplo, distingue os cromossomos do pai perene daqueles do pai anual por fluorescência colorida e também detecta anomalias nos cromossomos, como rearranjos estruturais entre cromossomos não relacionados (ver ilustração embaixo à esq.). Essas ferramentas de análise podem ajudar a acelerar o programa de melhoramento assim que os melhoristas descobrirem as combinações de cromossomos desejadas e indesejadas.

Outro método para acelerar e melhorar a criação tradicional de plantas é a seleção assistida por marcadores. Seqüências de DNA associadas a características específicas servem como marcadores que permitem aos melhoristas selecionar cruzamentos com brotos de acordo com atributos desejados, sem ter de esperar até que as plantas atinjam a maturidade (ver “De volta para o futuro dos cereais”, por Stephen A. Goff e John M. Salmeron, SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL no 28, setembro de 2004). No momento, nenhum marcador específico para melhoria de planta perene foi estabelecido, mas cientistas da Washington State University, por exemplo, já determinaram que o cromossomo 4E no trigo-grama Th. elongatum é necessário para a importante característica perene do recrescimento após um ciclo de reprodução sexual. Restringir a região de 4E ao gene ou genes que produzem a característica revelaria marcadores relevantes de DNA, que economizariam aos criadores um ano de tempo de crescimento para avaliação dos híbridos.

No entanto, a perenização é um caminho intricado da vida, que vai muito além de uma única característica, muito além de um único gene. Devido a essa complexidade é improvável que a modificação transgênica (inserção de DNA estranho) seja útil no desenvolvimento de grãos perenes, pelo menos inicialmente. Mais à frente, a tecnologia transgênica poderá ter um papel na melhoria das características simples herdadas. Por exemplo, se um trigo-grama perene domesticado for desenvolvido com sucesso mas ainda carecer da combinação certa de genes de glúten (proteína) necessária para fazer um pão de boa qualidade, genes de glúten de trigo anual poderiam ser inseridos na planta perene.

Trocas e Resultados

Apesar de plantas perenes cultivadas como a alfafa e a cana-de-açúcar já existirem, nenhuma apresenta rendimento comparável à cultura de grãos anuais. À primeira vista, a idéia de que plantas podem direcionar simultaneamente recursos para a construção e a manutenção de sistemas de raízes perenes e também ter amplo rendimento de grãos comestíveis pode parecer contra-intuitiva. O carbono, capturado por meio da fotossíntese, é o principal bloco de construção da planta e deve ser alocado entre suas várias partes.


GETTY IMAGES



Críticos da idéia de que as plantas perenes podem apresentar alta produção de sementes muitas vezes enfocam essas trocas fisiológicas, presumindo que a quantidade de carbono disponível para uma planta é fixa e, conseqüentemente, o carbono alocado para as sementes sempre virá às custas das estruturas perenes, como raízes e rizomas. Eles também costumam fazer vista grossa ao fato de o tempo de vida das plantas perenes estender-se ao longo de um espectro. Algumas delas, nas pradarias, podem viver de 50 a 100 anos, enquanto outras duram apenas alguns anos. Felizmente para os melhoristas, as plantas são organismos relativamente flexíveis: em resposta às pressões de seleção, elas são capazes de mudar o tamanho de seu “bolo” de quantidade total de carbono, dependendo das condições ambientais, e alterar o destino de fatias de carbono deste bolo.

Uma espécie perene silvestre hipotética poderia viver 20 anos em seu ambiente natural altamente competitivo e produzir apenas pequenas quantidades de sementes em qualquer ano. Seu bolo de carbono é pequeno, e grande parte dele é destinada à defesa contra pragas e doenças, à disputa pelos poucos recursos e à sobrevivência sob condições variáveis. Quando os melhoristas retiram o espécime silvestre de seu ambiente natural, normalmente pobre de recursos, e o colocam em um ambiente administrado, seu bolo total de carbono cresce repentinamente, resultando em uma planta maior.

Com o tempo, os melhoristas também podem mudar o tamanho das fatias de carbono dentro desse bolo maior. O melhoramento de grãos da Revolução Verde moderna, quando combinado com um maior uso de fertilizantes, mais que dobrou o rendimento de muitas culturas anuais de grãos, e esses aumentos foram obtidos em plantas que não tinham estruturas perenes para sacrificar. Os melhoristas chegaram a esses resultados em parte por causa da seleção de plantas que produziam menos massa de caule e folhas – portanto, realocando o carbono para a produção de sementes.

O rendimento pode ser igualmente aumentado sem a eliminação dos órgãos e de estruturas exigidos para culturas perenes de grãos resistirem ao inverno. Na verdade, muitas plantas perenes, que em geral são maiores do que as anuais, oferecem mais potencial para os melhoristas realocarem crescimento vegetal para a produção de sementes. Além disso, uma cultura perene de grãos que viva cinco ou dez anos atenderia às necessidades humanas.


GETTY IMAGES



Em outras palavras, a planta perene silvestre é desnecessariamente “robusta” para o ambiente agrícola administrado. Grande parte do carbono alocado nos mecanismos de sobrevivência da planta, como aquele que lhe permite sobreviver a grandes secas, poderia ser realocada para a produção de sementes.

Fazendas Mais Verdes

Podemos imaginar que daqui a 50 anos agricultores de todo o mundo caminharão por campos de culturas perenes de grãos. Essas terras funcionariam como as pradarias do Kansas, por onde Wes Jackson caminhou, mas também produziriam alimentos. No subsolo, tipos diferentes de raízes perenes coexistiriam, fazendo uso de diferentes camadas do solo. Culturas com ciclos de crescimento sazonal alternativo poderiam ser plantadas juntas para prolongar o perío-do geral de crescimento. Menos insumos e maior biodiversidade, por sua vez, beneficiariam o meio ambiente e o bolso do agricultor.

As condições globais – agrícolas, ecológicas, econômicas e políticas – estão mudando rapidamente, de forma que poderiam ser promovidos esforços para a criação de culturas perenes. Por exemplo, à medida que cresce a pressão sobre os EUA e a Europa para reduzir ou eliminar subsídios agrícolas, que basicamente apóiam os sistemas de cultura anual, mais recursos poderiam ser disponibilizados para a pesquisa de culturas perenes. À medida que a energia fica mais cara e o custo da degradação ambiental, mais alto, recursos públicos para projetos de longo prazo que limitem o consumo e o esgotamento das terras se tornarão politicamente mais populares.

Como o longo cronograma para lançamento das culturas perenes de grãos desencoraja o investimento do setor privado, a esta altura financiamento público ou filantrópico em grande escala é necessário para a formação de cientistas e de programas de pesquisa.

A produção anual de grãos sem dúvida ainda será importante daqui a 50 anos. Algumas culturas, como soja, provavelmente serão difíceis de perenizar, e as plantas perenes não eliminarão completamente problemas como pragas, ervas daninhas e perda de fertilidade do solo. Mas raízes profundas significam maior resistência. Estabelecer agora as raízes de uma agricultura baseada em culturas perenes daria aos agricultores do futuro mais opções sobre o que cultivar e onde, assim como proporcionaria produção sustentável de alimento para uma população mundial cada vez maior.

CONCEITOS-CHAVE
JIM RICHARDSON


O uso intensivo de terra pela agricultura moderna acaba com a biodiversidade natural e os ecossistemas. Enquanto isso, nas próximas décadas a população aumentará para entre 8 bilhões e 10 bilhões, exigindo que mais hectares sejam cultivados.

A substituição de culturas de uma única estação pelas perenes criaria grandes sistemas de raízes capazes de preservar o solo e permitir o cultivo em áreas atualmente consideradas marginais.

O desafio é monumental, mas se os cientistas tiverem sucesso, o feito rivalizaria com a domesticação original das plantas cultivadas para produção de alimentos, ao longo dos últimos dez milênios – e seria igualmente revolucionária. – Os editores

AS DEZ PRINCIPAIS CULTURAS
Em 2004, culturas anuais de cereais, legumes e oleaginosas ocupavam 80% das terras agrícolas globais. Mais da metade dessa área é coberta pela cultura dos três principais grãos.

CULTURA /% DE TERRA DE CULTIVO OCUPADA
1. Trigo/ 17,8

2. Arroz/ 12,5

3. Milho/ 12,2

4. Soja/ 7,6

5. Cevada/ 4,7

6. Sorgo/ 3,5

7. Algodão/ 2,9

8. Feijões secos/ 2,9

9. Painço/ 2,8

10.Mostarda/Colza/ 2,2

O FATOR CARBONO
O aquecimento global potencial – gases de efeito estufa liberados na atmosfera pelos insumos da produção agrícola, menos o carbono seqüestrado no solo – é negativo no caso das culturas perenes. As plantas perenes mais resistentes também se sairão melhor do que as anuais em um clima mais quente.

CARBONO SEQÜESTRADO NO SOLO
(kg/ha por ano)
Culturas anuais 0 a 450
Culturas perenes 320 a 1.100

AQUECIMENTO GLOBAL POTENCIAL (KG/C02 EQUIVALENTES POR HECTARE POR ANO)
Culturas anuais 140 a 1.140
Culturas perenes –1.050 a –200

IMPACTO ESTIMADO NA PRODUÇÃO COM AUMENTO DE 3ºC A 8ºC NA TEMPERATURA
(megagramas/ha)
Culturas anuais –1.5 a –0.5
Culturas perenes +5

CRIANDO UMA NOVA PLANTA PARA CULTIVO

THE LAND INSTITUTE



Para desenvolver plantas perenes altamente produtivas, cientistas e melhoristas podem domesticar uma planta perene silvestre para otimizar suas características ou hibridizar uma planta anual para cultivo com uma parente perene silvestre, misturando suas melhores qualidades. Cada método exige tempo e cruzamentos de plantas, o que requer trabalho e análise intensivos. Os índios americanos passaram milhares de anos domesticando e transformando o girassol silvestre anual de semente pequena (a) na planta moderna de cultivo anual (b), selecionando e cultivando exemplares com características desejáveis, como sementes grandes e rendimento alto. Já existem iniciativas para domesticar diretamente espécies perenes de girassóis (c) e também produzir híbridos da moderna anual e da perene silvestre (d).

PARA SABER MAIS
Perennial grain crops: an agricultural revolution. Editado por Jerry D. Glover e William Wilhelm. Edição especial da Renewable Agriculture and Food Systems, vol. 20, no 1, março de 2005.

Wes Jackson (35 who made a difference). Craig Canine, na edição especial de aniversário da Smithsonian, vol. 36, no 8, págs. 81-82, novembro de 2005.

Prospects for developing perennial grain crops. Thomas S. Cox, Jerry D. Glover, David L. van Tassel, Cindy M. Cox e Lee D. DeHaan, em BioScience, vol. 56, no 8, págs. 649-659, agosto de 2006.

Sustainable development of the agricultural bio-economy. Nicholas Jordan e colegas, em Science, vol. 316, págs. 1570-1571, 15 de junho de 2007.

The Land Institute:
www.landinstitute.org

Jerry D. Glover , Cindy M. Cox e John P. Reganold Ele é agroecologista e diretor de pesquisa de doutorado do Land Institute em Salina, Kansas, uma organização sem fins lucrativos dedicada ao ensino e à pesquisa de agricultura sustentável.
Ela é patologista de plantas e geneticista do programa de melhoramento de plantas do instituto. John P. Reganold, professor de ciência do solo da Washington State University, em Pullman, é especializado em agricultura sustentável.

SCIENTIFIC AMERICAN Brasil

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